FYI.

This story is over 5 years old.

Noticias

O Pessoal do Occupy Londres Sabe o Que Quer (Nem)

Depois do sucesso da Occupy Wall Street em Nova York, no sábado passado, cidades do mundo inteiro se encheram de manifestantes querendo ocupar, cantar e fazer malabares em lugares públicos.

Depois do sucesso da Occupy Wall Street em Nova York, no sábado passado, cidades do mundo inteiro se encheram de manifestantes querendo ocupar, cantar e fazer malabares em lugares públicos. No geral tudo correu bem. Em Roma a coisa ficou um pouco embaçada por causa do gás de pimenta, mas provavelmente foi culpa do calor e do temperamento latino da galera. Eles sempre foram super emotivos, né?

Um pouco antes do meio dia, Londres começou a ver seu quinhão de ocupantes. Inicialmente houve uma briga ou duas, já que os manifestantes não conseguiram ocupar o pedaço de calçamento que deveriam ocupar. Isso porque a Paternoster Square é propriedade privada, e o dono, com certeza um maligno porco capitalista, tinha conseguido uma liminar proibindo a presença deles. De maneira mais geral, havia um monte de policiais rondado o local que não pareciam muito empolgados com a ideia, apesar da presença de Billy Bragg, vagando como um fantasma dos protestos britânicos passados.

Publicidade

Depois que todo mundo se acomodou na arena pública mais acolhedora da Praça St Paul, os manifestantes foram direto ao que interessava, com discursos contínuos sobre ‘o sistema’, ‘ganância corporativa’ e ‘instalações de tratamento de água’. Cada linha ecoava no meio da multidão como sussurros políticos chineses para garantir que todo mundo entendesse bem a mensagem. Como Harry Cheadle apontou em seu artigo sobre a ocupação de Wall Street, é uma técnica tão inteligente quanto irritante.

Todos os rostos familiares estavam lá. Fãs do cinema…

…representantes dos skatistas londrinos…

…donas de casa gays…

…Lynn do Alan Partridge…

…um noivo e uma noiva que tiveram o carro vaiado porque acharam que eles eram banqueiros fingindo ser recém casados só para zoar…

…Richard E. Grant…

…Jesus…

…e Deus.

E então, logo após as 14 horas, Julian Assange apareceu. Fez um discurso vibrante onde falou algumas coisas que já tinham sido ditas antes, repetindo seu truque de chamar todo mundo da mídia de criminosos de guerra e foi embora. Obrigado por fazer a gente se sentir tão especial, Julian. Beijo, tchau.

Mais ou menos nessa hora, a polícia criou um cordão muito cuidadoso ao redor da praça que foi efetivo o suficiente para parar o tráfego e prender vários motoristas de ônibus com cara de bosta numa espécie de purgatório punk. As pessoas começaram a jogar futebol, o que só deixou os motoristas mais fulos, e revelou a proporção alta de jornalistas para manifestantes. A atmosfera, e o sol, estavam bem gostosinhos. Algumas barracas foram erguidas.

Publicidade

Começou a anoitecer, a polícia removeu o cordão e liberou o tráfego e as coisas ficaram um pouco mais claustrofóbicas pra todo mundo. Murmúrios se espalharam através da multidão de que um gordo tinha sido preso, e trouxeram alguns banheiros químicos para o protesto. E foi em boa hora, porque todo mundo estava bem apertado.

Quando as coisas estavam ficando meio caídas, o pessoal dos malabares decidiu levantar a galera com um pouco de percussão, inspirando um grande grupo a dançar bem na frente duma passagem que a polícia tinha criado para que as pessoas entediadas pudessem voltar para casa. O primeiro dia foi declarado ‘um sucesso’.

Voltei a St Paul na segunda para ver como as coisas estavam progredindo (sem a câmera – todas as fotos deste post foram feitas pelo Henry Langston no sábado). Um cheiro de mijo pairava no ar, mas podia ser o cheiro normal do centro de Londres. Falei com algumas pessoas para saber como elas estavam passando por tudo aquilo.

Uma moça me explicou: “Estamos fazendo um protesto pacífico, estamos dando abraços gratuitos… Estamos fazendo isso de maneira diferente porque a violência não te leva a lugar nenhum”.

Ela disse que, como membro do Anonymous, queria “derrubar a taxa de juros, para que então pudéssemos ter um teto sob nossas cabeças”. Depois ela começou a viajar e disse “todos temos essas religiões diferentes com direitos diferentes, de cobrir o rosto, por exemplo”, e afirmou que “os Sikhs têm o direito de usar turbantes e carregar espadas”. Também disse que os Anonymous “esperavam virar uma religião”. Nessa parte eu fui embora.

Publicidade

Aí eu encontrei o Will e a Jim, da banda Will And The People, que tocaria na praça mais tarde naquela noite. “Estamos aqui para espalhar amor e música, basicamente,” disse Will, “temos todo nosso equipamento pronto para tocar mais tarde na frente de todo mundo e da polícia, cara, eles nos ajudaram a arrumar tudo. Dissemos pra eles que tocaríamos ska e reggae hoje à noite e parece que eles curtiram”.

