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Mesmo com o Estatuto do Desarmamento, a Violência Armada Mata Cinco Pessoas por Hora no Brasil

Aproximadamente 60% das vítimas são jovens entre 15 e 29 anos. Negros têm 142% mais chance de serem baleados e mortos do que brancos.
Foto por Todor Todorov/Wikimedia Commons.

Armas de fogo são responsáveis por 116 mortes por dia no Brasil, de acordo com um novo estudo – uma taxa de aproximadamente cinco pessoas por hora. O Mapa da Violência 2015, que a UNESCO publicou na semana passada, calculou que a violência armada acabou com 42.416 vidas apenas em 2012, o ano mais recente com data abrangente.

A taxa nacional de 21,9 fatalidades relacionadas a armas por 100 mil habitantes – das quais aproximadamente 95% são homicídios, apesar de o balanço também incluir suicídios, acidentes e casos não explicados – é a segunda mais alta já registrada nos 35 anos de história do estudo.

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Aproximadamente 60% das vítimas são jovens entre 15 e 29 anos. Negros têm 142% mais chance de serem baleados e mortos do que brancos.

O Estado de Alagoas – cuja capital, Maceió, é também a capital do assassinato do Brasil – lidera o ranking, com 55 mortes relacionadas a armas de fogo por 100 habitantes.

As regiões Norte e Nordeste viram um aumento significativo nas mortes, mas os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro contrariam a tendência, mostrando uma queda de mais de 50% nessa estatística relacionada a armas de fogo.

Apesar do grande número de mortos, o estudo afirma que o início em 2003 do polêmico Estatuto do Desarmamento, que restringe o porte de armas a maiores de 25 anos e introduziu revistas de segurança, além de um registro nacional de armas, salvou 160 mil vidas entre 2004 e 2012.

Alguns brasileiros acreditam que o estatuto pode ter aumentado a probabilidade de violência armada. Um comerciante de armas de São Paulo, que falou com a VICE sob a condição de permanecer anônimo, disse que o estatuto torna o porte legal virtualmente impossível para o brasileiro comum.

"O estatuto não melhorou nada, e agora os crimes e mortes estão subindo", ele frisou. "As autoridades [se] focam em regular o porte legal até uma extensão absurda. Pode levar até um ano para conseguir uma licença aqui." Ele argumenta que os obstáculos para a obtenção do porte levam à compra de armas ilegais.

Os civis teriam mais de 18 milhões de armas, mais da metade delas de origem ilícita.

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Um movimento para relaxar as restrições ao porte está em andamento: uma comissão especial no Congresso Nacional tem o estatuto na mira, visando a facilitar o acesso e diminuir os limites dos locais onde armas podem ser carregadas. Atualmente, armas legais estão confinadas a uma residência ou a espaço comercial registrado.

"Há uma montanha de burocracia e muitos custos envolvidos hoje", afirmou recentemente ao portal R7 o deputado federal Marcos Montes (PSD), presidente da comissão. "Os pobres na nossa sociedade não podem comprar armas, porque elas são caras. O estatuto precisa ser ajustado."

Montes, que recebeu doações de empresas de armas e da Associação Nacional de Armas e Munição, é um dos que comungam com a escola de pensamento "mais armas, menos crime".

Mas José Vicente da Silva Filho, ex-coronel da Polícia Militar e ex-secretário nacional de segurança pública, contesta as alegações do deputado e acha que as leis existentes precisam ser complementadas por outras reformas.

"O estatuto, que foi um passo preliminar, teve um efeito limitado, mas dar mais acesso a armas não é a resposta", ele falou à VICE. "Acredita-se que 15% dos brasileiros tenham armas, comparado a 90% dos norte-americanos, mas a diferença é que, no Brasil, todo ponto percentual adicional de porte impulsiona os homicídios em dois por cento."

Silva argumenta que o problema das armas no país não é centrado na quantidade de armas, mas na impunidade pelo uso.

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"Na média, os brasileiros matam seis vezes mais que os norte-americanos", ele alegou.

O Mapa da Violência conclui que a sociedade brasileira no geral condena o uso de violência para resolver disputas pessoais, como acidentes de trânsito e brigas. Isso também culpa investigações policiais inadequadas e a lentidão da justiça, promovendo uma atmosfera de violência.

Silva apoia reformas no código criminal para assegurar mais condenações e sentenças mais longas nesses casos. Ele teme que as mudanças propostas ao estatuto, que visam a permitir um maior acesso a armas, produzam um aumento significativo nos crimes violentos no país.

Defensores da segurança pública pedem uma maior vigilância da parte das forças policiais, com foco particular na garantia de que armas aprendidas pelas autoridades não voltem a circular.

Em um ambiente em que a taxa de violência gera o impulso de se armar em parte do público, a situação só pode melhorar quando os brasileiros começarem a se sentir mais seguros — e quando as causas dessa violência sejam melhor compreendidas pela população. Até lá, armas de fogo serão defendidas popularmente por seus arautos como o único meio de defesa num dos países mais violentos do planeta.

Siga o Ben Tavener no Twitter: @BenTavener

Foto via Wikimedia Commons.