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Explicando Yanis Varoufakis: o 'Rock Star' Antiausteridade da Grécia

Leia agora o prefácio do livro do ex-ministro das finanças da Grécia, escrito por Paul Mason, editor de economia do Channel 4 News da Inglaterra.

"Yanis Varoufakis no Subversive Festival" por Robert Crc – Subversive Festival. Licenciado sob a FAL via Wikimedia Commons.

Na manhã de ontem, o ministro das finanças grego Yanis Varoufakis anunciou sua renúncia em seu blog. Isso apesar da vitória do "não" no referendo sobre as medidas de austeridade no país, um resultado que Varoufakis chamou de "esplêndido". Varoufakis disse que "soube de certas preferências de alguns participantes do Eurogroup e 'parceiros' variados, pela minha… 'ausência' em suas reuniões" ,e portanto, ele está renunciado para ajudar o primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, a chegar a um acordo. Ele disse que vai "usar o desprezo dos credores com orgulho".

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As ideias antiausteridade de Varoufakis estão descritas em seu livro The Global Minotaur: America, Europe and the Future of Global Economy ("O Minotauro Global: EUA, Europa e o Futuro da Economia Global", não publicado no Brasil). Abaixo temos o prefácio do livro, escrito por Paul Mason, editor de economia do Channel 4 News da Inglaterra.

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No dia 20 de fevereiro de 2015, Yanis Varoufakis entrou no quartel-general da União Europeia sozinho – tanto literal quanto figurativamente. Ele veio sem conselheiros, parceiros da imprensa ou guarda-costas – e com a imprensa de Bruxelas salivando sobre o que parecia ser uma rendição certa e abjeta. Dezesseis dias antes, o Banco Central Europeu tinha furado o balão de euforia da eleição do Syriza, retirando de repente sua linha de crédito regular para os bancos gregos, os colocando na UTI e desencadeando uma corrida silenciosa para a retirada de depósitos bancários.

Quando Varoufakis chegou a Bruxelas, ele sabia que mais de € 1 bilhão por dia eram drenados do sistema bancário grego: sem um acordo, ele seria forçado a impor controles sobre o capital, limitar retiradas em caixas eletrônicos e evitar o envio de dinheiro ao exterior. No final ele assinou um acordo longe de ser uma rendição abjeta. A Grécia poderia implementar medidas antiausteridade; os altos níveis de excedente orçamental (4%) exigidos no resgate de 2011 foram dispensados.

Em todos os sentidos, a Grécia ainda era uma colônia de débito da UE. Mas o país tinha conseguido um mínimo de autogoverno e o que chamamos de "burguesia compradora" – os agentes dóceis dos colonos – se foram.

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Um político comum teria dado uma declaração lacônica, respondido duas perguntas e ido direto para a sauna do hotel. Mas Varoufakis respondeu perguntas por 40 minutos, saudando o acordo como uma pequena vitória – o que, quando você entende a eurozona, foi mesmo. Porque Varoufakis tinha, naqueles 16 dias, escapado do minotauro.

Na versão original de seu livro, The Global Minotaur: America, Europe and the Future of Global Economy, ele faz uma análise da crise de 2008 e seus resultados usando a lenda do minotauro de Creta como uma metáfora: o "Minotauro Global" era o capitalismo norte-americano centrado em Wall Street, extraindo tributos do mundo depois de 1971. Na falta de um Teseu para matá-lo, a besta mítica foi morta por uma economia insustentável. Mas o espírito do minotauro vive. Economia de austeridade e a primazia de bancos sobre famílias, negócios e o tesouro do estado, têm sido os artigos de fé guiando a eurozona desde que a crise grega começou. Assim como os EUA impuseram um negócio de um lado só sobre o mundo depois da queda da Bretton Woods, a Alemanha continuou determinada a levar apenas vantagem no arranjo do Euro.

Com a chegada do Syriza ao poder, o Minotauro Euro despertou, olhou em volta e fez de seu alvo a presença mais colorida em seu labirinto – Varoufakis.

