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Felizmente, algumas horas antes de o site ter saído do ar, eu consegui entrar em contato com Antonio através da sessão "contato" da extinta página. Conversamos sobre a recente polêmica, nascimento e fim da PatolaGames, tecnologia educacional e algumas questões que parecem ser recorrentes na recepção de jogos eletrônicos, sendo eles educativos ou não:VICE: Como começou a PatolaGames? Foi um projeto pessoal ou havia mais gente envolvida?Embora você possa pensar que a proposta do jogo tenha sido feita por alguém ignorante no assunto, sobretudo estrangeiro, talvez seja uma surpresa que o desenvolvedor é um mestrando do curso de História da UFPR.
Antonio: Começou em Curitiba, em 2002, e foi um projeto pessoal. Trabalhei com a produção de livros didáticos em História desde que saí da faculdade. Após escrever um sem-número de livros, comecei a experimentar com as mídias digitais, e os jogos pareceram uma boa ideia. Comecei com reconstruções em 3D de ambientes históricos e fui aprimorando. Os que eu mais gostava eram a recriação virtual de Auschwitz, para ensinar os alunos sobre o Holocausto, e a tumba da rainha Neferatari, que podia ser explorada virtualmente.Basicamente, a empresa era eu sozinho: fazia a programação, a produção das texturas, a modelagem 3D; escrevia e diagramava os livros; criava e atualizava o site. Curiosamente, o jogo do engenho foi o único em que contei com ajuda de um programador/artista 2D, porque a mecânica era mais complicada e não domino gráficos 2D.
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Essa eu tenho que pensar. Acho que meu primeiro jogo finalizado (e que dava para ser comercializado) foi A Casa de Ramose, de 2002. Era a reprodução em 3D de uma casa egípcia da época dos faraós para o aluno visitar como se estivesse dentro dela. Como tudo acabou em 2014, então, o projeto durou estonteantes 12 anos. Mas eu creio que o período de maior atividade foi 2006-2010. Não tive condições de ter minha atenção voltada exclusivamente para os jogos, a não ser nesse período.Nos vídeos sobre os produtos que a empresa comercializa, vejo que existe uma relação dos jogos que vocês produziam com o livro do aluno. Você acha que é justo analisar um jogo sem ver o material didático complementar a ele? Parece-me que julgar só o jogo é ver só uma metade do trabalho e conteúdo.
O primeiro passo para distorcer a verdade é pegar só um pedaço dela e fazê-la parecer outra coisa. Para transformar alguma coisa em algo feio, é só tirar do contexto. O jogo do engenho é um bom exemplo. Não tem como jogá-lo sem o livro; o professor não pode utilizá-lo sem o manual do professor. Foram pensados para serem usados juntos. Por issoque não dá para fazer o download de um sem os outros virem juntos.Tome o exemplo mais polêmico, que é o caso dos escravos sendo castigados. Quando o aluno está aprendendo a mexer com os feitores, o livro diz: "Você não estará batendo em ninguém. Estará clicando no mouse e acionando uma animação. Embora, mesmo em um jogo, seja feio de ver, ninguém se machuca". Para, logo a seguir, completar: "Mas não era isso que acontecia no Brasil escravocrata. Em um engenho de açúcar, por exemplo, as pessoas eram castigadas e, sim, eram machucadas. Por vezes, seriamente. E mesmo morriam". E continua.
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Quem dera. Acho que é exatamente o oposto: o risco é de a internet estar mudando muito pouco. Se uma pessoa usa internet só para usar Facebook, não aprende nada.Toda essa comoção é a repetição de um tipo de preconceito, de um tipo de ignorância, que a internet não parece estar mudando. Quando Madame Bovary foi lançado na França no século XIX, Flaubert foi acusado de incitar as mulheres a cometerem adultério; afinal, seu romance era profundamente descritivo. O cinema, quando surgiu, foi considerado perigosíssimo, porque se acreditava que as pessoas seriam automaticamente influenciadas pelo que viam na tela.E hoje? Conheço uma professora que foi impedida de usar o Mein Kampf,do Hitler, em sala, na faculdade. Como entender se não estudar? Se ler o Mein Kampf, vira nazista? Se mostrar a violência escravista, vira racista? É exatamente o oposto: nazismo e racismo amam a ignorância. São fanáticos por ela. Parece a minha avó: não podia falar "câncer", senão a doença surgia. Tinha de falar "doença ruim".
