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O Líder Nascente

Aqui vai um apelo para a Coreia do Norte: Você e o Ocidente podem ter uma coisa chamada “relação diplomática e econômica”.

O grande líder da Coréia do Norte, Kim ll-sung, partiu da DMZ pra melhor no dia 8 de julho de 1994. Agora, poucos meses depois da sua morte, enquanto o seu corpo embalsamado jaz para sempre em um caixão de vidro, o mundo se pergunta se o seu filho e herdeiro, Kim Jong-il, vai seguir o legado do pai—explorando, matando e aterrorizando o seu povo. Poxa, Kinzinho! Ainda tá em tempo. Aqui vai nosso apelo: traga o seu país para o século XX antes que ele acabe. Junte-se a nós aqui nos anos 90. A gente pode comer Big Mac e jogar Nintendo juntos. E, melhor ainda, você e o Ocidente podem ter uma coisa chamada “relação diplomática e econômica”. A sua população está passando fome? Nós podemos te ajudar. Quer uma assistência médica melhor (se é que você tem alguma) para as suas crianças que estão morrendo no interior do seu país? Temos médicos! Vocês podem fazer bom uso deles! Tudo que você tem que fazer é cumprir a promessa do seu pai e congelar o programa nuclear. Pare de falar pra todo mundo que os EUA são o Satã e vá trocar uma idéia com o Bill Clinton. Achamos que você vai até gostar dele.  Temos esperança que a questão nuclear se resolva. Até porque há apenas três anos, em 1991, a editora oficial da Coréia do Norte publicou Por um Novo Mundo Livre e Pacífico, o que remete a uma das frases preferidas de Kim ll-sung: “O povo coreano, que está constantemente sob a ameaça de armas nucleares, propôs a abolição das mesmas como uma questão vital para o destino da nação”. Pensando assim, foi estranho o Bill Clinton ter enviado, há alguns meses, o ex-presidente dos EUA, Jimmy Carter, numa missão diplomática para convencer o mestre dos sinais confusos, Kim ll-sung, a congelar o não tão secreto programa de produção de arma nuclear em troca de petróleo e ajuda para desenvolver um programa de energia nuclear. E não é que o desajeitado do Jimmy Carter conseguiu!? O acordo entre os Estados Unidos e a República Popular Democrática da Coréia tem como objetivo controlar a proliferação de armas nucleares e estabelecer relações com o regime ascendente de Kim Jong-il. Na ausência do pai, só resta ao pequeno Kim deixar as coisas rolarem. Mas, infelizmente, todo mundo (menos os cidadãos da Coréia do Norte) sabe que o Kim Jong-il é um riquinho beberrão metido a besta que sempre acreditou poder estimular o crescimento artístico norte-coreano fazendo filmes de propaganda. Hoje, o produtor topetudo tem praticamente poder absoluto. Com Kim Jong-il, o protegido povo norte-coreano vive a repetição do culto a uma personalidade, composto de uma mistura de paranóia antiocidental com um pouco de stalinismo autocrático e um toque de maoísmo revolucionário. O dueto Pai & Filho tem governado a Coréia do Norte desde, de acordo com a lenda, o nascimento do futuro grande líder, em uma base militar soviética (segundo historiadores capitalistas) ou em uma cabana nas montanhas da Coréia enquanto seu pai planejava o próximo ataque contra os japoneses na ll Guerra (de acordo com historiadores norte-coreanos). Mas nada é tão simples quanto parece. Apesar de ter total controle da informação que entra e sai do país, a Coréia do Norte é um país rodeado de inimigos e pseudo-aliados hostis.

No fim dos anos 60, depois de ter sido salvo de uma série de situações potencialmente catastróficas (pelos soviéticos depois de uma luta meio frouxa com o Japão na ll Guerra e com os chineses depois que Mao matou um monte de americanos e os expulsou do paralelo 42), Kim ll-sung estava isolado, vulnerável e paranóico. Ele só confiava em uma pessoa: seu filho Kim Jong-il, que nesse momento crucial miraculosamente decidiu entrar na linha—pelo menos em público. Kim Jong-il imediatamente entrou de cabeça na missão de promover o culto ao seu pai, gradualmente movendo o foco da atenção para si mesmo. Ele produziu uma ópera, Mar de Sangue, sobre a violenta ocupação japonesa e administrou, em pequena escala, a produção dos filmes Juche (a ideologia oficial do estado) norte-coreanos. Esses filmes serviam, entre outras coisas, para eximir o governo da culpa pela fome no país. Nos filmes, atores com caras brancas vestidos como oficiais do exército norte-americano se divertiam atirando em camponeses, crianças que descobriam que seus pais não tinham sido bons traidores durante a guerra e mulheres que fizeram o sacrifício de se casar com soldados inválidos.  Nos anos 70, Kim Jong-il consolidou seu poder, e já no início dos anos 80 ele começou a aparecer em retratos toscos ao lado de talos de trigo. Pai e filho eram vistos constantemente lado a lado nos noticiários da TV. Kim ll-sung gradualmente se tornou a figura benevolente do vovô, enquanto a figura franzida de Kim Jong-il se tornava onipresente. Ele vinha, meticulosamente, se transformando no grande líder de 1994. A verdade é que, provavelmente, Kim Jong-il já vinha governando o país por mais de uma década de forma velada. A transição para o poder seria algo delicado, como sempre, mas não tanto se não fosse pela falta de comida e pelas malditas armas nucleares. Por mais que a Coréia do Norte goste de acreditar na sua independência, ainda conta com os subsídios da URSS e da China, seus maiores parceiros comerciais. Mas o Boris Yeltsin e seus colegas que governam a República Soviética estão muito ocupados tentando descobrir como fazer mulheres jovens, produto número um de exportação, e mamar abastecimento de petróleo mundial, e a China ainda está se curando da queda do muro de Berlim e daquela merda que aconteceu na Praça da Paz Celestial.  Em outras palavras, na falta das superpotências comunistas dispostas a conduzir a Coréia do Norte por esses tempos turbulentos, o país é o equivalente global de uma garota feia e desengonçada que nunca vai ser tirada para dançar com outro país—principalmente se o acordo nuclear não for adiante. Kim ll-sung com certeza acreditava, pelo menos intimamente, que adquirir um arsenal nuclear seria a única garantia para não ser engolido pela nova ordem mundial pós-URSS. Mas quem pode garantir que o pequeno Kim pense da mesma maneira? Será que ainda podemos convencê-lo do contrário?