FYI.

This story is over 5 years old.

viagem

Conhecendo as Prostitutas das Paradas de Caminhão na Capital do HIV de Uganda

Lyantonde é uma cidade infame e a principal parada entre Uganda e Ruanda para os motoristas que percorrem grandes distâncias. O sexo aqui é algo disponível o tempo todo, contanto que você esteja preparado para pagar por ele.

Agnes Nabukenya trabalha como prostituta desde os 17 anos. Ela ganha quatro vezes mais se não usar camisinha. Todas as fotos por Mariah Quesada.

Eu me segurava enquanto as rodas da minivan Toyota abriam caminho por uma série de vilarejos enlameados. Estávamos dirigindo por um longo trecho de estradas de terra até o Distrito Lyantonde – o epicentro do HIV/AIDS de Uganda – para conhecer as “famílias com AIDS” da área, uma comunidade separada da sociedade com pouco acesso à comida e água.

Publicidade

Em 1982, o primeiro caso de AIDS registrado no país foi documentado no Distrito Rakai, que faz fronteira com Lyantonde. A região no sudoeste de Uganda agora tem a maior taxa de HIV do país – 12% entre os adultos de 15 a 49 anos; no resto do país, a taxa fica em torno de 7,2%.

Se você já tivesse passado por Lyantonde, talvez nem teria percebido. É um distrito pequeno e subdesenvolvido que consiste em algumas estradas empoeiradas, alguns pequenos comércios, barraquinhas de comida de rua, mototáxis e um albergue. Um lugar onde você, provavelmente, não pararia. A menos que você seja caminhoneiro.

Lyantonde é uma cidade infame e a principal parada entre Uganda e Ruanda para os motoristas que percorrem grandes distâncias. O sexo aqui é algo disponível o tempo todo, contanto que você esteja preparado para pagar por ele.

Lyantonde.

Quando o sol se põe e a eletricidade é cortada, garotas em busca de dinheiro lotam a principal rua de Lyantonde. A prostituição é ilegal em Uganda, então, algumas delas trabalham “disfarçadas” em pequenos bares, esperando por clientes com quem elas possam dar uma “escapada”, enquanto outras vão direto à fonte, onde os caminhões estacionam na entrada da cidade.

Conheci Agnes Nabukenya e Susan Naikaba por meio de conexões com o Child Aid Uganda (CHAU), uma ONG local que busca ajudar crianças e famílias afetadas pelo HIV/AIDS. As garotas eram tímidas e pareciam ter se ensopado de perfume.

Publicidade

Lauben e sua equipe no CHAU.

“Vim para Lyantonde porque meu pai morreu”, explica Susan. “Eu não conseguia emprego porque nunca estudei, então decidi me vender por dinheiro. Agora tenho um filho de três anos que também tenho que sustentar.”

Perguntei à garota de 23 anos qual era seu maior medo. Ela ficou em silêncio por um momento, antes de me dizer que tinha medo de contrair HIV/AIDS. Ela disse que sempre usa camisinha, mesmo que isso signifique trabalhar o dobro. Logo percebi que ela é uma exceção na área.

“Às vezes uso camisinha, outra vezes não”, disse Agnes, uma veterana de 23 anos, que vem trabalhando nas ruas há sete. “Consigo uns 10 mil [xelins de Uganda, aproximadamente 7,90 reais] por sexo com camisinha e 50 mil [39 reais] por sexo sem camisinha.”

Pergunto o que acontece quando as prostitutas descobrem que têm HIV.

“Minhas colegas que descobriram que estão infectadas pararam de usar camisinha de vez e não contam aos clientes que têm a doença.”

“Então elas continuam trabalhando?”, perguntei.

Agnes concordou lentamente com a cabeça.

Hoje, estima-se que existam 9.500 OCVs (órfãos e crianças vulneráveis) no distrito de 80 mil pessoas. “Lyantonde é uma das regiões mais suscetíveis de Uganda, e não tivemos a oportunidade de desenvolver e adotar uma abordagem combinada de combate [ao HIV/AIDS]”, disse Lauben Tushemereirwe, diretor-executivo e um dos fundadores da CHAU.

Desde que foi fundada em 2004, a CHAU ajudou mais de 600 crianças fornecendo livros escolares, taxas de matrícula e moradia, e até deu animais às famílias, para que elas pudessem usá-los para negociar mercadorias. A tentativa deles de promover educação e envolvimento na comunidade é louvável, mas enquanto eu estava lá, cercado por um grupo de crianças doentes e órfãos, não consegui deixar de pensar que eles têm um caminho muito longo pela frente.

Publicidade

Susan Naikaba trabalha como prostituta para sustentar seu filho de três anos.

Durante o tempo em que fiquei na CHAU, Lauben e sua equipe nos levaram por campos de banana e trilhas de terra para conhecer os “verdadeiros aldeões”. Ele queria nos mostrar o contraste gritante entre aqueles apoiados pela CHAU e os que não eram.

Em algumas paradas, encontrávamos crianças sorridentes e bem alimentadas, todas usando camisas limpas e ansiosas para mostrar suas notas e conhecimentos de inglês. Outras vezes, éramos apresentados a famílias desnutridas, crianças sem pais ou mães e pais solteiros que não pronunciavam uma palavra sequer.

As histórias de famílias destruídas pelo HIV/AIDS são infinitas. Infidelidade não é tabu, mas em Lyantonde os homens dormem com prostitutas que servem caminhoneiros sem usar camisinha, que resulta num ciclo vicioso de pais solteiros, órfãos e muita pressão sob a comunidade local.

Enquanto as pessoas no Ocidente conseguem viver com a AIDS, em Lyantonde (e na maior parte da África) as pessoas continuam morrendo da doença. Quando conheci Rosemary Namakula, uma mãe solteira de 43 anos, ela só olhou para mim sem dizer uma palavra. Depois de um tempo, ela começou a me contar que estava morrendo de AIDS.

“O marido dela tinha várias parceiras, incluindo prostitutas”, explicou Lauben. “Ele gostava especialmente das mais novas.”

Lyantonde.

Por causa do estigma que cerca a doença, o marido de Rosemary não contou a ela que estava infectado antes de morrer. Quando ele faleceu (juntamente com três prostitutas com quem ele costumava se relacionar), ela fez o teste e descobriu que era HIV positivo.

Publicidade

“Estamos tentando ajudar ao máximo”, disse Lauben. “Agora ela está tomando a medicação, mas não tem dinheiro suficiente para cuidar dos dez filhos.”

A CHAU consegue ajudar a população local só até certo ponto. Uma vez por mês, Rosemary ainda tem que andar por seis horas na ida e seis na volta para tomar seus remédios. É uma caminhada de 12 horas sob o sol de Uganda, por estradas de terra conhecidas como locais de estupro coletivo. Quando eu a conheci, ela disse que provavelmente não sobreviveria muito mais tempo e que deixaria para trás 10 filhos sem mãe nem pai para cuidar deles.

Em meu último dia na cidade, encontrei Susan e Agnes novamente. Perguntei se elas temiam por suas vidas no trabalho. Elas disseram que sim; alguns homens eram muito forte e outros se recusavam a pagar depois do sexo. Perguntei o que elas gostariam de fazer se tivessem a chance. As duas disseram que gostariam de ter um negócio – Susan disse uma loja de roupas e Agnes uma loja de sapatos.

Por enquanto, elas vão continuar passando as noites na rua, esperando por trabalho na capital do HIV de Uganda.

Siga o Sam Mednick no Twitter.