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Um Pantera Negra da Nova Geração fala sobre Baltimore

Conversamos com o General T.A.C.O. (traduzido, significa "Derrubando Todos os Capitalistas") sobre Baltimore, Freddie Gray, a trégua entre gangues e o movimento Black Lives Matter.
Foto por Malcolm Ali/cortesia do Black Riders Liberation Party.

General T.A.C.O., a.k.a. Wolverine Shakur, é o líder do Black Riders Liberation Party, um grupo de Los Angeles conhecido como "A Nova Geração Do Partido dos Panteras Negras para Autodefesa". Como esse nome implica, eles não têm vergonha de seu ativismo: em março, eles viajaram até o Texas e marcharam com o Huey Newton Gun Club, carregando armas até o capitólio estadual para "dar o grito de autodefesa armada" da comunidade negra.

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Nos EUA, a ligação entre ativismo negro e controle de armas vem de muito tempo atrás. O "porte aberto" de armas de fogo foi proibido em 1967 na Califórnia pelo Mulford Act em resposta às patrulhas armadas dos Panteras Negras originais; agora, seus sucessores ideológicos Black Riders organizam patrulhas "Watch-A-Pig" no sul de LA, Oakland e outras localidades para se defender do que eles veem como "terrorismo policial". Como não podem carregar armas legalmente, eles usam câmeras de vídeo e "armas legais" para confrontar policiais prendendo suspeitos negros. Mas o que os difere de outras abordagens de vigilância à polícia é que seu objetivo é a revolução total.

Conversamos com o General T.A.C.O. ("Taking All Capitalists Out") sobre Baltimore, o cessar-fogo entre gangues e a história da América do Norte Negra. Seus comentários oferecem uma narrativa alternativa das relações de raça contemporâneas, o que ajuda a entender por que alguns afro-americanos veem a onda atual de atenção à brutalidade policial como o início de um movimento de Poder Negro renovado. Leia abaixo o que ele tinha a dizer:

VICE: No ano passado, com vários incidentes envolvendo a morte de suspeitos negros nas mãos da polícia, vocês viram um crescimento no interesse pela mensagem do Black Riders?
General T.A.C.O.: Sim, estivemos crescendo rapidamente no último ano e meio. Também somos extremamente fortes no complexo penitenciário industrial: temos um braço nacional nas prisões. Quando os porcos revelam sua mão, eles mostram ao público as coisas que vêm acontecendo na comunidade negra desde que fomos arrastados em navios negreiros da África. Eles usaram as mesmas medidas repressivas e violentas para nos colonizar até a posição em que estamos agora. A polícia vem dos patrulheiros que caçavam escravos fugidos de volta para as plantações.

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Nesse caso, você acha que algum tipo de esforço de reforma policial vai facilitar a vida da comunidade negra? Ou acha que seria necessário uma mudança mais sistemática?
Vemos toda a questão do terrorismo policial como ligada à supremacia branca, ao capitalismo e ao imperialismo norte-americano no planeta. Vemos nossa luta e nossa liberdade ligadas a uma luta internacional contra a classe capitalista mundial, que vem oprimindo as pessoas no mundo todo desde o começo de sua existência. Quando falamos sobre terrorismo policial, isso é uma conjunção de relações de propriedade com meios de produção e distribuição de riqueza. Lidamos com subjugação econômica, social e política, além de repressão. A polícia age para proteger a propriedade da classe capitalista. Enquanto esses tipos de relações de propriedade existirem, vamos ter um problema com esse governo; vamos ter problemas com o capitalismo, com a supremacia branca e com o imperialismo norte-americano. Vemos a necessidade de educar nosso povo para autodefesa armada e serviço comunitário; depois disso, queremos uma comunidade na qual estejamos no controle da polícia e possamos desarmar os porcos. Mas isso apenas não funcionaria: precisamos de uma revolução total para lidar com o terrorismo policial, porque, enquanto o Estado estiver no bolso da classe dominante, sempre teremos conflito racial e de classe.

Desde o anúncio das acusações criminais levantadas contra os policiais que prenderam Freddie Gray, a tensão em Baltimore parece ter relaxado. Qual o próximo passo para os organizadores negros que buscam evitar futuros abusos policiais?
O que podemos aprender com a situação de Freddie Gray é que resistir é necessário. Não podemos mais continuar sentados assistindo aos porcos aterrorizarem nossas comunidades. Você tem de entender que mesmo isso foi uma concessão dada às massas: isso foi pensado para apaziguá-las, para nublar a raiva revolucionária justa vinda da opressão do governo racista norte-americano. É como eles fizeram com as migalhas de reforma nos anos 60 como ação afirmativa: eles criaram uma classe negra neocolonial para fornecer uma guarda-tampão para a classe dominante. Eles precisam desses criados negros para nos convencer de que o sistema capitalista e supremacista branco funciona. Já foi provado várias vezes na história que, quando a polícia é acusada de um crime, por causa da dinâmica racial do banco dos jurados, que é geralmente formado por brancos, não temos ninguém ali para representar nosso povo. Nossos iguais são aqueles ao nosso redor na nossa localização geográfica, que falam como nós e se parecem conosco. Quando o banco de jurados é composto por pessoas alienígenas à nossa cultura, nossa linguagem, nossa maneira de viver, eles vão ver isso através de um ponto de vista branco, racista e capitalista, deixando os porcos escaparem.

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Quem são os membros de classe negra neocolonial no seu ponto de vista?
Obama! Ele é a principal marionete neocolonial. Gostamos de dizer assim: veja os pilotos de corrida como Mario Andretti, um dos pilotos mais rápidos do mundo. Se você colocar o homem dentro de um Pinto, um Pinto velho que só faz 80 km/h, você vai entender que não importam o talento dele, suas intenções: ele não pode ir mais rápido do que o Pinto foi criado para andar! O governo racista norte-americano e seu sistema não foram criados para o nosso povo; eles foram criados para escravizar, massacrar e expulsar nosso povo para fora desse país. Vemos Obama como a mesma coisa. Ele é um negro da casa grande.

