Haja quem salve esta merda toda... e que seja o Salvador Sobral
Imagem principal: frame via Yotube RTP

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Haja quem salve esta merda toda... e que seja o Salvador Sobral

Há sempre o direito de não gostar, mas, para além disso, é como diz o outro: bardamerda!

Há uma frase num contexto do achincalhamento futebolístico que diz: "Jogaram como nunca, perderam como sempre". Serve isto para dizer que este escriba gosta muito da canção que ganhou o Festival da Canção, mas acha que não vai longe, precisamente porque foge aos cânones festivaleiros do habitual foguetório da Eurovisão. Mas tem havido surpresas e este é daqueles momentos em que um gajo deseja ardentemente estar enganado, sem que nenhum embaraço daí decorra. Há, no entanto, o direito inquestionável de apenas não gostar e pronto. Mas há também considerações que por aí andam (pela Internet, claro) que são excessivas.

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Salvador Sobral é um intérprete que entrou pela casa das pessoas adentro, sem pedir licença e pela porta grande. A redoma de vidro do mundo de cada um foi visivelmente arrombada por alguém que, habitualmente, a malta adora ignorar, ou menosprezar.

O jeito meio teatral é confundido com uma qualquer afectação duvidosa, a barba mal semeada e o rabo de cavalo dão origem a equívocos de género ou de estilos de vida, o guarda-roupa choca, talvez por não ser feito pelas habituais criancinhas de um qualquer buraco asiático e, o mais grave de tudo, se não berra à homem, é porque não sabe cantar.

Ao fim ao cabo, não é diferente daqueles tempos em que quem usava brinco era paneleiro, quem tinha cabelo comprido e vestia de modo diferente era drogado. Não mudou nadinha e basta ir a uma qualquer caixa de comentários perto de si para perceber isto mesmo.

Houve alguém, a propósito de um outro assunto que nada tem a ver com este, que desabafou sobre os nossos jovens, ou millennials para usar uma linguagem mais actual: "Que juventude tão velha!". A mesma juventude que, depois do vocalista dos punks Exploited se ter sentido mal com problemas cardíacos em palco, em Lisboa, em 2014, comentou a notícia, sem pudor e sem respeito pela gravidade da situação, com as habituais considerações retrógradas, com base, apenas e só, nas fotos do seu cabelo.

"Com a verticalidade habitual desta gente e com a memória bastante selectiva, se não ganharmos aquela porra lá em Kiev, é porque a música e o interprete é que são maus".

Mas é claro que, como se trata do Festival da Canção, a faixa etária do público é muito mais vasta, e atinge os conservadores do costume, com aquela ignorância atrevida quando perguntam: "É com isto que queremos representar Portugal?". A malta bem sabe que antigamente é que era bom, um gajo de crista na rua era mandado parar pela polícia porque sim, ou a malta da música de intervenção dos anos 70 era toda feia, porca e má e comia criancinhas ao pequeno-almoço. São, muitos deles, os saudosistas do costume, que, também por votação, ajudaram a eleger Salazar como o "maior português de sempre".

Os nórdicos já para lá mandaram bandas de heavy-metal (e ganharam!) e a Áustria já ganhou um Festival com a Conchita Wurst, uma personagem criada pela drag-queen Thomas Neuwith e que cantou em inglês (também havia de ser bonito se cá ganhasse uma canção que não fosse cantada em português). Com a verticalidade habitual desta gente e com a memória bastante selectiva, se não ganharmos aquela porra lá em Kiev, é porque a música e o interprete é que são maus e nunca porque já não ganhamos um caralho há muito tempo, independentemente da fauna ou flora que para lá mandamos.

Há sempre o direito de não gostar, mas, para além disso, é como diz o outro: bardamerda!