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Estaria a República Srpska a Ponto de se Tornar a Próxima Crimeia?

Clamando insistentemente por independência, o presidente da República Srpska, Milorad Dodik, passou a ser considerado uma figura perigosa. E já disse que “a Bósnia é um país podre que não merecia existir”.

Manifestantes entram em conflito com a polícia em Sarajevo em fevereiro. (Foto por Fedja Kravavac.)

Além de trazer à luz uma estranha tensão geopolítica, Putin, ao enviar suas tropas para dar uma voltinha na Crimeia, causou um efeito mais específico na política europeia. Tão logo as botas russas pisaram em solo ucraniano, os olhinhos de cada líder separatista da Europa supostamente brilharam de tanta emoção; e quando a esmagadora maioria dos crimeios votou a favor da separação, sem qualquer real intervenção do Ocidente (apesar de muitas queixas de que este não seria um referendo legítimo), imagino que a alegria era tão grande que foi difícil suportar.

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É claro, separatistas venezianos já se incluíam no caso enquanto a Crimeia votava por sua própria independência. Agora, parece que a República Sérvia da Bósnia (ou “República Srpska”) – uma das duas entidades políticas da Bósnia-Herzegóvina – pode ser a próxima na fila a aspirar pela independência, com a conversa sobre a secessão se intensificando dentro do contexto da recente “Primavera Bósnia” – uma série de protestos contra o governo na Bósnia-Herzegóvina.

A Bósnia-Herzegóvina declarou sua independência da Iugoslávia em 1992, para ser rapidamente consumida em um medonho conflito entre sérvios e croatas étnicos e os bosniaks (muçulmanos bósnios). A Guerra da Bósnia reivindicou em torno de 150 mil vidas, com oito mil bosniaks mortos em Srebrenica somente pelas forças sérvias – um evento que ofuscou as relações entre os dois grupos desde então.

O Acordo de Dayton, negociado em Ohio, em 1995, forçou os dois lados a estabelecer um acordo pela formação de um único país. Com isso, foi formada a Bósnia-Herzegóvina, composta pela República Srpska (RS), cuja população é composta principalmente de sérvios étnicos, e pela Federação da Bósnia-Herzegóvina.

Como era de se esperar, o acordo não convenceu ambos os lados a abandonar suas diferenças; e a não ser em Sarajevo – a capital –, não há realmente qualquer tipo de integração entre os grupos étnicos. Os dois estados têm constituições independentes, leis, parlamentos, fronteiras, forças policiais, sistemas postais e até mesmo políticas externas, embora ainda mantenham um governo federal. Se você acha que o impasse entre republicanos e democratas torna difícil qualquer coisa para o governo dos Estados Unidos, imagine o nível de dificuldade na Bósnia-Herzegóvina. Por exemplo, foram necessários 16 meses para formar um governo novo depois da eleição mais recente porque nenhum dos lados estava preparado para resolver nada.

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Milorad Dodik. (Foto via.)

O sistema político bósnio é completamente descentralizado – dividido em duas entidades independentes e dez distritos com seus próprios governos e ministros. Sem surpresa, esse sistema é terreno fértil para a corrupção. Ano passado, por exemplo, o presidente bósnio foi preso por perdoar crimes e assassinatos em troca de dinheiro. E o estado da economia não é muito melhor do que o sistema político do país: uma taxa de desemprego de mais de 40% (sendo 57% de jovens desempregados), corrupção e fraudes na privatização estão mutilando o frágil país.

A indignação com relação à situação política e financeira do país levou a uma série de protestos – a primeira aconteceu em fevereiro – que tem sido apelidada de “Primavera Bósnia”. A situação não é muito distante da Primavera Árabe de 2011, quando os protestos iniciais eclodiram – em termos muito simplistas – pela insatisfação com o sistema econômico do país, que deu lugar a manifestações contra uma série de outras injustiças sociais e transgressões governamentais.

Vozes revolucionárias – das quais a mais significativa é a de Milorad Dodik, presidente da República Srpska – começaram a ecoar agora de cada vez mais figuras da região. Dodik é um dos mais sinceros adeptos da agenda separatista, declarando no passado que “a Bósnia é um país podre que não merecia existir”. Clamando insistentemente por independência, ele passou a ser considerado uma figura perigosa por tantas pessoas que três dos partidos de oposição da República Srpska se uniram para desafiá-lo na semana passada. No entanto, Dodik é um político hábil e sabe como manter um alto índice de aprovação.

Com tudo isso, a Crimeia estabelece o perfeito precedente para os planos de independência de Dodik. Uma reunião com o embaixador russo da Bósnia na terça-feira parecia reforçar suas próprias esperanças de secessão, depois que ele se referiu ao referendo da Crimeia como “legítimo e democrático”.

Na semana passada, o radical nacionalista Aleksandar Vucic venceu a eleição parlamentar na Sérvia. Esta semana, ele se reuniu com Dodik a fim de prometer maior apoio político e econômico para a República Srpska – talvez como incentivo para o presidente da RS, com o intuito de buscar anexação à Sérvia, em vez de independência.

A questão agora é se Vucic e Dodik são tão decididos com relação à restauração da “Grande Sérvia” como Putin parece ser em relação à restauração da União Soviética.