Apesar de acompanhar seu trabalho há anos, só conheci Yanis Varoufakis pessoalmente três dias antes da eleição em 25 de janeiro de 2015. Ele explicou seu argumento com lucidez, e seu plano: a Grécia era efetivamente insolvente; o resgate da Europa entregaria € 320 bilhões para os bancos do norte europeu para protegê-los desse fato. A menos que a eurozona adquirisse um mecanismo eficiente para reciclar excedentes e défices ficais – com as montanhas de poupanças inativas energizadas se tornando investimentos produtivos, particularmente onde falta investimento – isso estaria "terminado em dois anos".

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Mas Varoufakis continuava convencido, como a maioria dos gurus da economia do Syriza, que um "bom euro" era alcançável. Os presságios eram positivos: Mario Draghi (presidente do Banco Central Europeu) tinha lançado uma flexibilização quantitativa – um estímulo monetário de € 1,6 trilhões – e também tinha pedido menos austeridade. Jean-Claude Juncker (presidente da Comissão Europeia) tinha lançado um fundo visando trazer € 300 bilhões de investimento para a eurozona afetada. Os políticos se alinhavam a favor da Grécia. Entre a eleição e o dia 20 de fevereiro, Varoufakis aprendeu uma lição em nome de toda a esquerda europeia: não são os políticos que controlam a Europa, mas o minotauro.

Não sabemos se a vitória de Varoufakis no dia 20 de fevereiro vai durar, se expandir ou se fechar. Mas sabemos o poder que ideias novas podem ter. A fala sincera de Varoufakis mudou o modus operandi das cúpulas do Euro, provavelmente para sempre. Seu preparo para expor os mecanismos de poder e pressão das cúpulas ameaçou acabar com o emprego da imprensa que devotou a vida a acomodar isso. Em cada conversa lá, três públicos estavam presentes: gregos, seus credores e os trabalhadores e jovens da Europa.

O que mais irritou os credores era que Varoufakis parecia e soava como um deles. Um economista de sucesso na tradição da Europa Ocidental, que foi para a esquerda numa época em que outros de sua geração tinham ido para a direita, Varoufakis sabia como o mundo neoliberal funcionava o suficiente para fazer cada choque com ele parecer menos excruciante. Muitos políticos não podem ser teóricos. Primeiro, porque eles raramente são pensadores; segundo, porque o estilo de vida frenético deles não deixa tempo para grandes ideias. Mas principalmente porque para ser um teórico, você tem que admitir a possibilidade de estar errado – a provisoriedade do conhecimento – e saber que você não pode contornar um problema teórico.

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Neste livro, Varoufakis desnuda o problema central da economia mundial: a falta de um agente para criar novas regras, novos paradigmas de comportamento e novos reservatórios de consentimento popular. Se a China não está pronta, a Europa central é muito impopular e os EUA muito decadentes, ele faz a pergunta: quem fará isso? Através da incompetência e negligência do centro político grego e a exasperação de seu povo, a resposta era: a esquerda radical.

Perdendo ou ganhando a luta com as instituições do Euro, o Syriza tem demonstrada o poder da teoria. Varoufakis previu um final catastrófico para a bonança grega, a insustentabilidade da alavancagem financeira e fragmentação de eurozona – mesmo enquanto as teorias aceitas pelo Wall Street Journal e Financial Times dizem o oposto. Ele também disse aos seus consultores, desde o começo, que eles podiam esperar um acordo com a Europa apenas "um minuto depois da meia-noite". Ou seja, ele teorizou possíveis resultados acidentais da crise.

Isso dá ao The Global Minotaur seu poder e agudeza. Não sabemos como a luta entre Syriza e a eurozona vai acabar – mas podemos ter certeza que isso vai envolver comprometimento. Políticos vivem num mundo de compromisso; teóricos não. Mas no final, a esquerda radical vai saber o que significa lutar por um capitalismo novo e mais justo, sob o peso da resistência do antigo.

28 de março de 2015

Este é um trecho do prefácio de Paul Mason para The Global Minotaur: America, Europe and the Future of the Global Economy de Yanis Varoufakis, recém-publicado pela Zed Books.

@paulmasonnews

Tradução: Marina Schnoor