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Música

Easyrider Records: rock sobre rodas numa label que percebe muito do assunto

Bastaria a vontade de ressuscitar a minha bisavó para que a dívida para com a Easyrider fosse gigante.

Foram diversos os momentos na história dos Estados Unidos da América, em que a nação obrigou os mais inadaptados a decidirem-se por uma de duas opções: ou se conformavam ou se faziam à estrada. Gerações inteiras ficaram socialmente fracturadas quando se viram encurraladas pelo Tio Sam dessa forma. Durante uma boa parte dos anos 60, o país que se manteve sobre rodas, nas estradas norte-americanas, pouco teria em comum com aquele que decidiu antes ficar em casa a ver a América ser trucidada na Guerra do Vietname. Esse “país”, que se formou à margem do poder militar, desenvolveu naturalmente uma contra-cultura que ainda hoje encontra marcas bem visíveis numa boa parte do rock tocado por tipos com barbas tão compridas como a do Pai Natal.

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Pensando bem nisso, a iniciativa de pegar numa guitarra para começar a malhar nela não difere assim tanto do gesto de quem deita as mãos a uma moto para guiá-la por estradas poeirentas. Ambas as atitudes partiram muitas vezes de uma juventude que se expressou à sua maneira, porque não se revia em nenhum dos modelos de vida propostos por um país chato. Duvidamos de que o peso político de tudo isso sobrecarregue o nome da

Easyrider Records

, mas ninguém vai buscar só por acaso o título de um dos mais decisivos objectos de toda a contra-cultura. A Easyrider Records é, tal como o filme de 1969 realizado por Dennis Hopper, uma daquelas criações que jamais existiria sem haver todo um arsenal de droga capaz de conduzir a mente até estados que não atingiria sem recurso às mesmas.

Não é de admirar portanto que a génese de vários dos discos na Easyrider esteja no fumo espesso que sai de um enorme bongo. Qualquer banda envolvida nas variantes doom, psych ou stoner do rock deve almejar o infinito e procurá-lo nos recursos que ofereçam maiores doses de inspiração. Se me apetecesse ser especialmente filosófico, escreveria a seguinte frase com uma mão no queixo e a outra no teclado: a inspiração ilimitada é o melhor caminho para chegar ao infinito.

Mas falávamos há pouco de bongos e não é necessário ir muito além desse brinquedo para apresentar uma banda como Salem’s Pot (bom nome). Provenientes da Suécia, os Salem’s Pot surpreenderam Dan (mentor da Easyrider) de tal modo, que o rapaz não descansou até editar uma banda com que tem vindo a comunicar apenas através de e-mail. Antes disso acontecer,

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Sweeden

era uma obscuridade de doom sueco reservada ao aventureiros do Bandcamp e aos donos de uma das 50 preciosas cópias em cd-r. Hoje é um disco editado com uma categoria do caralho, pela Easy Rider (label com filosofia de boutique), nas mais diversas versões luxuosas em LP. É, além disso, o disco rock dos últimos anos que me deixou com uma maior vontade de ver a minha bisavó regressar à terra para juntos fazermos um

slow headbanging

. Depois era porreiro ela ficar mais um pouco para me cozinhar um hambúrguer com batatas fritas.

Bastaria a vontade de ressuscitar a minha bisavó para que a dívida para com a Easyrider fosse gigante, mas este é um catálogo que não se esgota em dois ou três discos. Reparemos, por exemplo, em como a casa fundada em Los Angeles (Hermosa Beach) obtém por vezes os direitos de lançamento em cassete de títulos pertencentes a outras editoras. Ao abrigo dessas alianças, podemos encontrar em fita uma reedição fantástica de

Holy Mountain

,  monstro

jodorowskyano

 dos Sleep, e o álbum homónimo dos Fuzz, a banda formada pelo irrequieto Ty Segall. Bem sei que coloco o pescoço debaixo do machado com o que vou escrever, mas Ty Segall nunca foi um rocker que me enchesse as medidas.

Fuzz

 chegou em boa altura de inverter essa opinião e acredito que, a partir de agora, esta seja uma cassete para meter a tocar quando estiver com vontade de ouvir rock com a pedalada do

 garage

, um toquezinho de birra e os riffs de quem conhecem bem onde começa e termina a era dourada dos Black Sabbath.

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Bem, se há coisa que não falta na Easy Rider Records são bandas cientes de que até ao

Sabotage

 todos são escutas obrigatórias no percurso dos Sabbath. Entre esses bons alunos encontramos Sons of Huns (autores de

Banishment Ritual

, o primeiro álbum duplo da casa californiana), Valfader (nome traiçoeiro), Shooting Guns e Albino Python. Interessam-nos por agora estes dois últimos colectivos, porque consigo trazem álbuns bastante capazes de deixar mossa.

Brotherhood of the Ram

, dos Shooting Guns, logo na capa e nos títulos (“Motherfuckers never learn”) anuncia um clima hostil que lembra filmes como

Deliverance

 ou

Southern Comfort

. Coincidindo com isso, o conteúdo musical do álbum aponta directamente para um equilíbrio muito especial entre o esmagamento do stoner e a capacidade de criar canções sofisticadas, mesmo num meio tão fodido quanto este. A dádiva doom que os Albino Python nos oferecem, com

The Doomed and the Damned

, consegue ser um bocado mais azeiteira (os efeitos dão qualquer coisa de réptil à principal voz), embora isso já fosse de prever tendo a banda o nome que tem. Mas até o azeite da Easy Rider é um tempero com qualidade e as reedições de Graveyard, em cassete, aqui estão para provar que os suecos tocam música perfeita para pessoas sexy que gostam de curtir ao som de guitarras. Estou a pensar em ti, Carolina.



