FYI.

This story is over 5 years old.

Noticias

Simpatizantes da Irmandade Muçulmana Estão Queimando Igrejas no Egito

Islâmicos começaram a queimar igrejas, lojas e escolas coptas em cidades cristãs do Egito. Falamos com três testemunhas e cada uma delas tem uma perspectiva diferente sobre o que aconteceu.

Imagem cortesia do Christianity Youth Channel

Ontem, enquanto o mundo se concentrava na dispersão brutal dos acampamentos de protesto pró-Morsi no Cairo, o que já resultou em pelo menos 638 mortes, a minoria cristã copta do Egito, formada por menos de 10% da população, enfrentou sua própria crise quando islâmicos começaram a queimar igrejas, lojas e escolas coptas em cidades predominantemente cristãs do país.

Publicidade

O grupo de defesa dos direitos coptas União Jovem Maspero estima que cerca de 36 igrejas foram incendiadas em nove condados com as maiores comunidades coptas. Ishak Ibrahim, um pesquisador da ONG egípcia Iniciativa pelos Direitos Pessoais, acrescentou que um monastério, dois escritórios de serviços sociais e três escolas foram atacadas, e sete igrejas foram assaltadas. (E a violência continua — ativistas da Nile Revolt estão mantendo um registro detalhado sobre a violência contra cristãos no Egito.) Ishak teme que as coisas possam piorar. “Muitas das igrejas incendiadas estavam nas principais cidades de cada condado”, ele disse. “Mais [incêndios] são esperados em vilas mais distantes nos próximos dias com a ausência da polícia e do exército.”

Ainda não está claro se a Irmandade Muçulmana e seus simpatizantes estão visando deliberadamente alvos cristãos (alguns prédios do governo também foram atacados) ou se os ataques foram premeditados. Em todos os casos, a comunidade copta está sendo devastada. Falei com três testemunhas dos ataques de três condados. Todas têm perspectivas diferentes, mas nenhuma delas espera que o governo intervenha. Algumas disseram que a polícia ou os militares só chegaram muito depois dos ataques, ou sequer apareceram.

VICE: Você pode nos contar o que viu?
Marco Rasmy, ativista de Sohag, uma cidade na margem oeste do Nilo: Às 8h30, [membros da Irmandade Muçulmana] estavam reunidos na Al Thaqafa, a principal praça de Sohag, ponto de encontro deles na cidade – também é lá que fica a igreja Mar Guirguis. Às 9h, vi um ônibus da igreja ser atacado e queimado pelos manifestantes enquanto eles gritavam “Islameya! Islameya!” [Estado islâmico] e amaldiçoavam os coptas. Como eles não conseguiram invadir a igreja por causa da porta de ferro, eles quebraram as placas de sinalização em frente e arrombaram a porta do anexo da igreja. Então, eles começaram a atacar todas as lojas ao redor da praça, incluindo a farmácia do Dr. Mounir, que ficava bem ao lado. Eles incendiaram carros, depois invadiram prédios, incluindo um prédio de apartamentos bem em frente à igreja – as pessoas estavam correndo e tentando escapar. Isso continuou até às 11h30, quando os veículos blindados do Ministério do Interior chegaram e dispararam gás lacrimogêneo. Eles lutaram até às 13h.

Publicidade

À noite, voltei para ver como as coisas estavam. Três capelas foram queimadas e saqueadas, os prédios administrativos foram completamente queimados. Quando o toque de recolher começou [às 19h], fui até o hospital para saber o estado das vítimas. Me disseram que as pessoas foram feridas com balas e cartuchos. Por volta dessa mesma hora, a Igreja da Virgem também foi atacada [do outro lado da cidade]. Ouvi dizer que o prédio sofreu danos semelhantes.

Como você tem certeza de que a Irmandade Muçulmana é responsável?
Tenho certeza porque tenho frequentado os protestos desde novembro de 2011, e sei muito bem quem são [os membros da Irmandade] e como eles agem. Muitos deles estavam usando a faixa verde na cabeça e carregavam bandeiras verdes [da Irmandade Muçulmana]. E o ponto perto da igreja onde tudo começou é o lugar onde os manifestantes da Irmandade Muçulmana sempre se encontram.

