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Punks Nômades

A maioria deles estão online. Mesmo os fugitivos adolescentes sem-teto mais pobres — mais de 62% deles têm um celular e gastam dinheiro com seus planos de dados e não com comida.

Oh, a vida dos punks xixi do século XXI — os infinitos quilômetros dos trilhos de trem, as DSTs contraídas em prédios ocupados secretos, o terroir distinto das diferentes maria-loucas encontradas nas andanças por muquifos e a coceira causada pela onipresença da sede de viagens e pelos piolhos. Só podemos imaginar o que acontece com eles e seus cachorros de bandana depois de dormir em caixas de papelão ou de tocar covers estranhos para algum ex-punk saudosista por alguns trocados. Agora eles estão online – bom, pelo menos a maioria deles está. Mesmo os fugitivos adolescentes sem-teto mais pobres — mais de 62% deles, de acordo com um estudo feito pela USC School of Social Work — têm um celular e gastam dinheiro com seus planos de dados e não com  comida e abrigo, já que geralmente conseguem isso de graça. E eles têm uns aos outros, e têm o Punk Nomad.

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Desde 2001 até recentemente, o Punk Nomad era conhecido como Squat The Planet. Blog originalmente fundado por Matt Derrick (conhecido online como Matt Pist) para documentar suas viagens pela Europa, o STP eventualmente morfou para o mural internacional dos jovens sem-teto, pessoas que viajam clandestinamente em trens, anarquistas e transientes de todos os tipos para reclamar da polícia local, conhecer parceiros para viagens através dos Estados Unidos e compartilhar dicas práticas de saúde, abrigo, comida, como ficar bêbado e sobreviver na estrada.

Quando o Occupy Wall Street começou no ano passado, o STP foi uma das primeiras comunidades online inicialmente abordadas para participar. Alguns vão se lembrar da Yell, membro da STP que participou do protesto de topless e levou spray de pimenta na cara do Sargento Anthony Bologna alguns dias depois. Seja uma reunião da cúpula do G20, uma comemoração do dia de São Patrício ou qualquer confabulação de tema anarquista, alguém da comunidade ou estará lá ou conhece alguém que está.

Mas veja bem: o Matt Derrick já tem 32 anos. Ele não pega carona num trem desde 2008. E conforme sua infância vai se tornando uma mera imagem no retrovisor, ele começa a reimaginar o site e sua comunidade como um portal para dicas de viagens para gente realmente falida. Ele renomeou o site como Punk Nomad e o está carregando com depoimentos e vídeos lá da sua casa em East Jesus, uma colônia para artistas dentro de uma ocupação de 50 anos em Slab City. Matt planeja transformar sua comunidade de cinco mil membros nos criadores de conteúdo da Hobopedia. Pode não ter a densidade demográfica do Pinterest ou do Facebook, mas Matt imagina que se puder tirar uns $300 dólares por mês com o site tudo vai dar certo. “Tento não planejar mais do que seis meses no futuro”, declara. Então, aparentemente, algumas coisas não mudaram. Veja abaixo o que o Matt tem a dizer sobre isso.

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VICE: Como você se envolveu no estilo de vida dos sem-teto?
Matt Derrick: Saí de casa quando tinha 18 anos e caí nesse estilo de vida acidentalmente. Já gostava de punk rock e metal, crust core, coisas assim. Mas tudo começou mesmo quando tentei me mudar para Los Angeles e meu carro quebrou em Eugene, Oregon. Acabei tendo que pedir carona e conheci outros viajantes, o que realmente me fez entrar na cena.

Como a comunidade mudou nessa última década?
Por um longo tempo todo mundo dizia: “STP, o mural de mensagens dos caroneiros de trem”. E era bem isso mesmo. Mas a última vez que andei clandestinamente num trem foi em 2008, e depois de pegar carona por aí em carros de desconhecidos e trens por oito anos a coisa começou a perder a graça. E ao mesmo tempo, todo mundo começou a curtir muito o site, mas eu não queria apoiar um estilo de vida com o qual não estava mais envolvido. Foi nesse ponto basicamente que comecei a tentar transformar o site para englobar todos os diferentes subgêneros de viagem e formas de viajar independentemente. E é nessa direção que estou levando o Punk Nomad.

Qual a sua visão para o Punk Nomad?
No momento estou apenas escrevendo histórias. Quero ter um grupo de escritores que queiram contribuir o tempo todo com histórias sobre diferentes estilos e formas de viagem independente. E, além disso, o site vai ser apoiado pela comunidade de pessoas interagindo e se encontrando em murais de mensagem. Mas também estamos trabalhando como uma Wiki Nômade, que é um sistema colaborativo de informação, então você vai poder procurar por estado, tipo Califórnia, Slab City, e saber todas as informações sobre o lugar. E as pessoas vão poder atualizar essas informações também. Vai ser totalmente feito com contribuição de usuários. Não quero ser o chefão do site ou da cena. Quero que o site seja sobre o aspecto de comunidade, com todo mundo agindo junto.