Foram diversos os momentos na história dos Estados Unidos da América, em que a nação obrigou os mais inadaptados a decidirem-se por uma de duas opções: ou se conformavam ou se faziam à estrada. Gerações inteiras ficaram socialmente fracturadas quando se viram encurraladas pelo Tio Sam dessa forma. Durante uma boa parte dos anos 60, o país que se manteve sobre rodas, nas estradas norte-americanas, pouco teria em comum com aquele que decidiu antes ficar em casa a ver a América ser trucidada na Guerra do Vietname. Esse “país”, que se formou à margem do poder militar, desenvolveu naturalmente uma contra-cultura que ainda hoje encontra marcas bem visíveis numa boa parte do rock tocado por tipos com barbas tão compridas como a do Pai Natal.



Pensando bem nisso, a iniciativa de pegar numa guitarra para começar a malhar nela não difere assim tanto do gesto de quem deita as mãos a uma moto para guiá-la por estradas poeirentas. Ambas as atitudes partiram muitas vezes de uma juventude que se expressou à sua maneira, porque não se revia em nenhum dos modelos de vida propostos por um país chato. Duvidamos de que o peso político de tudo isso sobrecarregue o nome da

Easyrider Records

, mas ninguém vai buscar só por acaso o título de um dos mais decisivos objectos de toda a contra-cultura. A Easyrider Records é, tal como o filme de 1969 realizado por Dennis Hopper, uma daquelas criações que jamais existiria sem haver todo um arsenal de droga capaz de conduzir a mente até estados que não atingiria sem recurso às mesmas.





Não é de admirar portanto que a génese de vários dos discos na Easyrider esteja no fumo espesso que sai de um enorme bongo. Qualquer banda envolvida nas variantes doom, psych ou stoner do rock deve almejar o infinito e procurá-lo nos recursos que ofereçam maiores doses de inspiração. Se me apetecesse ser especialmente filosófico, escreveria a seguinte frase com uma mão no queixo e a outra no teclado: a inspiração ilimitada é o melhor caminho para chegar ao infinito.





Mas falávamos há pouco de bongos e não é necessário ir muito além desse brinquedo para apresentar uma banda como Salem’s Pot (bom nome). Provenientes da Suécia, os Salem’s Pot surpreenderam Dan (mentor da Easyrider) de tal modo, que o rapaz não descansou até editar uma banda com que tem vindo a comunicar apenas através de e-mail. Antes disso acontecer, 

Sweeden 

era uma obscuridade de doom sueco reservada ao aventureiros do Bandcamp e aos donos de uma das 50 preciosas cópias em cd-r. Hoje é um disco editado com uma categoria do caralho, pela Easy Rider (label com filosofia de boutique), nas mais diversas versões luxuosas em LP. É, além disso, o disco rock dos últimos anos que me deixou com uma maior vontade de ver a minha bisavó regressar à terra para juntos fazermos um 

slow headbanging

. Depois era porreiro ela ficar mais um pouco para me cozinhar um hambúrguer com batatas fritas.





Bastaria a vontade de ressuscitar a minha bisavó para que a dívida para com a Easyrider fosse gigante, mas este é um catálogo que não se esgota em dois ou três discos. Reparemos, por exemplo, em como a casa fundada em Los Angeles (Hermosa Beach) obtém por vezes os direitos de lançamento em cassete de títulos pertencentes a outras editoras. Ao abrigo dessas alianças, podemos encontrar em fita uma reedição fantástica de 

Holy Mountain

,  monstro 

jodorowskyano

 dos Sleep, e o álbum homónimo dos Fuzz, a banda formada pelo irrequieto Ty Segall. Bem sei que coloco o pescoço debaixo do machado com o que vou escrever, mas Ty Segall nunca foi um rocker que me enchesse as medidas. 

Fuzz

 chegou em boa altura de inverter essa opinião e acredito que, a partir de agora, esta seja uma cassete para meter a tocar quando estiver com vontade de ouvir rock com a pedalada do

 garage

, um toquezinho de birra e os riffs de quem conhecem bem onde começa e termina a era dourada dos Black Sabbath.





Bem, se há coisa que não falta na Easy Rider Records são bandas cientes de que até ao 

Sabotage

 todos são escutas obrigatórias no percurso dos Sabbath. Entre esses bons alunos encontramos Sons of Huns (autores de 

Banishment Ritual

, o primeiro álbum duplo da casa californiana), Valfader (nome traiçoeiro), Shooting Guns e Albino Python. Interessam-nos por agora estes dois últimos colectivos, porque consigo trazem álbuns bastante capazes de deixar mossa. 

Brotherhood of the Ram

, dos Shooting Guns, logo na capa e nos títulos (“Motherfuckers never learn”) anuncia um clima hostil que lembra filmes como 

Deliverance

 ou 

Southern Comfort

. Coincidindo com isso, o conteúdo musical do álbum aponta directamente para um equilíbrio muito especial entre o esmagamento do stoner e a capacidade de criar canções sofisticadas, mesmo num meio tão fodido quanto este. A dádiva doom que os Albino Python nos oferecem, com 

The Doomed and the Damned

, consegue ser um bocado mais azeiteira (os efeitos dão qualquer coisa de réptil à principal voz), embora isso já fosse de prever tendo a banda o nome que tem. Mas até o azeite da Easy Rider é um tempero com qualidade e as reedições de Graveyard, em cassete, aqui estão para provar que os suecos tocam música perfeita para pessoas sexy que gostam de curtir ao som de guitarras. Estou a pensar em ti, Carolina.