Em sua opinião, qual a razão desses ataques?
Eles sempre odiaram os coptas. Eles gritavam contra nós na Praça Al Theqafa, incitando a violência desde 30 de junho [quando os protestos contra o presidente Morsi começaram]. Há mais de um mês, eles estão provocando as pessoas – além disso, eles sabem que tentar atacar o exército é uma batalha perdida. É mais fácil nos atacar. Eles acreditam que os cristãos são os responsáveis pelo que aconteceu no dia 30 de junho, mesmo que outras pessoas também tenham participado do protesto – como o Xeique el Azhar [um proeminente líder muçulmano]. Mas de jeito nenhum eles atacariam pessoas assim.

Publicidade

Como a comunidade cristã de sua área se sente a respeito do que aconteceu?
Andei pela área depois do ataque – muitas pessoas estão com medo e querem fugir, outros são mais estoicos. Há uma sensação de tristeza reprimida. Sohang nunca ficou nesse estado antes. No entanto, muitas pessoas agradecem a Deus por ninguém ter morrido. No final das contas, prédios podem ser reconstruídos, mas não se pode ressuscitar os mortos.

O que você acha da resposta do governo e do exército aos ataques? Você acha que eles estão fazendo o possível para proteger as igrejas e os lares cristãos?
Acho que o exército não se precaveu de forma apropriada. Eles não calcularam o desfecho da Rabaa e a resposta deles foi incrivelmente lenta. O ataque aconteceu das 9h às 11h30 e não havia um único policial ou soldado lá. Qual é a desculpa deles para não interferir antes?

Você teme que isso possa continuar?
Honestamente, a comunidade cristã não pode fazer nada. Mais ataques estão acontecendo hoje e nada tem sido feito sobre isso. Além disso, o que podemos fazer? As pessoas lutam para ter o que comer, elas não vão usar o dinheiro da comida e para comprar armas. Isso não faz sentido.

 ***

Por que você acha que os cristãos se tornaram alvos? Não faria mais sentido a Irmandade Muçulmana atacar o exército ou prédios do governo?
Bispo Kirollos Gendi de Faiyum, uma cidade ao sul do Cairo: Não sei. Sempre fomos vizinhos e amigos. Nunca houve nenhum indicador de que algo assim pudesse acontecer. Estou verdadeiramente chocado; não sei o que dizer nem o porquê desses ataques em particular. Isso não faz sentido.

Publicidade

Como a comunidade cristã na área se sente sobre o que aconteceu?
Todo mundo está triste e aterrorizado, especialmente os muçulmanos moderados que sentem que esses incidentes estão difamando sua religião.

Se isso continuar, como a comunidade cristã vai reagir?
Agora, estamos somente tentando proteger a igreja e as pessoas estão tentando salvar o que podem. Fora isso, não tenho como lhe dizer.

***

Como a comunidade cristã de sua área se sente sobre o que aconteceu?
Bispo Weissa Sobhi, da cidade de Deir Mawas: Todo mundo está aterrorizado. A Irmandade Muçulmana está andando nas ruas com metralhadoras. Ninguém está saindo de casa.

Sei que a Igreja Copta está pedindo que seus seguidores não retaliem, mas você acha que há alguma chance de alguém tentar resolver a questão com as próprias mãos?
Não é típico de nossa religião retaliar ou procurar por vingança, além do mais, isso só aumentaria a violência, então, qual seria o sentido disso?

O que você acha da resposta do exército ao que aconteceu? Eles estavam preparados para isso?
O exército está concentrado nas cidades maiores, não está sequer pensando em outras cidades e vilas.

Como vocês planejam reconstruir sua igreja? A comunidade fará isso ou vocês dependem do governo?
Ainda preciso me encontrar com os chefes da Igreja e decidir essa questão.

Se isso continuar, como a comunidade cristã vai reagir?
Vamos aguentar da melhor maneira que pudermos, mas estou preocupado que as pessoas comecem a deixar o Egito por temerem por suas vidas.

Publicidade

@lasoubrette

Mais sobre a crise atual no Egito:

Mesquitas Estão Virando Necrotérios no Cairo

A Irmandade Muçulmana Foi Massacrada no Cairo

Visitei o Acampamento da Irmandade Muçulmana no Cairo Logo Antes do Ataque dos Militares