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Viajar clandestinamente em trens é um passatempo histórico para os párias da sociedade. Antes do Occupy, o maior assunto das conversas no site parecia ser a questão atual do Four Loko.
É verdade. Muitas coisas aconteceram na subcultura nos últimos dez anos. Houve essa ascensão do que eu chamo de Scumfucks, ou Scumfuckismo, esses moleques babacas completamente apáticos com tatuagens na cara, bêbados e fedidos o tempo todo, que não se importam com porra nenhuma além deles mesmos. Esse foi um dos motivos pelo qual comecei a afastar o site das viagens clandestinas de trem, porque isso tomou conta completamente dessa cultura em minha opinião. Eles fogem do mundo e da sociedade e fazem isso com alcoolismo também. É tudo um escapismo, sabe?

Em dezembro de 2010, uma ocupação pegou fogo em Nova Orleans — foi o maior número de mortos num incêndio em 25 anos e eram todos caroneiros e viajantes. Pelo que você conhecia dessa ocupação, isso poderia ter acontecido antes?
Absolutamente, isso poderia ter acontecido com qualquer uma. Basicamente, pelo que entendi, todo mundo morreu por asfixia de monóxido de carbono antes de serem queimados. Quando as pessoas ficam completamente fora de si o dia inteiro, alguma coisa vai acontecer, como deixar a fogueira da ocupação acesa ou uma vela no prédio, e geralmente é isso que acontece — você desmaia e está muito bêbado para acordar até as chamas estarem muito perto de você, ou até a fumaça de matar. Isso já aconteceu antes.

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Fale um pouco sobre Oogles.
Essa palavra era usada com um significado completamente diferente 10 anos atrás. Em 2001 eu a usava para me referir a meninos de rua viciados. Hoje a definição é um garoto de rua inexperiente que faz alguma merda que fode as coisas para outras pessoas, porque ele é jovem e não sabe o que está fazendo. Acho que está um pouco banalizada demais e eu não chamo ninguém de Oogles nem nada, mas acho engraçado o jeito que as pessoas usam essa palavra agora.

Qual é a história sobre o vídeo Rail Rider que você postou no site? Parece ser uma tendência relativamente nova na cultura de viagens clandestinas de trem.
Alguém estacionou aqui outro dia com um desses amarrado em cima do carro. E eu fiquei tipo “Que negócio é esse?”, e o cara disse: “Ah, é um railrider. Você coloca nos trilhos como um carrinho de kart”. Me lembro de ter visto alguns vídeos sobre railriders que você podia pedalar pelos trilhos uns quatro ou cinco anos atrás, e achei aquilo incrível. Aí só de ver um cara com um desses estacionado ali pirei. Falei pra ele: “Cara, você precisa me levar pra dar uma volta!”.

Além de caronas e viagens de trem, o que mais você planeja explorar com o Punk Nomad?
Sou fascinado por viagens marítimas. Acho que não tem anarquistas ou punks suficientes fazendo isso. Fiquei inspirado por alguns pequenos grupos, como o Miss Rockaway Armada. Eles construíram uma barcaça e desceram o Mississipi, tática clássica de viagem, mas era uma grande barcaça artística com muita gente fazendo arte e tocando música. Essa é uma maneira realmente livre e independente de viajar e ver coisas que as pessoas nunca veem. E também tem gente como o pessoal do Floating Neutrinos, que foram os primeiros a navegar da Costa Leste americana até a Espanha ou a França num barco feito de lixo. Isso foi em 91 ou 92, acho. Tem também o blueanarchy.org. Esse cara na baía de São Francisco, o Moxie, que pega barcos abandonados e os conserta e ensina as pessoas a navegar. E tem esse outro cara que construiu sua própria ilha com garrafas recicladas. Ele apareceu no Ripley's Belive It Or Not! no meio dos anos 90. Ele construiu sua própria ilha com 600 mil garrafas de plástico recicladas, apenas colocando terra sobre elas. Tem mais de 90 metros de largura. Tem árvores e um bangalô de dois andares e ele consegue fazer a ilha descer o rio com um pedaço de pau. É uma coisa incrível. Por que não tem mais gente fazendo isso? É esse tipo de coisa que eu quero documentar e mostrar pra todo mundo que é possível fazer.

Temos o mar aí, mas o ar provavelmente vai ser mais difícil por causa das regulamentações da FAA.
Mas acho que alguém podia tentar algo com aeronaves.

Viagens espaciais…
Sim, um dia desses. E há outras coisas também, como tentar agendar passagens num navio de carga ao invés de voar através do oceano. Essa é uma das coisas que estou procurando, mas é muito caro em todos os lugares em que perguntei. Tenho uma lista de coisas que quero fazer antes de morrer. Como viajar de costa a costa num ciclomotor. Quero construir meu próprio ultraleve e voar pelo país. Qualquer maneira que consiga fazer isso seria incrível, fazer de graça e do jeito que eu quero.

E ajudar outras pessoas a fazer também.
Sim, é esse o objetivo do Punk Nomad, ajudar outras pessoas a ganhar mais liberdade em suas vidas e a terem experiências melhores.