Não fiz nenhuma imagem do Will, mas aqui tem uma foto de divulgação da banda para você não ficar triste.

A barraca do Will cheirava maconha. Ele tinha sido incomodado por fumar aquelas toras em público? “Não, nem um pouco. Tem sido bem sussa.” Os policiais não pediram pra dar um tapinha? “Ia ser dá hora, né? Mas nem rolou.”

Perguntei então pro Will e pra Jim o que eles esperavam alcançar acampando ali. “Acho que nosso amigo Caz colocou isso muito bem quando disse: ‘Pessoal, vamos todos sentar aqui e esperar que nada aconteça e então, eventualmente, alguma coisa vai acontecer’”.

O Will e a Jim me levaram para conhecer o Caz, um mágico que estava ajudando na barraca da comida. De longe vi um cara de terno falando alto sobre companhias que era ‘grandes demais para falir’. Ele é um dos caras mais apaixonados que já conheci”, disse Jim. “Essa é a parte interessante”, continuou o Will, “Não são apenas os ativistas e os hippies, mesmo pessoas com empregos normais estão dizendo ‘Somos escravos!’. Eu pensava que a escravidão tinha acabado, sabe, mas realmente somos… Oops”. O entusiasmo dele deu uma freada abrupta.

Publicidade

Mas tudo bem, tínhamos chegado até o Caz, que ficou super feliz em falar com a gente. “Meu envolvimento? É tudo ao meu redor. Ajudando na cozinha, ajudando a falar com a polícia, fazendo algumas entrevistas. Somos como a brisa, uma brisa suave, conhecimento e entendimento baseado em esquecer a si mesmo e se fundir ao ambiente. Todo mundo está adorando”.

Tinha ouvido falar que os manifestante eram bastante diversos, então perguntei ao Caz o que unia as pessoas do Occupy Londres. “Bem, pelo que sabemos no geral: guerra, crise econômica, dívida, colapso e tudo que a gente ouve por aí… Todo mundo está aqui por causa da Bolsa de Valores. Não sabemos o que realmente acontece na Bolsa de Valores. Ninguém sabe, mas há ações, e trocas, e eles trocam uma coisa por outra… Commodities, comprar países e vender países e interesses pessoais e esse tipo de coisa.”

“Estamos aqui, na verdade, por algum tipo de mudança e acho que essa mudança vai ser bem grande. Algum tipo de mudança ‘libertadora’. Colapso econômico, colapso da moeda, caos; ordem a partir do caos.”

OK.

“Ainda estamos pensando em como faremos essa mudança, vai levar algum tempo. É um negócio grande. Vamos fazer a mudança usando nosso conhecimento de maneira habilidosa.” Aí que entra a mágica, percebe? “Meu trabalho é alegrar as pessoas. Num show ontem fiz aparecer dinheiro do nada e depois fiz desaparecer. Demonstrei o que eles estão fazendo em larga escala. O que a Reserva Federal faz em larga escala.”

Publicidade

Honestamente, o Caz era muito gente boa, e muito apaixonado, e cozinhava muito bem também. Mas seu plano de ação parecia meio cru. Achei melhor ouvir uma segunda opinião. Tudo o que você escuta nas notícias e os manifestantes isso, os ativistas aquilo. E os banqueiros? Quando eles vão ter a chance de esclarecer as coisas?

Agarrei o primeiro banqueiro (bancário, sei lá) que vi pelo caminho. Seu nome era Paul. O Paul “trabalha no centro, num banco” e com certeza teria alguma coisa para dizer sobre esses manifestantes fedidos acampados do lado de fora do seu trabalho.

“Não tenho nada contra”, disse. “Acho importante ser não violento, a mensagem é muito mais efetiva quando não é violenta. Se eu tenho alguma opinião sobre o que eles estão protestando? Sobre o que eles estão protestando mesmo?”

Desigualdade, bônus aos banqueiros, ajuda financeira voltada para os lucros privados ao invés da economia pública etc.

“Acho que 20% de impostos sobre os ricos é uma boa ideia. O problema é que as pessoas ricas tendem a continuar ricas. Isso meio que vem no pacote, né?”

Paul, ao que parece, tocou num ponto chave aqui, aquilo que escapou aos ocupantes, ou os deixa tão deprimidos que eles resolveram nem mencionar. Não é porque finalmente sacamos o que está nos incomodando que sabemos o que fazer para escapar. Fator de uma apatia pública maior (“Quem vai ter que limpar isso tudo? Pois é”, nos disse um gari quando tentamos politizá-lo), você terá um mistura louca de otimismo, vida em comunidade e derrota.

E chegamos aqui. Como qualquer viagem, é melhor avaliar tudo depois de sua conclusão. Alguns inevitavelmente vão ver o fim iminente do capitalismo diante de nós, outros vão achar que tudo isso foi tão útil quanto um chute no saco. Ainda há vários hippies empolgados lá em St. Paul, e só eles saberão com certeza se o policial estava certo quando me disse mais cedo que: “Sem a imprensa e a gente aqui, só umas cinco pessoas teriam se dado ao trabalho”.