Você acha que as acusações contra esses policiais teriam sido levadas adiante mesmo sem os protestos e tumultos em Baltimore?
Nós não chamamos isso de tumultos. As coisas que os supremacistas brancos fizeram para ganhar o controle desse país, como o Boston Tea Party, é que foram tumultos! Isso foi uma rebelião, uma resposta justa ao terrorismo brutal. Não foi protestar que fez isso – foi a rebelião que forçou a mão do inimigo a aplacar nosso povo e tentar nos acalmar para fazer os negócios como sempre faz. Então, não, as acusações nunca teriam sido levantadas contra esses porcos estúpidos se a rebelião não tivesse acontecido. Agora, temos de continuar nos rebelando como povo por justiça e liberdade.

Logo, você acredita que as acusações vão levar a alguma coisa?
Acho que as pessoas devem pressionar e manter a resistência por quaisquer meios necessários. Não podemos depender dos porcos para investigar os porcos. Temos de entender que o sistema de justiça criminal é um "sistema de justiça criminal" criminoso, que não foi criado para o nosso povo, mas para proteger a propriedade da classe racista e capitalista dominante. Não podemos depender dos mesmos mecanismos criados pelo nosso inimigo para buscar justiça ou nossa liberdade.

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Um memorando do Departamento de Polícia de Baltimore alega que membros do Crips, Bloods e Black Guerilla Family se aliaram para "abater" policiais. Você acha que a polícia descaracterizou uma trégua como algo violento?
Essa foi uma manobra mentirosa para criar confusão dentro da nossa comunidade. Eles viram que não só Bloods e Crips estavam se organizando, mas que outras gangues, como os Vice Lords e os P. Stones, estavam se unindo e indo atrás do inimigo real depois da situação com Freddie Gray. Mas isso está diretamente ligado à história – temos de entender que, mesmo durante o período da escravidão, eles não gostavam de ver duas, três, cinco pessoas negras congregando, porque sentiam que eles estavam conspirando para derrubar os escravocratas. É o mesmo hoje. Eles não querem nos ver trabalhando e nos organizando para levantar nossa comunidade, porque nos opomos à dominância deles.

Nos anos 80, o governo usou táticas para trazer o crack e armas militares à comunidade negra. Eles decidiram neutralizar o movimento de libertação negro nos EUA e a luta pela liberdade dos sandinistas na Nicarágua, matando dois coelhos com uma cajadada. Eles criaram os Contras, um grupo de contrarrevolucionários que incentivava a produção de cocaína, para derrubar os sandinistas, enquanto usavam nosso povo, Bloods, Crips e "Freeway" Rick Ross, para trazer o crack e as armas militares para derrubar o movimento de libertação negro. Eles criaram a ascensão da chamada "epidemia de gangues", da "epidemia do crack", da "epidemia das armas e da violência" – eles criaram esses problemas contrabandeando essas coisas para nossas comunidades.

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Toda a ideia do Crips veio do Partido dos Panteras Negras. Crips quer dizer "Class Revolution in Progress"; mais tarde, os Bloods criaram o "Black Liberation of Our Descent". Tanto os Bloods como os Crips vieram do movimento de liberação; então, o governo usou nosso impulso revolucionário justo e nossa necessidade de liberdade e justiça, voltando isso contra nós e criando a mentalidade de subcultura pop do "thug". Mas eles são os grandes bandidos, os grandes terroristas, o governo racista norte-americano.

Bloods e Crips estão tendo negociações de paz em todo o país agora, não apenas em Baltimore. Não apenas os Bloods e Crips estão se unindo, mas cristão e muçulmanos também. Todos os negros que estão sendo oprimidos e brutalizados por um governo racista estão em negociações de paz; e, quando esse público começar a conversar, isso não será o fim. Ainda é preciso muito tempo para começarmos a jornada, e os Black Riders pretendem liderá-los na revolução.

O que você acha do movimento Black Lives Matter?
O processo de despertar, da revolução, está em desenvolvimento. A fase inicial começa quando as pessoas falam, discutem e gritam com os porcos; mas, quando os porcos mostrarem suas verdadeiras intenções e como são moralmente falidos, o movimento Black Lives Matter vai conhecer a verdadeira natureza do inimigo e vai acabar vendo a necessidade de autodefesa e revolução.

Você vê a revolução como inevitável desde que as comunidades negras continuem resistindo, ou acha que algo poderia impedir isso?
A única coisa que pode impedir nosso povo de alcançar a verdadeira liberdade, justiça e igualdade é a desunião entre nós. Nosso objetivo é educar e liberar não só os negros, mas ser a vanguarda de uma revolução global para acabar com qualquer forma de racismo ou imperialismo no planeta. Não podemos ser livres enquanto um escravo continuar oprimido.

O que pessoas brancas simpáticas ao seu movimento, pessoas de outras raças, podem fazer para ajudar a comunidade negra a se defender da brutalidade policial?
A principal coisa que brancos podem fazer é se livrar dos porcos e da supremacia branca. É importante que os negros possam definir a si mesmos e à sua luta, que pessoas de fora não venham cooptar ou lavar nossa raiva revolucionária justa. A principal maneira é se livrando dos porcos, é ir contra os porcos. Você tem de estudar a história de John Brown, porque, se você não é um John Brown, você pode dar o fora daqui.

Bill Kilby é um jornalista freelance que vive em Los Angeles.

Tradução: Marina Schnoor