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Conhecendo o Clube da Luta Virtual de Brighton

O I Am Arcade é uma união do espaço perfeito: um bar popular e um ambiente competitivo que agrada tanto iniciantes quanto especialistas em jogos arcade.

Seja lá qual esporte tivesse nos levado para lá, nossas idas ao centro de lazer local quase sempre acabavam do mesmo jeito: com um grupo de moleques de 12 e 13 anos reunidos em volta do fliperama do Street Fighter II: Champion Edition. Na época, parecia estranho um videogame estar num ambiente tão ativo, mas conforme o tempo foi passando e os videogames se tornaram mais presentes do que nunca, parece natural que aquele fliperama estivesse lá, num contexto esportivo.

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A cena dos esportes (esportes eletrônicos, óbvio) contemporânea é imensa e o nível de competição em alguns títulos – como no jogo de batalha on-line League Of Legends – exige atletas profissionais em seus torneios internacionais.

O Evolution Championship Series, ou simplesmente EVO para os participantes e fãs, atrai milhares para suas finais anuais em Las Vegas, gente que vai torcer por jogadores chamados Crazy DJT 88 e MIOMIMango, enquanto eles batem cabeça em jogos de luta como Street Fighter IV, Ultimate Marvel vs Capcom 3 e, o clássico do GameCube de 2001, Super Smash Bros Melee.

Sam Scaife (em primeiro plano).

Os principais eventos esportivos nos Estados Unidos e no Extremo Oriente podem parecer muito distantes para os jogadores britânicos. Domesticamente, muita da infraestrutura da comunidade de games de luta é composta por grupos isolados – “Versus Scotland”, “Manchester Battle Arena” e o “Triple Threat Tournament Series” de Southampton. Esses são os postos avançados mais importantes, mas há outras reuniões menores.

“O primeiro que fomos foi em Yeovil, num clube de trabalhadores só para homens. Foi um pesadelo”, disse Sam Scaife, cofundador do Fight Lab de Brighton, que realiza o evento “I Am Arcade” duas vezes por mês no Sticky Mike's Frog Bar da cidade. “A gente frequenta os torneios do Super Smash Bros Melee faz tempo, mas eles nunca ofereceram a experiência que esperávamos do vídeo game competitivo. Queríamos fazer alguma coisa melhor e trazer essa experiência para um lugar socialmente aceitável.”

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Todos os fãs de games de luta no Reino Unido conhecem o lendário Heart of Gaming de Londres – o “HoG”, que fica numa propriedade industrial em Acton. Mas mesmo que a meca dos gamers conte com uma bela seleção de títulos aprovados pelo FGC – a localização fora de mão e a decoração estéril podem desencorajar os menos hardcore. O que Scaife e seu parceiro de Fight Lab Robby Gee alcançaram com o I Am Arcade é uma união do espaço perfeito – um bar popular – e um ambiente competitivo que agrada tantos iniciantes como especialistas. E é essa atitude acessível, que recebe bem qualquer nível de habilidade, que está fazendo o evento crescer.

Robby Gee.

“Não fazemos isso pelo dinheiro”, disse Gee, participante do torneio que está entre um dos melhores jogadores de Smash Bros do mundo. “O evento significa muito para as pessoas que frequentam, e significa muito para mim. Sinto que esse evento tem um sentido forte de comunidade. É diferente dos outros. O jeito que as pessoas falavam disso, parecia uma coisa legal para se fazer depois do trabalho, para relaxar. A atmosfera aqui não é como a de muitos outros torneios.”

O I Am Arcade vem realizando uma série de eventos em 2014, jogando Super Street Fighter IV: Arcade Edition e Ultimate Marvel vs Capcom 3, que vai culminar numa final e num prêmio de £1.000 (cerca de R$3.700) ao vencedor. É um belo incentivo para um jogador casual elevar seu nível de jogo, mas fica claro que o dinheiro não está na mente dos frequentadores regulares do Sitcky Mike's. Eles nunca mencionam isso, nem uma única vez. Em vez disso, eles realmente enfatizam o lado social da noite.

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“Quando criamos o I Am Arcade, o foco estava na construção de uma comunidade, e tentamos ser bastante inclusivos”, disse Scaife. “Não queremos apenas interpretar um estereótipo de gamer adolescente. Estamos num bar. Há menos pressão aqui – e ninguém julga ninguém. Viemos aqui para nos divertir. Temos um DJ. O foco não está somente no aspecto competitivo, mesmo que isso seja importante e levado a sério. Mas boa parte disso é sobre reunir todo mundo e nos ajudarmos a melhorar.”

Jake (esquerda) e um amigo.

Jake, um participante de fala mansa, é parte de um público notavelmente variado, abrangendo todo tipo de estereótipos sociais – desde aqueles que parecem nunca desgrudar dos consoles até aquele que pode não ser seu melhor amigo depois da quinta cerveja. Há um número saudável de garotas também. Todos são tratados da mesma maneira, e essa é uma das forças motoras por trás da presença contínua de Jake – e vindo de Uckfield, a uns bons 32 quilômetros da cidade, ele tem certeza absoluta de que a noite oferece alguma coisa que ele não teria se estivesse jogando em casa.

