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Música

O OUT.FEST do Barreiro traz-nos cinco dias de tesão exploratória

A margem sul em festa.

EmeraldsOUT.FEST 2010 No ano em que chega à sua décima edição, o OUT.FEST do Barreiro coloca-se especialmente a jeito de uma revisão dos seus momentos mais marcantes, quase como aquela equipa de futebol que, depois de ganhar o campeonato, tem direito a uma montagem dos melhores golos no telejornal da noite. Contudo, não era muito adequado apresentar de marcha-atrás um festival que encontrou sempre novas formas de surpreender o seu público e assim tornar inesquecíveis muitos dos serões vividos por toda parte do Barreiro (desde o seu centro à periferia mais industrializada). Tal como o nome indica, este festival é muito mais dado a progredir pela via da exploração do que a estagnar às mãos da nostalgia, que só serve mesmo para contentar os velhos de espírito. Além disso, vários dos principais dinamizadores do OUT.FEST são também os rapazes que, há sensivelmente dez anos, deram o sangue e muitas horas de sono a um país decidido a romper definitivamente com a década de 90 e a arriscar novas abordagens na música — fosse nos Frango (a grande banda out do seu tempo), nas edições da louvável Searching Records ou nas programações arrojadas que aconteceram em catadupa. Há um pouco desse espírito nas fundações deste projecto, mas há também uma capacidade de resistência e auto-renovação, que acontece ano após ano e que já trouxe até ao Barreiro o safanão dos Wolf Eyes ou Whitehouse, tal como a experiente escola de William Basinski ou de Tetuzi Akiyama. Agora o momento pertence ao OUT.FEST 2013 (a decorrer de 8 a 12 de Outubro) e, por isso, falámos com o co-fundador Rui Pedro Dâmaso para sabermos mais sobre aquilo que se vai passar nos próximos cinco dias no Barreiro. Rui Pedro Dâmaso VICE: Olá, Rui. Tudo porreiro? 
Rui Pedro Dâmaso: Oi, Miguel. Sim, agarrado aos mails já de manhã. Acredito. Antes de falarmos um pouco do festival, gostava de saber onde se come o melhor frango de todo o Barreiro. 
Uau, isso não é fácil. Vou ter que recomendar o melhor frango do centro do barreiro, porque há três ou quatro spots em áreas mais dispersas que costumam estar super-concorridos, mas que nunca tentei. Assim sendo, vou por uma churrascaria da qual nem sei o nome, mas que fica ali logo ao início da Rua Vasco da Gama, que é aquela mesmo em frente ao Tico-Tico, a famosa pastelaria. Altamente recomendado.  Pastelaria só conheço a Nortejo… 
E a Moderna?!  Moderna só conheço a Universidade. 
Tens de ir ao site do OUT.FEST ver as recomendações: a Moderna faz a doçaria tradicional barreirense, as bolas de manteiga de tamanho elefantino.  Certo. Mas o que é o OUT.FEST antes de mais? 
Na sua essência, continua perto do que era quando começámos: um festival para mostrar às outras pessoas o que nos andava a entusiasmar ouvir. Esperamos que hoje o OUT.FEST seja a montra mais emblemática de uma certa forma de fazer música — e aí o termo exploratório é um guarda-chuva, que cobre uma série de músicas que se calhar têm muito pouco em comum entre si para além de uma atitude que intuímos em quem a faz. Uma atitude que passa por uma liberdade que não cabe em géneros, basicamente.  Boa definição. Parece-me por vezes que os mais experientes programadores de outmusic são pessoas especialmente curiosas e predispostas a arriscar em bandas, que, tal como dizes, não cabem em géneros. Interessavas-te mais em descobrir há dez anos ou agora?
