Vida ou morte no Enem: pressão excessiva afeta desempenho de candidatos

FYI.

This story is over 5 years old.

Patrocinado

Vida ou morte no Enem: pressão excessiva afeta desempenho de candidatos

Atividade física, momentos de descanso durante o estudo e alimentação saudável ajudam a evitar estresse elevado em função da prova.

Na madrugada do Dia D, Tamiris Tesch acordou vomitando. Depois de um ano de cursinho, ela estava prestes a fazer a prova de seleção para entrar na universidade que desejava, mas não imaginava que fosse obrigada a passar por esse processo com febre, vômitos e diarreia constante. Um cenário extremo, mas não raro entre a rapaziada que sofre a pressão de encarar o Enem e vestibular como momentos definitivos na hora de planejar um futuro.

Publicidade

É fácil de entender o porquê. Cobranças autoimpostas e de familiares ajudam a cria em torno do sucesso ou fracasso no Enem um clima de vida ou morte. Soma-se a esse peso a obrigação de escolher uma profissão sem a perspectiva de que essa decisão não precisa ser definitiva e, pronto, é como se uma bigorna de desenho animado caísse sobre o peito de cada estudante.

Para completar esse cenário, é comum não sobrar qualquer tempo para o lazer dentro da rotina puxada de estudo. O resultado desse contexto, explica Sandra Calais, professora do Departamento de Psicologia da Unesp, é um elevado nível de estresse entre moças e rapazes prestes a fazer provas de seleção para faculdades e universidades. "Não tem acordo. É um período muito complicado e uma seleção que afunila muito os candidatos, além da problemática de escolher o que fazer da vida", diz Sandra.

Em 2003, a professora participou de um estudo que avaliou os índices de estresse entre estudantes do 1º e 3º ano do ensino médio, cursinhos pré-vestibulares e primeiro e último anos de faculdade. O resultado não deixou dúvida sobre qual era o grupo sob efeito de maior pressão emocional. Enquanto a média geral de participantes com estresse foi de 65,6%, entre os pré-vestibulandos o número foi de 83%. Em seguida vieram os alunos do 3º ano, com 70% de incidência.

No caso da Tamiris, a ansiedade e o nervosismo pareciam normais para ela durante o ano. "Meus pais estavam muito tranquilos, mas como eu já tinha feito um ano de cursinho, colocava em mim mesma a pressão de que não podia 'falhar' mais uma vez", diz. Durante os três dias de prova, porém, Tamiris passou a pão e água – nada mais parava no estômago.

Publicidade

No segundo dia, inclusive, pensou em desistir, mas insistiu e foi até o fim. Nas manhãs antes das provas, Tamiris tentou até terapia de cura com as mãos para ver se a saúde melhorava, sem muito sucesso. "Meu estado dificultou mais a prova, meu raciocínio estava lento e eu precisava sair toda hora para ir ao banheiro. No último dia acabei a prova e fui direto para o hospital, totalmente desacreditada", diz ela. "Tenho certeza de que tudo que passei foi devido à pressão e à cobrança que eu mesma me fazia."

Apesar do estresse não ser uma doença propriamente dita, os efeitos prolongados desse estado abrem as portas para que os estudantes encarem outros males, como a depressão – uma doença que tem se tornado mais comum ao redor do mundo na população como um todo. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que o número de pessoas que sofrem de depressão cresceu 18,4% entre 2005 e 2015.

Ainda que não existam pesquisas que indiquem a incidência da doença entre os jovens prestes a fazer Enem ou vestibular no Brasil, um estudo da John Hopkins University mostra que o número de episódios de depressão em adolescentes americanos subiu 37% entre 2004 e 2014. Comparado com o índice geral medido pela OMS, é quase o dobro, ou seja, os jovens em idade de entrar para o ensino superior são uma fatia da população especialmente vulnerável a esse quadro.

Para a psicóloga e pesquisadora da USP Dulce Coppedê, no entanto, mais importante do que generalizar os efeitos de algo como a depressão entre os jovens enemzeiros, é fundamental respeitar as singularidades de sofrimentos diferentes para amenizar os efeitos da pressão pela dúvida da carreira a ser escolhida, por exemplo.

"Há, sim, um sofrimento, mas o importante é um cursinho, por exemplo, oferecer um espaço de fala e escuta para que os alunos possam conversar sobre isso", afirma Dulce. "O ideal é criar um repertório de linguagem que possibilite construir uma narrativa para ir além da discussão dos sintomas e entender o que acontece de fato por trás daquilo", explica.

Pode ser difícil solucionar esse impasse e mudar esse panorama, mas a professora Sandra diz que quatro pilares garantem, ao menos, que os estudantes diminuam sua carga de estresse: uma alimentação saudável, momentos de relaxamento, atividade física e evitar pensamentos obsessivos.

E a Tamiris? Apesar da dificuldade, deu tudo certo. Ela passou na prova e hoje é uma farmacêutica feliz.

Para mais matérias sobre o ENEM, acesse o Manual do Enemzeiro.