Xinguei uma maçã por semanas para ver se ela apodrecia mais rápido

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Reportagens

Xinguei uma maçã por semanas para ver se ela apodrecia mais rápido

Testei a filosofia das vibes do 'cientista japonês' Dr. Emoto, que diz que nossos pensamentos, emoções, intenções e sons podem afetar a estrutura molecular da água.
Hannah Ewens
London, GB
MS
Traduzido por Marina Schnoor

Você é uma pessoa pseudo new age? Você usa aqueles pingentes de quartzo rosa? Já pensou seriamente em fazer um curso de reiki? Se sim, talvez você já tenha ouvido falar do Dr. Masaru Emoto, o "cientista" japonês que magicamente fez arroz apodrecer apenas sendo escroto com ele. Ele literalmente gritou xingamentos para um punhado de arroz, que começou a se decompor.

Mas o Seu Emoto manja mesmo é de água. Ele diz que o H2O é profundamente conectado com nossa consciência individual e coletiva em seu livro Água volumes I, II e III; O Verdadeiro Poder da Água; A Vida Secreta da Água e mais uns oito livros com "água" no título.

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Em um de seus estudos, Emoto separou água em 100 placas petri e deu para cada uma vibe distinta: boa ou ruim. Emoto disse coisas legais para a "água boa" e xingou a "água ruim", e as placas petri foram congeladas.

Eis que a água ruim produziu cristais "feios". Ele até fez uma equipe de Tóquio transmitir seus pensamentos para mais água na Califórnia num teste cego. Os resultados? Exatamente os mesmos.

Emoto continuou estudando o fenômeno de várias maneiras, eventualmente concluindo que nossas vibes — nossos pensamentos, emoções, intenções e sons — podem afetar a estrutura molecular da água. Abaixo, veja uma palestra dele sobre a história do arroz:

Resumindo: se vibrações ruins fazem isso com a água, imagina o que fazem com o corpo humano, que é feito de 60% de água.

A ideia era muito sedutora para mim. A escola de pensamento new age é tipo uma religião modinha para jovens com problemas de compromisso, a.k.a. euzinha. Leio meu horóscopo semanalmente, e confiro meus humores escrotos e paranoia contra os movimentos dos planetas. Assisti tudo de Spirit Science, uma série animada que explica as bases da filosofia new age. Estou preparada — e receptiva — para qualquer besteira mística que possa elevar minha existência além de um pedaço de carne sem sentido, destinado a morrer numa pedrona flutuando no espaço. Não sou nada. Preciso que alguém me guie.

Mas ver é acreditar, dizem por aí. E se eu queria acreditar na filosofia das vibes de Emoto, eu precisava ver os fatos. Então decidi fazer um pequeno experimento.

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Achei uma experiência inspirada no trabalho de Emoto na internet: o experimento de 25 dias da maçã. Você fala bosta para uma maçã e dá amor para a outra, e depois de 25 dias, uma deve estar mofada e fedida, a outra menos. Muitos blogueiros e "pessoas do bem" já tentaram o teste, e dizem que funciona mesmo. Então comprei uma maçã, cortei ao meio e joguei cada metade num pote rotulado, para saber em qual usar meus poderes mágicos da mente.

Antes de trancar as maçãs em suas pequenas celas, achei bom jogar certas vibrações em cada uma, só pra começar os trabalhos. Joguei beijos para a maçã do amor e falei várias putarias sensuais.

Em seguida, numa experiência altamente científica, gritei tão alto com a outra metade da maçã que provavelmente cuspi um pouco nela. Aí deixei os potes atrás da mesa do editorial, prontas para apodrecerem.

Semana 1

Para começar, peguei a maçã do ódio e li para elas alguns comentários da página do Facebook da VICE. "Um monte de hipsters escrotos, espero que vocês morram", gritei pra ela. Acho até que vi a maçã dar uma tremidinha.

Toda manhã antes de sentar para trabalhar, eu canalizava meu ódio e pensamentos negativos para o pote do ódio, e todo meu amor para o pote do amor. A parte do ódio, sem surpresa, foi fácil. Era só pensar em críticas de desfiles de moda descrevendo alguma coleção como "corajosa"; pensar que eu tinha passado pelo meu auge físico aos 18 anos; pensar nas pessoas que sentam no banco do corredor e colocam a bolsa no assento da janela num ônibus lotado. Vai se foder, né?!

