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O mundo secreto dos minicelulares que você pode esconder na bunda

Os nanofones são especialmente populares entre frequentadores de cadeias e ganham umas resenhas ótimas na Amazon e eBay, tipo: ‘Sem problemas anais!!! Não doeu nada na minha bunda, valeu caras :)’

No começo dos anos 2000, os fabricantes de celular estavam tentando fazer os telefones o menor possível. Nos anos 2010, os smartphones favoritos são os com as maiores telas. Em 2016, a maré pode estar mudando mais uma vez: o novo modelo de celular da Apple, o iPhone SE, conta com uma tela relativamente minúscula de 4 polegadas. Mas a Apple ainda tem um longo caminho pela frente para alcançar o Zanco Fly.

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Com uma tela de 0,66 polegadas, o Fly aparentemente é o menor celular do mundo. Esse não é o único nanofone que você encontra por aí, mas os outros são feitos por empresas que você nunca ouviu falar e é muito difícil achá-lo nas lojas convencionais. Mas dá para encontrá-los entre as pilhas de carregadores de Nokia 3210 que se acumulam nas barraquinhas da galera que conserta celulares nos piratocenters, assim como na Amazon e eBay. Eles custam cerca de $40.

Algumas funções — como standby de três dias — são impressionantes. Mas se você está imaginando qual a vantagem desses celulares em relação aos últimos smartphones com touchscreen, é só tentar enfiar um Samsung Galaxy Note 4 na bunda.

Sim: você adivinhou, esses celulares são pensados para entrar nas cadeias usando o cu dos detentos como transporte.

Se você acha que estou extrapolando — afinal de contas, batons são praticamente do mesmo tamanho e ninguém escreve matérias sobre enfiá-los nas regiões baixas — é só prestar atenção em como esses celulares são anunciados. Muitos, por exemplo, afirmam ser 100% plástico, ou aparecem com a tag "beat the BOSS", o que significa que eles supostamente não são detectados por escâneres de orifícios.

Uma variedade de escâneres BOSS da Xekü, screenshot via.

Já os comentários dos clientes da Amazon nesses celulares vão do sutil ao direto. Um comprador disse que o celular é "muito pequeno e fácil/indolor de esconder", mas não tem certeza se o modelo é mesmo 100% plástico, então poderia não enganar o BOSS. Ele deu ao celular apenas uma estrela, "já que imagino que seja exatamente por isso que a maioria quer um celular desses".

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Outro usuário, Sean, foi mais honesto. Num review de cinco estrelas, considerado "útil" por 23 pessoas, ele aponta: "Sem problemas anais!!! Não doeu nada na minha bunda, valeu caras :)".

Celulares parecidos já viraram notícia em 2013, quando aparelhos no formato de um chaveiro de alarme de BMW — também feitos principalmente de plástico e num formato conveniente — surgiram. Parece que celulares em formato de chaveiro são ilegais hoje — mesmo que só por infringir os direitos autorais do logo da BMW — mas celulares nas prisões continua sendo um grande problema. Em janeiro, autoridades do Reino Unido e País de Gales informaram que tinham atingido um novo pico na apreensão de celulares: quase 10 mil aparelhos e chips SIM tinham sido confiscado em 12 meses, ultrapassando significativamente os confiscos de drogas.

"Os celulares estão em toda parte", diz o ex-detento Carl Cattermole, que escreveu o guia de sobrevivência na cadeia prisionism.com.uk, fornecendo uma visão aprofundada da vida atrás das grades. "São os funcionários que os levam para dentro, ou você pode comprar um celular de outro detento com um favor ou em troca de alguma coisa, ou ligar para alguém de fora que passe o dinheiro para um contato dele. As pessoas geralmente os usam nas celas com alguém montando guarda, mas chegou um ponto onde as pessoas usam abertamente nos vestiários, como no mundo exterior."

Carl acrescentou que a maioria dos detentos têm que passar por revista íntima ao serem admitidos numa prisão, então estar com um celular na bunda pode não ser muito prático, mas há muitas outras maneiras de conseguir objetos do gênero nas cadeias. Jogar coisas por cima de um muro é um método espetacularmente básico; pescar é outro — ano passado alguém pegou dois anos e meio por jogar drogas, uma faca e um McMuffin com uma linha de pesca para um prisioneiro por uma janela. Mas independente de como eles entram, quando os celulares estão dentro da prisão, eles precisam ficar escondidos.

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Celulares em bundas frequentemente aparecem nas notícias. Por exemplo, ano passado, um cara no início de sua pena de 16 meses por fraude, foi encontrado com um celular e carregador no toba. Em fevereiro, um assassino triplo da prisão de segurança máxima de Nova Gales do Sul entrou numa greve de fome de 12 dias, na tentativa de não expelir um celular detectado por uma unidade BOSS (o aparelho acabou saindo no dia 25 de fevereiro). Um ano antes, o cu de um cara que estava sendo admitido numa prisão de Manchester levava quatro celulares, quatro chips SIM e quatro carregadores. Aí você tem André Silva, preso em Ribeirão das Neves, Grande Belo Horizonte, cujo ânus se mostrou o retrato da caverna do Aladdin em contrabando: segundo uma reportagem, a passagem traseira de Silva continua "dois celulares, duas baterias, alicate, duas brocas, oito pedaços de uma serra, cinco pregos e três chips SIM".