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Ah, sem dúvida. A interação que só existe em jogos e simuladores dá uma sensação de realidade, e muitas pessoas morrem de medo disso. Morreram de medo quando apareceu o rádio, porque iria manipular as pessoas; depois, a televisão; depois, os jogos 3D. Quanto mais realista, mais perigoso. Eu ainda lembro da comoção quando saiu Carmageddon, em que o jogador saía dirigindo e atropelando pessoas. Jogo chatíssimo, mas que foi ao estrelato pelas "denúncias" de que iria criar carniceiros ao volante. E quem não lembra os assassinatos cometidos por alunos em Columbine quando descobriram que um dos matadores jogava Doom? E cada vez que sai mais uma versão do GTA é a mesma ladainha: veem o jogador naquele ambiente cada vez mais realista e acham que ele vai à rua repetir o que vê no jogo. Então, querem banir GTA,porque, afinal, os gamers são uns patetas.Vai por mim, é o mesmo tipo de debate que vai acontecer quando o Oculus Rift, ou qualquer tecnologia similar, se tornar mais popular. Afinal, é um passo adiante na imitação da realidade. Pedro, aposto seu braço esquerdo nisso.
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Por alguma razão, sim. Mas, olhando objetivamente, qual é a diferença entre o castigo a escravos no jogo e o castigo a escravos que aparece em imagens de livros didáticos? Nenhuma. Tanto em um como em outro só estão ilustrando a violência. Veja: o castigo a escravos não tem função nenhuma no jogo. Nenhuma. Não acelera o trabalho, não gera mais lucro, não produz mais açúcar, o engenho não trabalha mais rápido.É só uma ilustração da violência. Uma ilustração que serve de mote ao debate.Aliás, será que o grande problema é o fato de que a ação não acontece a não ser que o aluno clique no mouse? É isso que torna tudo tão abominável? É no contato entre o dedo indicador do aluno e o mouse que reside o perigo? Pois é só essa a diferença entre a animação que existe no jogo e uma pintura de Debret com o mesmo tema que tanto aparece nos livro de história.Se for isso, é melhor proibir as imagens de castigos também nos livros didáticos, porque lá é bem pior: as crianças não usam um dedo, mas as DUAS MÃOS para chegar à imagem que querem ver! Jesuscristovalhamedeus. E imagine se elas abrem a mesma página várias vezes? Credo. Só queimando os livros. Não vejo outra solução. Para o bem das crianças.
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Sim. Estou desenvolvendo um material didático colaborativo, disponível na internet e gratuito. Professores podem modificá-lo e criar versões personalizadas. Seria como um material didático web-based, utilizando-se todos os recursos midiáticos possíveis e estimulando a interação. Chega de aulas só com texto e,eventualmente, com um filme a cada dois meses. Os professores querem e os alunos precisam de inovação. Precisamos fornecer ferramentas.O segundo projeto é o de continuar a produção de jogos educativos, mas agora, também, web-based. Os que eu produzi,precisava fazer download, instalação, etc. Era burocrático e complicado. A ideia agora é, além de torna-los disponíveis em qualquer lugar, permitir a comunicação entre vários jogadores, inclusive de várias escolas diferentes. Uma espécie de MMO pedagógico.Também queria saber o que você achou dessa polêmica em volta do jogo e dos alunos da UFPR se mobilizando para proibir a distribuição do jogo. Falando sério, me pareceu uma versão chinfrim da igreja batista de Westboro. GOD HATES EDUCATION - Job 13:5. Afinal, que nem aquele pessoal fanático, esses tais alunos jamais vieram conversar comigo. Nenhum mandou uma mensagem dizendo: "Olha, que tal mudar isso e aquilo?", "Que tal conversar sobre esse ou aquele detalhe?", "Vamos discutir isso aí?". Foi só na base do "Não gosto, portanto não deve existir". Vamos gritar, processar, ofender. Fanatismo, não democracia.
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Primeiro, queria dizer que todos os jogos estavam lá para download gratuito, já há dois anos. Aliás, ficaram dois anos no ar, com um botão de doação, e recebi apenas uma doação feita nos últimos dias. Mas não tem problema: o objetivo sempre foi educacional. Mas, se é pra deixar algo gratuito, e ficar sendo atacado por isso, melhor tirar do ar. Eu não tenho vocação para ser que nem aqueles monges do Monty Python.Sobre os links. Putz, eu não gostaria de explicá-los, não. Vai que tem algum aluno que não está conseguindo passar nas disciplinas de História: não sou eu que vai impedir que aprendam alguma coisa. Além disso, minha filha já é grande, e não ando mais com canetinhas coloridas para ensinar a esse pessoal os terrores que a intolerância promoveu na história.E eu? Eu não sou besta pra tirar onda de herói. Sou vacinado.Siga o Pedro Moreira no Twitter.