O beisebol de Pirituba não pode morrer
Foto: Felipe Larozza/ VICE

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O beisebol de Pirituba não pode morrer

Um pedido de reintegração de posse feito pela Secretaria Municipal de Esportes de São Paulo pode acabar com a sede do Pirituba Warriors, único campo de beisebol da região noroeste de São Paulo.

Até a noite de hoje, 2 de junho, o treinador Agnaldo Veríssimo da Silva se reunirá com representantes da Secretaria Municipal de Esportes (SEME) para, ao lado de dois advogados, tentar impedir a destruição do único campo de beisebol da região de Pirituba – a sede do time Pirituba Warriors e espaço de inclusão para meninos e meninas da zona noroeste de São Paulo.

O possível último treino do Pirituba Warriors no campo da zona oeste de São Paulo. Foto: Felipe Larozza/ VICE

Após um pedido de reintegração de posse feito pela SEME, o disposto senhor de 44 anos teve de encerrar por tempo indeterminado as atividades que desenvolve desde a inauguração do espaço, em 2008. Mesmo com o pedido de reintegração suspenso graças a seus advogados, o espaço já não exibe os troféus da equipe nem os tacos, as bolas e las uvas profissionais doadas pela ONG americana Oakseed Ministries. O técnico teme uma possível 'limpeza' repentina por parte da sub-prefeitura e que, com a faxina, apague a história do seu projeto social.

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Molecada riscando as linhas do campo antes do treino. Foto: Felipe Larozza/ VICE

Caso a SEME decida pelo fim do campo, o dia 24 de maio será lembrado por Agnaldo como o último dia de um projeto com mais de duas décadas. Naquela manhã, 30 dos 60 alunos dele participaram do provável último treino, seguindo uma rotina decorada por todos os frequentadores. Depois de chegarem, muitos trazidos pelo próprio Agnaldo em sua van, as crianças ajudam na preparação do campo: linhas são desenhadas, tacos e luvas são distribuídos e a terra é arada. Uma série de alongamentos é feita e Wilson Pereira Lima Costa Jr., 23, inicia o treino. Chamado por todos por "Júnior", o rapaz de quase um metro e 90 e costas largas aparenta ser um jogador profissional com seus trajes oficiais da liga norte-americana de beisebol. Ao lado de Agnaldo, ele se certifica da ordem durante os exercícios e auxilia seu antigo professor – e atual chefe – nos afazeres daquela manhã.

Wilson Pereira. Foto: Felipe Larozza/ VICE

Entre as tarefas estão a preparação de leite com chocolate e pães com manteiga doados por duas padarias do bairro. Nenhuma taxa é cobrada para as crianças treinarem e, segundo Agnaldo, o café é um atrativo a mais para convencê-las a se dedicarem ao esporte. A manutenção do local e o pagamento dé todas as contas, incluindo água e luz, são feitos com a ajuda mensal e opcional de R$ 25 dos integrantes da equipe adulta. Nenhuma ajuda financeira ou de qualquer outra espécie é destinada ao time por parte da prefeitura ou pela diretoria do CDC, responsável também pelo campo de futebol vizinho, de gramado sintético e patrocinada por uma grande marca de cerveja. Embora a diretoria seja a mesma para ambos os campos, não há ninguém para representar o beisebol por lá.

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Agnaldo Veríssimo, o treinador. Foto: Felipe Larozza/ VICE

"Se a gente fizesse parte dessa diretoria, um dia essa diretoria diria pra gente: 'Olha, vocês são um peso. Esse esporte não consegue trazer recurso'", reclama Agnaldo, enquanto uma menina de agasalho rosa corre para buscar a bola rebatida pelo garoto mais alto do time. O 'recurso' vem do aluguel do espaço: para utilizar o campo de futebol do CDC por duas horas semanais, o aluguel cobrado é de R$ 800. Também são oferecidos treinos de futebol, exclusivamente para meninos, com um custo de R$ 80 mensais por criança.

Emily, no ponto de mais uma rebatida. Foto: Felipe Larozza/ VICE

"O futebol tem muito preconceito com as meninas. Aqui não, é tudo misturado", diz Emily, 12, jogadora dos Pirituba Warriors a 6 anos. Para ela, tanto a mensalidade cobrada para a utilização de um espaço público como a ausência de meninas são formas de segregação. "Se a gente for ali e falar 'pode jogar?' eles falam que é pago. Aqui [o campo de beisebol] é o único lugar que não é pago e o único que é perto. Se tirarem isso, a gente vai fazer como?". Além das meninas, Emily relata sobre crianças 'diferentes' presentes nos treinos do esporte menos popular: crianças com deficiências diversas aptas a praticar o esporte são bem-vindas. "Se não fosse aqui acho que teria muitos jovens que estariam nas drogas, né?".

À espera da rebatida. Foto: Felipe Larozza/ VICE

O treinador de Emily comprova sua teoria. Entre os 12 e 17 anos, Agnaldo acumulou quatro passagens pela antiga Febem por porte de armas e entorpecentes, furto e sequestro. Convencido por membros da igreja batista a abandonar o crime, decidiu mudar de vida. Casou-se e iniciou junto a escoteiros de Pirituba o primeiro time de beisebol da região, em 1995.

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Depois de oito anos treinando em um campo de beisebol amador, construído por meio de um mutirão com a ajuda de empresários, Agnaldo teve seu primeiro contato com a Prefeitura de São Paulo: o campo seria destruído para dar lugar a uma via expressa e, em outro lugar, seria construído um lugar dedicado somente ao esporte e onde seria a nova casa dos Pirituba Warriors. Com a reintegração de posse, agora esse lar está prestes a se desfazer, deixando, mais uma vez, o time sem nenhuma terra.

Campo do Pirituba Warriors ao lado do campo de futebol do Comercial F.C. Foto: Felipe Larozza/ VICE

"Além de interromper a reintegração, queremos que a prefeitura passe a ajudar financeiramente o projeto", afirma Dr. Ricardo Sampaio Gonçalves. Junto a Dra. Simone Pinheiro dos Reis, eles representarão Agnaldo durante a reunião com a SEME .

Após o treino, Agnaldo se apressa para levar as crianças para a escola, outro hábito criado para o melhor funcionamento dos treinos. Dentro do campo, o jogo acabou; fora dele, está prestes a começar.

Mais fotos do último treino do Pirituba Warriors aqui:

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