Eu conheci o Continental Pérsio Dirt Park há aproximadamente 10 anos por meio do meu padrasto, o Plínio, um cara fortão de 40 e poucos anos que faz a bike dele parecer um velotrol da Estrela por causa de seu tamanho. Ele me introduziu no mundo dos esportes radicais enquanto eu transitava por aquela fase de criança para pré-adolescente emburrada. Nessa época, você não tem muita opção do que fazer nos finais de semana, e acabou que eu sempre ia com ele para as pistas. E veja só, eu curtia. O tempo passava e eu assistia a vários vídeos de BMX, era viciada em jogar Matt Hoffman e Dave Mirra no PlayStation 1, conhecia as manobras e pilotos e já tinha minha paixonite pelo Cory Nastazio.Eu tinha 14 anos quando fui ao Continental Pérsio Dirt Park pela primeira vez. O Parque Continental, na zona oeste de São Paulo, é um bairro residencial bem tranquilo, daqueles com belíssimas casas térreas e pracinhas em cada esquina. A pista de BMX surgiu como uma brincadeira de um jovem morador da área, o Pérsio, que, com a ajuda de alguns amigos, foi construindo os morrinhos na Praça Ralph Rosemberg. Hoje, a pista leva seu nome; uma homenagem que os pilotos fizeram após a sua morte devido a um acidente de moto. Dezoito anos mais tarde, o local se tornou um dos melhores trails do Brasil, com reconhecimento internacional, e foi lá que comecei a fazer minhas primeiras fotos de esporte.Plínio.Há pouco menos de um mês, eu voltava para casa com aquela tradicional ressaca de domingo, quando a Rafaela, minha irmã de 9 anos, me ligou. “Aline, estou indo com meu pai para o Continental. Hoje é o ultimo dia da pista.” Peguei minha câmera e corri para lá. Mesmo sem entender nada, queria pelo menos poder fazer minhas últimas fotos naquele local.Naquela semana, os pilotos locais receberam a notícia de que a pista seria destruída. Tratava-se de uma ação da SARPAC (Associação de Amigos do Residencial Parque Continental) de revitalização da Praça Ralph Rosemberg, com reserva de verba para a obra proposta pelo verador José Police Neto (PSD), segundo consta na emenda 4524/2013 – Projeto de Lei PL695/2013 no orçamento do município.Procurado por alguns pilotos, o vereador explicou que essa ação da SARPAC visava reverter uma tentativa de privatização da área pública. Explico: essa não é a primeira vez que o Continental Trails sofre uma ameaça desse tipo. Em 2010, os locais foram procurados por autoridades públicas e jogadores do campo de futebol (a Praça Ralph Rosemberg comporta a pista e o campo) aconselhando a criação de um CDC (Clube da Comunidade), que nada mais é do que uma área esportiva em um terreno público, porém, administrada por entidades. Caso contrário, a pista e o campo seriam destruídos. Assim, surgiu o CDC Eucaliptos, uma parceria entre os pilotos de BMX e os jogadores de futebol. “Eu achei que o CDC poderia ser uma solução para alguns de nossos problemas. Sempre que fazíamos alguma competição, não conseguíamos o apoio da prefeitura para disponibilizar ambulância, por exemplo. E com o CDC isso seria possível”, diz Blue Hebert, um dos responsáveis pela manutenção da pista. A parceria foi desfeita pouco tempo depois devido à incompatibilidade de opiniões entre os membros, já que o clube de futebol tinha a intenção de privatizar a área e o clube do BMX sempre se mostrou contra isso.Blue.Nessa época, a SARPAC criou um abaixo-assinado propondo a revitalização da Praça Ralph Rosemberg. “Este local sempre foi destinado a uma área de lazer para a comunidade. Hoje, a maior parte dos moradores do bairro é de terceira idade e eles precisam de um lugar pra se reunir”, me contou a presidenta da SARPAC, Marlene Guardabassi. Porém, não havia nenhuma citação à retirada da pista de BMX nesse abaixo-assinado, falava-se apenas sobre o campo de futebol.“A SARPAC agiu de má-fé. Oitenta por cento dos moradores já se mostraram a favor da permanência da pista”, completa Blue Hebert. A Ana Cláudia Sommavilla mora em frente ao local e também deu sua assinatura. “Era um texto completamente técnico e eles chegaram perguntando se era a favor da retirada do campo. Eu apoio o pessoal da pista desde que me mudei para cá há 11 anos. Temos uma relação muito boa. O campo realmente era um problema, porque já saíram algumas brigas e as pessoas deixavam muito lixo por aqui. A pista é muito bem cuidada pelos pilotos, eles retiram todo o lixo, cortam a grama e até ficam de olho na minha casa quando estou viajando”. Ela ainda me contou que até a família do Pérsio, criador da pista, ajudou a recolher assinaturas pensando se tratar somente do campo. “Eles nunca destruiriam uma lembrança do filho. É totalmente incoerente”, completa. Acontece que os moradores não foram os únicos a assinar algo sem saber 100% do que se tratava. Police Neto, o vereador que propôs a verba da reforma da praça, nem sabia que ali existia uma pista de BMX. Vale citar que ele é conhecido pelas campanhas a favor da bicicleta, o que gerou uma repercussão ainda maior nas redes sociais. Até colocaram a bike dele para vender no OLX. A repercussão também fez com que a SARPAC desse um prazo de seis meses para que a pista saísse de lá.No dia 28 de março de 2014, eu cheguei ao Continental Trails às sete da manhã para uma reunião entre os pilotos e o vereador. Ele já estava lá, com sua bike e sua roupa de ciclista. O papo durou uma hora e meia, e o que eu vi foram os pilotos tentando mostrar como é importante manter a pista ali e o vereador tentando tirar o dele da reta, falando que o assunto só se resolveria com uma conversa entre pilotos e associação. E assim, na última sexta-feira, dois representantes dos bikers se reuniram com a presidenta da SARPAC, o vereador e o subprefeito Ricardo Pradas, a fim de pedir mais seis meses, com o intuito de dialogar com a associação de moradores sobre a atual situação da pista. No entanto, eles foram surpreendidos com uma informação do subprefeito: além do processo que a SARPAC abriu na Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, havia outra solicitação aberta por outro grupo de moradores no Ministério Público pedindo a remoção da pista por se tratar de uma ocupação de área pública e é esta a ordem que a Prefeitura está executando.“Agora, estamos em uma batalha com o Ministério Público. Vencendo essa batalha, ainda temos que enfrentar a da SARPAC. A corda continua no pescoço”, diz Michel Will, um dos pilotos presentes na reunião.O Adan, além de ter sido um dos criadores da pista com o Pérsio, é o advogado da galera e está preparando uma petição de arquivamento do processo no Ministério Público. Para incentivar as assinaturas, ele e mais alguns moradores que são a favor do local, fizeram um evento, que foi realizado no último dia 5. Atualmente, o abaixo-assinado já conta com mais de 400 nomes.
Publicidade
Publicidade
Publicidade