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Tecnologia

​Um Policial Usou o WhatsApp Para Me Explicar Por que o App Deveria Ser Banido

Ele disse que sua equipe mais uma vez tentaria bloquear o serviço de troca de mensagens por conta de sua falha ao cooperar em outras investigações.
​Crédito: Flickr/Microsiervos

Juízes brasileiros podem ser meio messiânicos. Em 2013, uma treta entre uma ex-Miss Brasil, um dentista e um pitbull se espalhou pela internet, o que fez com quem um juiz ameaçasse puxar o cabo do Facebook por todo o país.

Agora, outro magistrado, no estado do Piauí, ordenou que empresas de telecomunicação bloqueiem o aplicativo de troca de de mensagens WhatsApp por todo o país, após a empresa ter se negado a fornecedor informações para uma investigação da polícia.

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Na noite de quinta, uma instância mais alta anulou a ordem do juiz para bloquear o WhatsApp. A decisão não pode ser corrida. Porém, Alessandro Barreto, um dos policiais que fez o pedido original, disse ao Motherboard (via WhatsApp) que sua equipe mais uma vez tentaria bloquear o serviço de troca de mensagens por conta de sua falha ao cooperar em outras investigações.

No decorrer da última semana, milhões de brasileiros tem procurado por outros serviços de troca de mensagens online, temerosos de que o WhatsApp seria cortado a qualquer instante.

O juíz Luis Moura Correia ordenou que o WhatsApp fosse bloqueado em 11 de fevereiro, após não cooperar com uma investigação da polícia. Os detalhes desta investigação permanecem sigilosos, mas os dados foram solicitados pela unidade policial responsável pela proteção de crianças e adolescentes da capital do estado, Teresina.

Correia, que havia pedido pela cooperação da empresa em 2013, só comenta que as acusações são "sérias. […] Do contrário, não estaria fazendo isso". Na imprensa nacional, presume-se que tais informações estejam ligadas à acusações de pedofilia e/ou pornografia infantil.

A determinação do juiz "é uma forma de fazer a empresa honrar suas obrigações, de forçá-la [WhatsApp] a cooperar para que a investigação possa seguir em frente", disse Correia.

Apesar de as intenções por trás desta decisão sejam nobres, cerca de 45 milhões de brasileiros utilizam o aplicativo. Muitos se impressionaram com a abordagem do juiz.

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"Esta decisão limitaria o direito constitucional à liberdade de expressão"

"Por que milhões deveriam ser penalizados por conta de um punhado de usuários?" questionou Gisele Arantes, especialista em direito digital. "Esta decisão limitaria o direito constitucional à liberdade de expressão. O Brasil é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos. Esta ação viola claramente o tratado e pode fazer com que o país seja punido por violar direitos humanos. Isto é censura."

Os policiais envolvidos na implementação da decisão citaram o novo código de direitos civis na internet, o Marco Civil, como justificativa para suas ações.

Em uma coletiva de imprensa no dia 25 de fevereiro, Kátia Esteves, investigadora da unidade de crimes contra a criança do Piauí, defendeu a decisão.

"O WhatsApp pode ser bloqueado de acordo com o Marco Civil. Trata-se de uma empresa que fornece serviços no país e com representação no país", disse. "Neste caso, o representante brasileiro do WhatsApp é o Facebook."

O Facebook, por sua vez, só completou sua aquisição do WhatsApp no final do ano passado e argumentou que ambas as empresas são entidades independentes. A rede social afirma não ser responsável legal do serviço de troca de mensagens. Nenhuma das empresas respondeu nossas tentativas de contato até o fechamento desta matéria.

Sem apoio do Facebook ou WhatsApp, o juiz mirou nas telecoms.

Mas Arantes argumenta que a nova legislação brasileira oferece outras soluções legais para se responder à uma intimação. "O Marco Civil permite penalidades financeiras, suspensão temporária de serviços, bem como interrupção total dos mesmos. O juiz foi direto na opção mais extrema. Ele tinha outras formas de fazer as empresas cooperarem."

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O SindiTelebrasil, sindicato das empresas de telecomunicação brasileiras emitiu um comunicado expressando sua "surpresa" com a decisão do juiz.

"Para o SindiTeleBrasil, a decisão é desproporcional, tendo em vista que para se obter informações de um punhado de pessoas, […] determinou-se que o serviço seja suspenso por todo o país", diz a nota. "Além do que, esta solicitação foi feita para as empresas de telecomunicação, que não tem nada a ver com o serviço."

2 million new signups from Brazil in the last 20 hours. Currently signing up 100 new users per second.

— Telegram Messenger (@telegram) February 26, 2015

Enquanto a incerteza paira no ar, usuários do WhatsApp seguem em pânico sua migração para outros serviços. Na tarde de quinta-feira o Telegram tuitou ter ganho 2 milhões de novas assinaturas brasileiras nas últimas 20 horas; um índice de 100 novos usuários por segundo.

Tradução: Thiago "Índio" Silva