O caminho da felicidade também se faz de excessos
Imagem dos nossos arquivos que não tem nada a ver com Torremolinos! Foto por Tchane Okuyan

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análise

O caminho da felicidade também se faz de excessos

A juventude carente, a falta de ganza e o que significam, na realidade, os "Torremolinos" deste Mundo.

Estava eu há uns dias a ver o início do noticiário das oito da noite, quando me deparei com "o grande" acontecimento em Torremolinos. Por momentos, questionei, "alguém morreu?", "foi uma violação?", "foram assaltados ou raptados?". Nada de nada. Ok, talvez o facto de o número inusitado de estudantes finalistas portugueses envolvidos na alegada expulsão de um hotel mereça atenção. Oitocentos a mil alunos do Secundário convidados a sair de um estabelecimento de hotelaria no estrangeiro, todos ao mesmo tempo é, realmente, impressionante…

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O Jornal da Noite, da SIC, por exemplo, no último domingo, 9 de Abril, e na passada segunda-feira, 10, esteve a matutar no assunto durante cerca de 30 minutos (somando os dois dias) e a única conclusão a que cheguei é que a "montanha pariu um rato", ou, no caso, um sofá no elevador ou um televisor na banheira. Foram contabilizados outros estragos, mas nada que faça um hooligan corar de inveja.

Acredito, aliás, que somente uma reduzida percentagem dos participantes tenha provocado distúrbios. Imagina, se todos os "mil" estivessem na mesma onda e euforia e dispostos a partir fosse o que fosse, o hotel ainda existiria? No meio da bebedeira colectiva, do uso da expressão "eu quero é aparecer", há quem goste de ser o centro das atenções, outros que adoram impor a sua lei e há quem alinhe apenas para se sentir integrado e não ser apontado como careta (eles e elas ao mesmo nível, diga-se). São as "febres" e as carências tão próprias da idade…


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A TECNOLOGIA FAZ TODA A DIFERENÇA

Não gosto de pensar que "na minha altura é que era bom", mas é evidente que ser teenager há 20 anos tinha algumas vantagens face ao que se passa actualmente. Neste tipo de barracadas, a principal vantagem era a de não ter a tecnologia à mão de semear. As fotos (as poucas e inócuas que foram mostradas) e a reacção nas redes sociais, em defesa ou a atacar a atitude dos jovens, seria inimaginável há poucas décadas.

Ter o apoio da parafernália tech pode, em situações de perigo, ser uma mais valia. Por outro lado, um escândalo de pequena/média dimensão (a exemplo da pancadaria nas escolas - até parece que antes éramos todos "anjinhos") ganha contornos de tragédia. Olhando para trás, a minha geração teve uma "sorte do caneco" [era assim que se falava antigamente, acredites ou não]. Nem quero imaginar as centenas de estórias que inflamariam a Internet, por mais insignificantes que fossem…

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A NORMALIDADE DE "SOLTAR AS AMARRAS" EM AMBIENTES "TORREMOLINOS"

Claro que há excessos quando se juntam carradas de adolescentes com álcool por perto (mesmo que estudos e cronistas digam que eles andem a beber menos). Claro que sair uns dias fora do radar dos pais, faz alguma dessa juventude exagerar como se estivesse no clássico milenar, Spring Breakers (que terá a sua versão televisiva). E, claro, não podiam faltar críticos que puxassem os tempos da "velha senhora", para culpar a educação dada pelos pais desses estudantes.

Por exemplo, Bagão Félix, ex-ministro de um governo PSD/CDS, num programa d´A Bola TV (o Tribuna de Honra), disse que, no seu tempo, isto jamais aconteceria, pois os valores eram outros. No entanto, lembro-me que, "nesse tempo", a repressão - a começar pela posição das mulheres na sociedade - era o que era e só meia dúzia de privilegiados fazia excursões lá para fora. Não me pareça que haja razões para lá voltarmos.

Respeito a defesa por uma educação melhor, mas não é isso que todos defendemos? É que, antes, já era o cabo dos trabalhos ser pai e mãe e as influências externas sobre os filhos cingiam-se aos amigos, vizinhança, escola, TV, um ou outro bar e revistas "coladas". Hoje, se educar é, já de si, uma tarefa hercúlea, devido à vertigem do online os respectivos anseios e desejos dos filhos ainda são maiores. Curiosamente, nem sempre os que têm uma educação menos apertada mostram apetência para a completa desinibição quando se encontram em ambientes "Torremolinos".

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Dependendo da personalidade, é usual até que, os que vivem sob uma maior rigidez dos progenitores, "abusem" da liberdade. Pelo meio, na competição desenfreada entre alguns pais, que usam os filhos como troféus para colmatar as suas frustrações e alimentar o ego (do género, "o meu é melhor que o teu"), é normal que haja descendentes à procura de "extravagâncias", quando se apanham fora da alçada dos adultos. Também há os progenitores que, pura e simplesmente, se demitem do seu papel e julgam que os professores têm a redobrada missão de ensinar e educar - conversa para "outros quinhentos".

Visto de outro ângulo, Miguel Sousa Tavares, por exemplo, revelou indignação por esses finalistas pensarem em diversão e não na catástrofe humanitária, que pessoas da mesma idade (ou menos) vivem na Síria, sem saberem sequer se vão ter um bem essencial, como o pão, para comer.

Compreendo e apoio a preocupação do escritor e comentador, mas tenho que levantar a seguinte dúvida (ou não). Desde quando em férias em locais preparados para a festança total, indivíduos com 17-19 anos vão ter um pensamento fora do quinteto álcool-praia-sexo-drogas-música?

Mesmo nos dias "normais", fora desse ambiente frenético, a sensibilidade inerente à experiência de vida leva, no máximo, os jovens [e muitos adultos, convenhamos] a meterem like num post emocionado a propósito de catástrofes no Planeta. Noutras épocas, a maioria das mesmas gerações não era diferente - com outras formas de divertir e interagir, é certo. Só com o tempo, a percepção do Mundo vai mudando na cabeça das pessoas e as excepções (moços e moças de tenra idade que apoiem causas sociais com convicção), infelizmente, estão longe de ser a regra.

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"EPÁ, NÃO LHES LEVEM A GANZA"

Se calhar, o Mata-Bicho, na Antena 3, com Bruno Nogueira, é que tem razão através da sua visão endiabrada (ver vídeo em baixo). Por ficar sem ganza – pois há a tentativa de confiscá-la nos autocarros durante as viagens de ida -, a rapaziada não fica relaxada e precisa de exorcizar toda a loucura e energia sub 20 de outra forma. Uma boa piada, não uma boa desculpa para qualquer tipo de desordem….

Já Kid Cudi cantava em Pursuit of Happiness - com o remix de Steve Aoki - , tema na banda sonora de Project X (vê clip em baixo), "You don´t really care about the trials of tomorrow / Rather lay awake in the bed full of sorrow (…) Everything that's shine ain't always gonna be gold / I'll be fine once I get it (…) I'll be good".

Eu adiciono: aproveitem o frenesim da idade enquanto podem, controlem os excessos, não percam as estribeiras e regressem a casa em segurança, de preferência, com o WhatsApp, ou o Snapchat, de novos amigos/as e/ou namorado/as.

Young people just wanna have fun, right?