Era capaz de ser mais ávido há dez anos, porque parecia que a cada dia se abriam portas para sítios completamente diferentes. Agora acho mais importante ser capaz de não perder a atenção para com aquilo que se descobriu. Ou seja, ouvir mesmo, como um fanboy pré-internet que sempre que comprava um cd o ouvia vinte vezes de seguida. Tenho menos interesse em picar determinado disco e nunca mais voltar a ouvi-lo. É preciso não cair numa de só ouvir o que já se conhece, também. Há que encontrar um equilíbrio.  Fazendo agora também uma revisão do que já se ouviu no Outfest durante estes dez anos, perguntava-te sobre algo que me ocorreu há alguns dias, enquanto estacionava o carro: se pudesses montar o elenco de um westerm contando com todo o pessoal que foi ao festival, quem escolhias para cada papel? 
Bom, se isto for um western, já está para além do alucinado. Mas aqui vai: herói — Pete Kember (Spectrum / Sonic Boom). Vilão — William Bennett (Whitehouse). Dama — a companheira do William Bennett. Xerife — Tetuzi Akiyama. O desaparecido que regressa no final — Jorge Martins, irmão de sangue e guitarrista no primeiro concerto do OUT.FEST a ficar para a história: Fish & Sheep, em 2005. O "louco" — elemento do público que passou um ou duas horas a invocar divindades satânicas em honra ou por causa do Stephen O’Malley. Coveiro — Stephen O’Malley. Xamã índio — fácil, Damo Suzuki. The dude: Spencer Clarke. Menino do coro com super-poderes — Chris Corsano. Encantador de serpentes: Peter Bastien. O santo — Lol Coxhill, que deu no OUT.FEST talvez o penúltimo concerto antes de falecer. O vidente — Sei Miguel.  Isto dava um excelente western do Jodorowsky filmado no Barreiro, Samouco e Moita. Aquela dama merecia um Óscar.  
A dama out faz strip em palco. Impossível não mencionar.  Sim, foi o melhor strip que já vi na margem sul. Grande recompensa depois daquele massacre sonoro… 
Isto foi bem antes daquela cena do Milhões, convém notar.  Qual cena do Milhões? 
Aquela coisa das mamas, mas esquece lá isso…  Alexander von SchlippenbachOUT.FEST 2010 OK. Falemos de coisas mais pudicas: tenho por acaso alguma curiosidade por saber quem são as pessoas mais invisíveis na organização do OUT.FEST. Queres aproveitar o momento para destacar duas ou três delas?
Sim, que isto estava a descambar. Destaco, claro, o meu amigo Vítor Lopes, que não sendo propriamente invisível, afinal, é cofundador do festival — não costuma dar tanto a cara e é quem põe praticamente tudo a girar no terreno. E o Cláudio Fernandes, que todos os anos tem de atender a pedidos de material gráfico em cascata e em curtíssimos espaços de tempo — mesmo que resmungue um bocado.  Boa gente. Ainda não ouvi nada deste projecto da Carla Bozulich que vão ter no último dia do OUT.FEST Como o descreverias a um gajo que, como eu, até curte Evangelista (outro projecto da Carla Bozulich)? 
Tenho especial pica para esse concerto. Bloody Claws é o nome que a Carla usa para os seus concertos de improvisação quase total, geralmente com formações ad-hoc, com gente recrutada na comunidade local (a selecção será surpresa). É ultra-intenso, pelo que tive oportunidade de ouvir de concertos passados, com muita percussão e cordas. Acho que vai ser mesmo dos grandes concertos deste ano.  Panda Bear — OUT.FEST 2010 Quando ela tocou na ZDB, estava rouca e doente, mas percebeu-se que deu o máximo. Percorrendo ainda os nomes do festival deste ano, Mohn parece-me um daqueles concertos imperdíveis, até porque não me parece que venham a haver muito mais oportunidades de ver aqueles dois grandes senhores por cá. Foi especialmente difícil programar esse concerto? Algum aspecto assinalável na comunicação com o Wolfgang Voigt? 
Bom, este é daqueles concertos que já queríamos fazer há muito tempo, e que foi estando sempre apalavrado até surgir a oportunidade. Estamos mesmo entusiasmados por ter calhado agora na décima edição e temos de agradecer o apoio do Goethe-Institut Portugal, que muito ajudou a trazê-los.   Fixe. Parece que estou a ver o Wolfgang Voigt (metade dos Mohn) a beber uma Sagres na Avenida da Praia e a inspirar-se pelo amanhecer para um próximo disco de Gas.
Desconfio que seja tipo para preferir Super… Variable Geometry OrchestraOUT.FEST 2007 Fotografias por Vera Marmelo