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O Surto de Flakka nos EUA está Chegando ao Fim?

O barato é louco e o processo é lento.

Flakka apreendida pelos federais na Flórida. Foto cortesia do DEA.

Richard McNeal Hillman tinha grandes ambições para um traficante. Segundo sua confissão num tribunal federal dos EUA, o homem de 54 anos do Tennessee traficou 30 mil gramas de alfa-PVP na Virgínia entre 2012 e 2014. Documentos do caso sugerem que Hillman era parte de uma rede que espalhou o alfa-PVP, um estimulante sintético feito na China e proibido nos EUA conhecido como flakka, para Carolina do Norte, Virgínia e Kentucky.

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Hillman, que se declarou culpado de conspiração para distribuir alfa-PVP e foi sentenciado a 188 meses numa prisão federal em 13 de agosto, teria dito aos investigadores do DEA que seu objetivo era controlar a venda de "cascalho" na Virgínia e se tornar o maior traficante do produto do Estado.

Alfa-PVP, flakka, cascalho – a droga gerou um turbilhão de atenção da mídia e campanhas de conscientização do público nos últimos meses graças em parte aos supostos efeitos voláteis da substância nos usuários, que ficam chapados por horas com apenas um décimo de grama, cujo preço nas ruas varia entre US$ 2 e US$ 5. (Valor ainda menor que o de uma dose de K2 – ou spice – no Brooklyn.)

Porém, enquanto o K2 tem sido visto como um problema principalmente dos sem-teto dos EUA, a proliferação da flakka tem recebido uma abordagem um pouco mais mainstream. A MTV chegou a fazer um episódio de True Life sobre viciados em flakka.

Na Flórida, que continua sendo o epicentro do surto de flakka, usuários se empalaram nos portões de segurança de uma delegacia, correram completamente nus no meio do trânsito e fizeram amor com árvores. Numa nota mais séria, oficiais do condado de Broward, Flórida, disseram que o alfa-PVP contribuiu para a morte de pelo menos 16 pessoas entre setembro do ano passado e abril de 2015. Histórias similares têm surgido em Illinois, Houston, Kentucky, Tennessee e Virgínia, onde Hillman queria reinar supremo.

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A investigação de dois anos sobre ele e seus comparsas deu uma ideia de como e por que o mercado negro de flakka emergiu tão rápido. Ao mesmo tempo, enquanto o DEA trabalha com autoridades estaduais e locais para fechar o cerco aos traficantes de alfa-PVP, a popularidade da substância provavelmente já atingiu seu pico e logo será substituída por outra droga sintética não regulamentada, segundo um funcionário do alto escalão da agência.

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"Não acho que isso vai continuar aqui por muito mais tempo", opinou A. D. Wright, agente especial no comando do escritório do DEA em Miami, que é responsável pelo Estado da Flórida. "Isso não quer dizer que isso vá desaparecer", ele acrescentou. "[Os laboratórios de drogas chineses] alteram o composto químico, e temos de começar tudo de novo."

Essa é a realidade que as autoridades enfrentam em se tratando de drogas sintéticas, com fórmulas que mudam mais rápido do que a capacidade de os federais as regularem.

Durante sua entrevista para a VICE, Wright informou que seu escritório está trabalhando em 17 casos envolvendo tráfico de alfa-PVP. "Vemos isso com traficantes de múltiplas drogas", ele destacou. "Flakka não é o único produto com que eles estão lidando. [Os traficantes] vão do crack ao ecstasy, [incluindo] até outros tipos de drogas sintéticas."

O primeiro caso federal na Flórida focado exclusivamente no tráfico de alfa-PVP foi iniciado em maio. Um processo criminal no tribunal federal de Palm Beach foi aberto contra Kevin Bully, um homem de Fort Lauderdale que já tinha sido preso por tráfico de ecstasy e cocaína, e sua namorada, Jaime Nicole Lewis. Eles são acusados de trazer vários quilos de flakka de Hong Kong para o sul da Flórida entre março e abril. Os dois casos ainda estão pendentes.

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Em junho, dois homens do centro da Flórida, Michael J. Hernandez e Jonell Phillip Vega-Mercado, foram acusados no tribunal federal de Miami de conspiração para importar 10 quilos de alfa-PVP. Agentes disfarçados pegaram os dois tentando recuperar um pacote mandado para um endereço falso. Hernandez e Vega-Mercado se declararam culpados no mês passado.

