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Música

Observações Sobre o Estado do Grime e os Britânicos em Geral Contadas por Meio de uma Linha do Tempo da Eskimo Dance

Nosso especialista em grime colou numa balada da Eskimo Dance em Londres e conta, hora a hora, o que viu e ouviu por lá.

Como fã de grime, os rolês oiginais da Eskimo Dance, de 2003-2004, foram lendários para mim. Assisti repetidamente no Youtube às filmagens granuladas em que futuras estrelas como Dizzee Rascal, Wiley, Tinchy Stryder e Lethal B trocam rimas e se enfrentam em batalhas. Nova-iorquino durante o dia, na semana passada me vi nas Ilhas Britânicas no mesmo fim de semana do retorno da Eskimo Dance a Londres.

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O meu entusiasmo pelo evento era tamanho que, quando meu voo aterrissou em Heathrow no sábado, às 20h15, fui direto para a Eskimo Dance na O2 Arena – que começava às 22h. Isto foi o que aconteceu:

23h50: A fila na O2 é maior do que a fila da imigração para entrar no Reino Unido. Tem um detector de metal, todo mundo é revistado e eles até fazem aquela parada dos clubes de periferia de conferir dentro do seu chapéu, então a revista possivelmente é mais meticulosa do que a da própria imigração. Nos 20 minutos em que esperei, ouvi mais vezes a palavra "mano" do que as vezes em que assisti a Juventude Rebelde e à sua continuação juntas.

0h10: Entro e vejo o Newham Generals (Footsie e D Double) no palco. Eles estão detonando, apresentando as suas músicas de um jeito mais direto do que o usual estilo rave de cuspir rimas aleatórias. Por alguma razão, o volume do microfone do D Double está muito baixo, mas ainda assim, quando ele manda  "Streetfighter", o lugar explode.

0h30: Acaba o set do Newham Generals. O Logan Sama tenta fazer o público cantar junto em "German Whip" e na versão do Fekky de "Sittin' Here". Não emociona. Ele se redime quando o público canta junto com "Next Hype", que acaba comigo no meio de uma multidão agitada de caras gritando "DUN KNOW WE GOT THE SHOTGUN THERE!" (algo como "você devia saber que temos uma espingarda!"). Como todo mundo na Inglaterra usa perfume, isto não é tão desagradável quanto poderia ser.

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1h: O primeiro grande set de MCs começa com Wiley, Chipmunk, Lil' Nasty, Ghetto e Flirta D. O Flirta D pode acabar com uma rave. Ele representa basicamente tudo que os MCs de hip hop odeiam nos MCs de grime. Ele só tem umas oito rimas diferentes, e no geral só faz umas vozes engraçadas e efeitos com a boca como o cara do Loucademia de Polícia. É perceptível o quanto veteranos como Wiley, Ghetto e Flirta são melhores em comparação ao Lil'Nasty e ao Chipmunk (eu também não fazia ideia de que o Chipmunk tinha voltado para o grime, pelo que sabia ele estava fazendo discos com o Chris Brown e, antes de ela ficar famosa, com a Iggy Azaelia). Este set foi legal, mas acho que o Wiley só mandou suas rimas mesmo por uns 45 segundos no total.

1h30: O DJ Majestic, da Kiss FM, toca um set muito legal de garage antigo. Além de poder ver todos os MCs ao vivo, foi ótimo ouvir todas essas faixas das antigas, como "Bound for da reload", em um grande sistema de som.

1h45: JOGUE-OS AOS LEÕES!

1h55: O DJ começa a tocar um set-armadilha de faixas do Top 40 que culmina com o público cantando junto em "Coco", possivelmente mais alto do que nos sets de grime. É meio esquisito ouvir um lugar cheio de gente cantar "Mitch achou um corpo uma semana atrás" uma semana depois do Mitch ser condenado pelo tal corpo. Além disso, na era da internet, não tem desculpa para tocar este tipo de set e coisas como "Bugatti", mas não "Touchdown" ou "Fight Night". Este set começou a me dar sono, mas os barmen pareciam estar curtindo.

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2h: Percebi que ninguém em Londres diz "com licença". Nunca. Primeiro achei que as pessoas estavam fazendo uma brincadeira chamada "esbarre no americano", mas depois notei que todos estavam esbarrando uns nos outros, empurrando uns aos outros e se acotovelando a noite inteira. Este é o motivo, provavelmente, porque as pessoas se esfaqueiam o tempo todo em Londres.

2h15: Começa o set do OGz. Embora no programa só constasse o P.Money, ele trouxe o resto do grupo com ele. Este pode ter sido o meu set favorito da noite, já que eles trocavam rimas de um jeito bem amarrado. O P.Money cuspindo "Left The Room" sobre a batida do Pulse X me destruiu.

2h45: Acho que ouvi aquela música que cantam para animar o público, "Ollie Ollie Ollie, Oi! Oi! Oi!", uma 17 vezes esta noite, e todas as vezes ela me fez lembrar daquele episódio do The Office em que o David Brent faz uma ponta numa boate.

3h15: O set principal de MCs começa. No programa, aparece só o Boy Better Know, mas, junto com o Skepta e o JME, no palco estão vários velhos MCs como Jammer, God's Gift, Flo Dan e Manga Discarda, assim como outros novos como Kozzie, Merky Ace e Big Shizz. Nenhum sinal do Wiley, o que é um pouco decepcionante. De novo, é evidente que MCs mais velhos como o Skepta e o Flo Dan têm uma presença de palco (e conhecimento de que tipo de rima é boa para gritar num lugar cheio de gente alterada) que os mais novos não têm. Mesmo um MC menos talentoso como o Discarda pode conseguir uma reação mais animada do público com "DISCARDA'S OUT, AND I'LL BANG YOUR FATHER OUT" (algo como "o Discarda tá na área, e eu vou comer o seu pai") do que um MC mais novo com uma rima tecnicamente superior.

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3h30: "That's Not Me" é recebida com muita animação, mas, sinceramente, eu estava mais feliz ouvindo o God's Gift cantar o gancho inicial de "Know We" dois minutos atrás.

3h48: O Jammer coloca outro disco e cospe a sua rima "Murkle Man" umas cinco vezes durante o mesmo set de meia hora. O cara está precisando de umas rimas novas.

4h: O set acaba com "Funtionz On The Low". Belo final e, provavelmente, a melhor forma de ser ejetado para a fria noite londrina.

No geral, foi uma boa noite. Eu podia ter passado sem ouvir "Take Off", do Faze Miyake, umas cinco vezes (por outro lado, não me incomodou nada ouvir "Pied Piper" algumas várias vezes). Mas foi da hora ouvir um mix das clássicas batidas de 2004 com produções novas do Spooky, do Preditah e do Darq E Freaker.

Afinal de contas, se os rolês da Eskimo Dance só tiverem produções e MCs antigos como atrações principais, por quanto tempo o grime irá se manter como uma música jovem? Se tudo o que grime tem a oferecer em 2014 são as estrelas de 2004, isso não é um bom presságio para a saúde do gênero como um todo. Mas, para que novos MCs apareçam, eles precisam ter um lugar onde possam aprender seu ofício diante do público, e promover eventos regulares de grime em Londres é o único jeito de fazer isto acontecer.

Peter Gunn é o nosso especialista em grime - @PGunnNYC

Tradução: Fernanda Botta