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Mas o amor deu mais trabalho. "Você é tão gostosa", "Você é foda", "Vai maçã!", blá, blá, blá. Mas fiz isso todo dia.

(Eu sei o que você está pensando: "Você não fez isso todo dia porra nenhuma. Você achou que dava pra passar batido um texto cheio de fotos e nem falou de verdade com as maçãs, sua relaxada". Honestamente, fiz isso todo dia, fora um dia em que cheguei atrasada, fiquei estressada e esqueci. Somos todos humanos, né.)

Semana 2

A maçã do amor depois de uma semana.

Primeiros dias, e já uma notícia ruim para Emoto. De algum jeito, a maçã do ódio continuava relativamente inteira, apenas com um filme fino de mofo verde crescendo na superfície, enquanto a maçã do amor estava ficando bem feia. Do dia para noite, uns filamentos úmidos começaram a brotar nela, tão longos que tocavam a parede do pote.

Decidi intensificar as coisas um pouco. Mostrei para a maçã do ódio as fotos de perfil dos meus ex-namorados e li mais alguns comentários do Facebook. "[Você] deve ser uma mega escrota", era um deles. "Vai se foder, vaca", era outro. Coisa pesada.

Semana 3

Na terceira semana, estava difícil olhar para a maçã do amor e dizer coisas positivas. Ela estava fedendo. Sempre que eu pegava o pote, subia um cheio de vômito doce. Ela estava toda marrom e infectada, com mofo branco saindo pelos lados do mofo verde. Ela parecia realmente zoada. Enquanto isso, a maçã do ódio estava indo até que bem, ainda manchada apenas por uma camada aveludada da coisa verde.

Nesse ponto eu já estava entediada e esperando que o experimento terminasse logo. Assim como todo mundo. O chefe do andar disse que a maçã precisava ser removida do prédio por razões de saúde. Eu disse que não: eu precisava continuar até o fim.

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Então, no meio da semana, isso aconteceu:

A maçã do amor criou sua própria umidade, formando um pequeno terrário suado. Tinha uma coisa meio satisfatória nisso, algo estagnado atrás do vidro embaçado. O que era essa condensação, eu nunca vou saber. Uma reação violenta e úmida às minhas palavras de positividade? Ela estava ganhando, e nós duas sabíamos disso — e por "ganhando", quero dizer "a maçã não estava obedecendo um conjunto arbitrário de regras que li num blog qualquer".

Semana 4

A foto acima é a maçã do amor nos estágios finais de sua metamorfose. Eu não tinha nada a dizer pra ela. Eu não conseguia mais fingir minhas emoções. Estava tudo acabado entre nós.

Por outro lado, veja a maçã do ódio. Com uma limpadinha, ela ficaria quase boa de novo:

Nossa editora europeia deixou esses Post-Its para mim. E ela estava com sorte, porque no dia em que descobri os bilhetes, era o dia em que essa merda finalmente acabava.

Agora só restava tirar as maçãs dos potes e jogar no lixo.

Com cuidado, abri o pote da maçã do amor.

Abri um mundo de ódio. Se havia alguma dúvida de qual das duas estava mais podre, o fato de que não comi mais maçã depois de sentir o cheiro rançoso da maçã do amor deixa as coisas claras.

Em comparação, o fedor do pote do ódio estava menor. Não pior que o quarto do meu irmão: penetrante, úmido e desagradável, mas não completamente insuportável.

Eu queria que a teoria de Emoto tivesse funcionado. Eu queria que a maçã do ódio tivesse apodrecido, e que eu pudesse dar uma mordidinha na maçã do amor ainda fresca e me nutrir com positividade, amor e luz em cada uma de suas células. Mas não funcionou assim. Da segunda semana em diante, ficou claro que não importava se eu estava gritando com uma maçã ou dando beijos na outra pelo vidro — o processo natural de decomposição não podia ser prevenido.

Dito isso: lá no fundo, ainda acredito que positividade é bom e negatividade é ruim — para a sociedade, para a saúde mental e bem-estar das pessoas, para não ser um babaca de quem ninguém quer ficar perto. Mas isso não coincidiu com os resultados.

Então, aprendemos alguma coisa com o fardo dessas quatro semanas de experimento? Sim, aprendemos que o ódio dos nossos haters do Facebook nos alimenta, nos dá vida e nos faz parecer um pouco menos mofados do que deveríamos.

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