“Quando você joga on-line, é só você e a tela”, ele disse. “É uma coisa muito estéril. Aqui, tem sempre um grupo torcendo por você. Somos animais sociais no fim das contas. Vir até aqui mostra que não somos fechados. Alguns caras aqui parecem meio mal-encarados. Eles são grandes e tem tatuagens. Mas todos mundo adora jogos de luta. Isso acaba juntando pessoas que não se misturariam de outro jeito, e acho que isso demonstra quem são os gamers hoje. Qualquer pessoa pode ser um gamer.”

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Gaz.

Jake tem fibrose cística, o que significa que esportes competitivos convencionais estão fora do limite para ele. “Ter a satisfação competitiva que tenho aqui é muito importante”, ele diz. “Eu nunca tive isso antes de começar a vir pra cá. É incrível.”

O apelo dos games de luta é simples: são jogos um contra um e com muita oportunidade para expressão individual. Muitos jogadores pensam nesses games como xadrez, em que há uma ênfase em prever os próximos movimentos do oponente, só que em alta velocidade.

“As pessoas costumam escolher um personagem e se manter fiel a ele”, disse Gaz, frequentador regular do I Am Arcade. “Sempre jogo Street Fighter com a Chun-Li. Foi com essa personagem que aprendi a jogar e da qual conheço todos os movimento de trás para frente.” Os outros também têm seus favoritos: um cara usando um moletom do Homem-Aranha joga Marvel vs Capcom com o lançador de teias liderando seu time de três, enquanto Jake joga Street Fighter com o boxeador cavalheiro Dudley. Há muito talento no show e momentos emocionantes que juntam um bando de observadores ao redor dos jogadores – especialmente depois de algumas cervejas.

Rick.

Rick se mudou de Peterborough para Brighton, e lá não havia nada parecido com uma cena assim. Ele venceu a série Street Fighter do I Am Arcade de 2013. “Parte disso, para mim, é vir até aqui e encontrar gente que pensa como eu”, ele diz. “E jogar on-line nem se compara com isso. Off-line é muito melhor – você conversa com as pessoas e socializa de verdade. Esse é um dos meus hobbies, e é difícil encontrar gente no mainstream que curte isso também.”

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Na verdade, é estranho que a socialização em torno dos games não seja realmente grande na Inglaterra, já que é algo tão importante em outros países. Nós nos reunimos para assistir partidas de futebol, shows e festivais. O Reino Unido é um dos maiores mercados de video games da Europa e o terceiro maior do mundo, com 33 milhões de jogadores ativos. Os lucros de nossa indústria doméstica de games supera os do cinema desde 2009. E, mesmo assim, existe um estigma persistente sobre aqueles que admitem amar os games. Games são mainstream – veja as vendas do Grand Theft Auto V e The Last of Us em 2013. Ainda assim, o rótulo não desgruda: geek, nerds e gamers ainda são termos pejorativos. Mas, talvez, eventos como I Am Arcade estejam ajudando a mudar isso.

Dan.

“Muitas inovações dos video games vieram da Inglaterra, mas acho que ainda estamos a uma geração de fazer com que os games sejam vistos como mainstream no Reino Unido”, disse Rick. “Você não pode simplesmente sair falando sobre video games no clube – é meio que um tabu. E se você fala sempre disso, acaba se tornando meio desconfortável para as pessoas, por causa desse estigma profundamente enraizado nos games. Mas acho esse tipo de evento excelente. Esse lado social do video game deve ser mais encorajado.”

Esse foi o sentimento repetido por todo mundo com quem falei. Dan, um cara de aparência jovial e tatuado, diz: “Conheci tanta gente aqui, gente com quem eu nunca cruzaria na minha vida normal. Fiz alguns amigos de verdade, e eu nunca teria conhecido esses caras se não fosse por esses jogos de luta. Você vê muita gente nova entrando, e é difícil alguém não voltar. As pessoas costumam se divertir muito, elas começam a se envolver e se tornam frequentadores. É um cena muito boa”.

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Garhling parece um cara totalmente diferente do Dan, com um rabo de cavalo comprido e jogando com um controle personalizado, mas disse quase a mesma coisa: “Há um elemento social enorme na comunidade dos gamers – e não somente nos jogos de luta”, ele diz. “Este é um lugar ótimo para vir, encontrar amigos e conhecer gente nova.” Garhling não tem um console funcional em casa – ele joga exclusivamente aqui, com outros jogadores.

“Testemunhar as pessoas vindo aqui e fazendo parte disso é o que importa”, disse Gee. “Colocamos tudo que fazemos aqui. O I Am Arcade é uma série, mas que queremos transformar num grande evento. Essa é uma comunidade que merece mostrar suas habilidades.”

Atualmente, as façanhas do I Am Arcade estão sendo publicadas no YouTube. Mas, talvez, no futuro – uma geração à frente, ou antes – vamos poder ver esse tipo de competição saudável, e suas qualidades sociais, alcançando um público muito maior. A primeira regra desse clube da luta: fale sobre isso para os amigos. Segunda regra: fale sobre isso para os amigos dos amigos também.

@MikeDiver