ESTE CONTEÚDO É UMA COCRIAÇÃO DE BE BRASIL E VICE ESTÚDIO CRIATIVO.Ambulâncias, viaturas, sirenes, buzinas e escapamentos que cospem fumaças tóxicas e apáticas. Falar sobre arte em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Recife ou em qualquer grande centro urbano do Brasil é buscar o que há de sublime na dureza de concreto da cidade. É se ater ao cru que pode, no futuro, tornar a massa bruta do cotidiano em algo extraordinário. Pelas metrópoles, em meio à desordem de metais, gases e plásticos, não faltam materiais e inspiração para jovens artistas descobrirem novas maneiras de se conectar com a cidade e, claro, a transformarem. É o que eles chamam de hack artístico.No coração de São Paulo, na Rebouças, uma avenida que lembra uma longa serpente iluminada nos horários de pico, a "Criatura de Luz", do arquiteto Guto Requena, funciona como espelho dos pecados dos paulistanos. Com a ajuda de microfones, 200 lâmpadas de LED e uma estação meteorológica, a fachada do WZ Hotel Jardins está em constante transformação. Reage e vibra com os estímulos que vêm de fora. O edifício reluz, para o bem e para o mal, de acordo com os sons da avenida, além de indicar a qualidade do ar com tons coloridos, como num arco-íris, alertando para a poluição desenfreada da cidade. Quanto mais poluído e barulhento o espaço estiver, pior será a projeção da criatura.O efeito luminoso só pode ser visto à noite. É quando os os sensores começam a desenhar padrões de luz, em tempo real, ao longo dos 30 andares do hotel. Parte do projeto "Cidade Hackeada", do estúdio de Requena, a obra busca transformar a cidade com ações positivas por meio da sua arte. Sua ideia é estimular, com feixes e cores, a mudança de hábitos e vícios característicos das grandes metrópoles. É o caso de motoristas que não sabem manter as mãos longe da buzina e que acabam impactando diretamente os padrões de luz da fachada interativa. A obra está lá para lembrar que esse não é, ou pelo menos não deveria ser, o caminho de São Paulo.Ações do tipo trazem respiro necessário àqueles que se desdobram para não sucumbir à rotina apressada das grandes cidades. A arte, afinal, não modifica apenas o cotidiano e o espaço urbano em si; ela também serve como ferramenta de comunicação e imersão. Prova disso é o uso de tecnologias virtuais por parte dessa mesma geração de artistas. Com recursos novos de linguagem, os criadores trazem cada vez mais público para dentro da arte. O espectador não só observa. Ele é parte e conceito da obra.As criações digitais não são menos humanas do que aquelas nascidas do ventre clássico da arte. Elas falam sobre nós, o passado, os deslizes, o futuro e todas as suas possibilidades. E também são a forma que acabam conectando o Brasil como um todo, com todas suas cores, sotaques, gestos e tradições, de norte a sul. A dupla Motta e Lima são retrato dessa união por meio de artes e linguagens. Com técnicas que vão de esculturas de luzes a projeção holográfica de beija-flores, eles buscam mudar humores e estados com a arte. Numa de suas obras mais recentes, eles construíram um relâmpago com lâmpadas tubulares. Montadas em diversas formas, as criações podem trazer inspiração e bem-estar, bem como fazer o espectador refletir sobre como desperdiçamos energia elétrica. Emula criação e destruição.Lá fora, o reconhecimento de Requena e Motta e Lima é real. Nossa trajetória se confunde ao ato de fazer arte, de apreender o mundo que nos cerca, dos que chegam e dos que partem. Essa habilidade de se abrir para o outro, se misturando a tantas vidas, estilos e histórias, traz algo de fascinante e significativo às criações artísticas brasileiras, como aponta a curadora de arte Juliana Braga, do Sesc SP. É o tal do jeitinho brasileiro, mas sem qualquer tom pejorativo. O jeitinho é, na verdade, o nosso tesouro.
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