Como geralmente é o caso com todo novo produto, os traficantes correram para o alfa-PVP por causa das imensas margens de lucro. "Com apenas alguns toques num teclado, um traficante pode encontrar uma fonte e comprar o produto", me contou o agente Wright. "É como comprar na Amazon."

Um traficante pode conseguir um quilo de uma fonte chinesa por algo entre US$ 1.500 e US$ 2 mil e vender isso nas ruas por US$ 6 mil, ele acrescentou.

Em 2012, o escritório do DEA em Miami cruzou por acaso com uma substância cujos testes de verificação de substâncias indicavam um resultado positivo para alfa-PVP. Esses testes foram realizados por agentes que estavam coletando amostras aleatórias de K2 e sais de banho vendidos no varejo ao redor da Flórida. "Naquela época, isso custava US$ 80 meio grama", afirmou Wright. "Hoje, você consegue um décimo de grama por US$ 5."

Hillman já estava no fundo do jogo do cascalho quando chamou a atenção do DEA, que estava investigando seu fornecedor-chave em 2012, um homem da Carolina do Norte chamado Randall Scott Braddock. Quando Hillman foi preso em 16 de março de 2014, os investigadores encontraram 100 gramas de alfa-PVP embalados em sacos prateados em seu carro, além de munição para pistolas de vários calibres, segundo sua confissão.

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Os documentos do processo também atestam que Hillman admitiu obter 100 gramas de alfa-PVP regularmente entre 2012 e 2013. Um ano depois, ele estava comprando um quilo da droga por semana.

Braddock, o fornecedor de Hillman, supostamente importou e distribuiu entre 35 e 75 quilos de alfa-PVP de 2012 a 2014, de acordo com as informações que constam na proposta de acordo dele com o promotor federal. Braddock vendia grandes quantidades para clientes como Hillman; em seguida, essas pessoas cortavam a droga e a vendiam nas ruas da Carolina do Norte, do Tennessee e de Virgínia.

Segundo o pedido de acordo, Braddock admitiu que importava alfa-PVP da China através de uma empresa chamada Kanshuo Biotech Co. Ele se comunicava com uma funcionária da Kanshuo, identificada apenas como "Alice", por e-mail. Por exemplo, num e-mail de 2 de novembro de 2012 obtido por mandado pelo DEA, o acusado elogia a qualidade do produto que estava recebendo. "Por favor, me mande 500 gramas de alfa-PVP de um lote bom, como você sempre faz, assim que puder", escreveu Braddock. "Obrigado." Subsequentemente, ele transferiu US$ 800 para a companhia através da Western Union.

Depois que 500 gramas da droga foram apreendidos pelo DEA quando ele foi parado em Weaverville, Carolina do Norte, em 8 de janeiro de 2013, Braddock fez seu parceiro de negócio, Josh Lindsey, enviar os e-mails para Alice. No dia 12 de janeiro daquele ano, Lindsey escreveu: "Tenha cuidado ao enviar para o Tennessee e a Carolina do Norte porque Scott Braddock teve problemas!! Mas Carolina do Sul é OK!!", acrescentou Lindsey. "Sim, gosto quando você rotula como tinta acrílica!! E não mande mais para a Carolina do Norte!"

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Alice respondeu mais tarde naquele dia. "Oi, que problemas Scott Braddock teve agora?", apontando mais tarde que "Apvp é pó cristalino agora, não cristal".

Braddock continuou traficando flakka depois de ser formalmente acusado e libertado para aguardar o julgamento; no entanto, ele foi preso novamente em 2 de outubro de 2014 depois de se encontrar com uma informante que fingia estar interessada em pagar US$ 50 mil pelo contato com Alice e a Kanshao.

Wright frisou que a única maneira eficiente de impedir a proliferação de drogas sintéticas é se a China reprimir os laboratórios de produção – e sugeriu que os federais estão prontos para avançar em seus esforços para atingir o produto na fonte.

"O governo chinês precisa entrar no jogo e começar a regular alguns desses componentes químicos", disse Wright. "Garanto que, daqui a alguns meses, vai haver algo por aí com outro nome e problemas diferentes."

Francisco Alvarado é um jornalista investigativo freelance que trabalha na Flórida. Siga-o no Twitter.

Tradução: Marina Schnoor