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cinema

O autocarro do amor chegou a Guimarães

Milhares de quilómetros a fazer filmes.

O que é que 13 pessoas de ambos os sexos e de diferentes nacionalidades fazem dentro de um autocarro durante um mês, a percorrer diversas cidades europeias? a) uma excursão de um grupo de escuteiros a um encontro ecuménico internacional;
b) uma orgia sexual digna de um Marquês de Sade, de um Baco ou do próprio Dionísio;
c) um reality show produzido pela Endemol, no qual todos os participantes escondem um segredo relacionado com um pecado capital;
d) todas as anteriores. Não, infelizmente, nenhuma das hipóteses anteriores é a correcta. O grupo de 13 jovens de ambos os sexos e de diferentes nacionalidades em trânsito pela Europa, que chegou há dias a Guimarães, anda a fazer filmes. E, esqueçam, não são pornográficos… O projecto Borderline acontece há vários anos, em diversos países europeus, e chega agora a Portugal pela mão do FEST – Associação Cultural e do apoio local da área de programação de cinema e audiovisual da Guimarães 2012. Entre outros itinerários, o Borderline já percorreu a Rússia com destino até Vladivostok, a Europa até Istambul e um circuito pelo Mar Báltico. Mas, a ideia não é propriamente original. A coisa terá começado com os bolcheviques, nos tempos gloriosos do camarada Ioseb Stalin, quando o cinema andava a servir a ditadura do proletariado na Rússia Vermelha dos anos 30. Alexander Medvedkin foi mentor do Kinopoezd (o meu russo está um pouco arranhado, mas o Google Translator diz que significa qualquer coisa como “O Comboio dos Filmes”): várias equipas de filmagem percorriam as gloriosas linhas férreas da Rússia, para fazer e mostrar filmes sobre e valerosos camaradas camponeses e operários russos. Os camaradas cubanos também aplicaram o conceito nos anos 60 com o dine-móbil, para espalhar os célebres discursos do comandante Fidel Castro. Ainda em Moçambique, depois da independência, os cineastas responderam ao apelo de Samora Machel para usar o cinema como um “instrumento actuante na eliminação total de todos os resíduos do colonialismo e de educar, mobilizar e organizar o povo”, através do projecto Kuxa Kanema. A viagem deste Borderline começou em Paris, no dia 7 de Novembro, e, desde então, passaram por Genebra, Marselha, São Sebastião, Madrid, Granada, Sevilha, Covilhã, Porto… para acabar em Guimarães. O CAE São Mamede serviu de salão de festas, para apresentar algum do trabalho desenvolvido durante a aventura. Espera-se que esta viagem permita a conclusão de cinco curtas-metragens sobre a temática da imigração na Europa. Recentemente, os brasileiros inventaram o conceito do filme de bordas, para classificar filmes feitos por realizadores não-profissionais, sem recursos financeiros ou técnicos significativos, mas que seguem fielmente uma máxima popularizada por Glauber Rocha: uma câmara na mão e uma ideia na cabeça. Neste espírito, o país-irmão, muito amado pelo nosso bastonário da Ordem dos Advogados, já deu ao cinema obras de referência como quatro capítulo das saga Rambú - O Rambo da AmazóniaOnde Está Meu Rim?, Roquí Son Contra o Extermínio Ambiental, Como Irritar Dandies do Hardcore, A Noite do Chupacabras ou o clássico incontornável A Maudição da Casa de Vanirim (sim, a palavra Maldição aqui escreve-se mesmo com a letra u). Eu juro que estes filmes existem mesmo! Infelizmente, no São Mamede são outros filmes de bordas… A borda é outra. No domingo, à noite encontrei na tasca do Júlio três dos jovens que entraram na aventura: André Marques (realizador português), Adelina Bichis (montadora romena) e Amadeu Pena da Silva (realizador português) trabalham em conjunto num dos filmes, falaram-me com entusiasmo da experiência a bordo do autocarro Borderline. Não é fácil convencer-me a ver o que estes figurões andaram a fazer durante o último mês nos intervalos das borracheiras e das orgias que eles negam a pés juntos, mas que todos nós, pessoas vividas e nostálgicos do Barco do Amor, sabemos que aconteceram, de certezinha, a bordo daquele autocarro do amor.