Esses, claro, são apenas os celulares encontrados, e talvez seja aí que esses celulares de $40 entram: eles não só são difíceis de detectar, mas também rápidos e fáceis de esconder. Claro, é possível colocar itens bem maiores no cu, ou o fisting não seria um passatempo tão popular, mas para o propósito de armazenagem e recuperação fácil, quanto menor melhor. "Coisas como iPhones são raros na cadeia", diz Cattermole. "A maioria dos celulares precisam entrar numa bunda em algum momento, então você ia se foder com um iPhone 6 Plus, literalmente. Você ia ficar parecendo o Bob Esponja: um retângulo com braços e pernas. Mas eu conheci um anão que conseguia sentar num Blackberry."

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E sim, por um lado, deve ser muito engraçado ver um colega fazendo de tudo para não cagar seu último Samsung. Do mesmo jeito, se alguém te dissesse que você não podia falar com seus entes queridos sempre que quisesse, você provavelmente faria o mesmo. Considerando como a maioria entra em pânico quando a bateria fica abaixo de 30%, muita gente estaria indo buscar o lubrificante agora se tivesse que passar um dia sem Facebook. "Acho que isso é uma coisa que você não entende se nunca esteve preso", diz Carl. "É uma segregação emocional. Eu daria um jeito de enfiar uma cabine telefônica na bunda se isso significasse poder ficar em com contato com a minha família."

Alguns dos usos desses aparelhos podem ser inocentes. Ano passado, dois detentos da HMP Birmingham pegaram nove meses adicionais por filmar um clipe de rap dentro da cadeia, mas seria muita inocência achar que nada de escuso está acontecendo. "Claro, as pessoas também organizam crimes do lado de fora", diz Carl. "Assim como El Chapo comandava o maior cartel do mundo com seu celular na cadeia, um fulano qualquer pode usar um celular para organizar os parceiros e fazer o que quiser lá fora."

A pergunta que resta é se esses celulares de bunda realmente funcionam bem. Meu primeiro passo foi comprar um pela Amazon — o celular funciona em todas as redes menos a 3, e considerando que a principal função da 3 é roaming internacional, provavelmente isso só vai ser problema para um detento muito ambicioso.

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O próximo passo lógico seria uma odisseia do celular pela minha bunda, mas nada entrou no meu cu em quase uma década e as coisas não vão mudar agora, então fui pra loja de conveniência mais próxima.

Como você pode ver, o buraco de uma rosquinha de chocolate deixa muito espaço para manobra.

E quanto ao teste de cavidade? Bom o cara do açougue perto de casa não me ajudou muito quando pedi "a coisa mais parecida com uma bunda humana" no balcão, então escolhi um frango inteiro. Um clássico do mundo das cavidades. E ali enfiei o celular.

Boas notícias: fico feliz em relatar que deixei o celular lá dentro do dia para noite e ele ainda funcionava na manhã seguinte.

Mas esses celulares são feitos para retenção anal explícita? Ou são como papel-alumínio: feito para uma coisa, mas às vezes usado para outra?

Tentei contatar a empresa que fazia o celular, mas considerando as frases sutis — ou afirmações explícitas — feitas pelos revendedores, não foi surpresa ter dificuldades para rastrear as pessoas por trás desses celulares. Meu modelo, o Zanco Fly, aparentemente é feito pela Zini Mobiles Ltd, uma empresa estabelecida no Reino Unido em 2013, mas vendida e desfeita ano passado. A empresa estava registrada em um endereço de encaminhamento com apenas um diretor, que ainda parecia estar vendendo o celular através do site Alibaba (pedido mínimo: 3 mil unidades), onde a Zini está listada como uma empresa britânica com uma renda anual de mais de $100 milhões. Outra fonte online dizia que a Zini emprega, ou empregava, mais de 300 pessoas.

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Acabei conseguindo falar com um tal de Adam, um cara de Birmingham que começou a vender esses celulares pelo eBay, depois fez o site smallestmobilephones.co.uk. Ele trabalha com a Zini e foi logo dizendo que seu site não mencionava "nada sobre cadeias ou ânus". Mas ele realmente sabia como esses celulares estavam sendo usados?

"Não estamos dizendo nada disso para ninguém", ele me disse. "Se é isso que o comprador quer fazer, ele pode, mas nunca testamos esses celulares para saber se eles disparam esses escâneres; alguns deles são principalmente plástico, mas nunca serão 100% plástico — eles ainda precisam de placas de circuito."

Adam foi incrivelmente franco sobre alguns desses celulares: enquanto os telefones Zinis são bastante bons, outra marca que ele vendia "não é muito boa, para ser honesto", e quando se trata de bateria, ele acrescentou que alguns fabricantes "usam todo tipo de coisa neles". Por isso, ele pede cuidado ao inserir seus celulares em quaisquer partes do corpo.

"Cara", ele riu. "Se alguém me ligasse e dissesse 'Vou colocar um desses na minha bunda', eu diria para não fazer isso. Já ouvi histórias de pessoas que colocaram um desses celulares pequenos para carregar e ele explodiu." E, talvez para dar algum conforto, acrescentou: "Mas não seria uma explosão muito grande."

Eu não saberia como dar essa notícia para o Adam, mas pela minha experiência de vida — até agora — eu diria que é preferível evitar qualquer tipo de explosão, grande ou pequena, na região da sua bunda. Acho que essa é uma regra de vida bem básica para seguir. Dito isso, vou deixar meu telefone de bunda sempre ao alcance: baixei muitas músicas ilegais no passado, e nunca se sabe quando vão jogar essa merda aí no ventilador.

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Tradução: Marina Schnoor

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