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Carta de um Ciclista Chato

Eu tô fazendo minha parte me arriscando nos 8 quilômetros que separam minha casa da redação da Vice às vezes. Normal, sou fumante inveterado e mesmo as subidas são OK - você acha que inventaram marcha pra que?

Tem três coisas que geral gosta de fazer em grupo e eu prefiro fazer sozinho: fumar um, bater punheta e andar de bicicleta. E nessas eu prefiro pedalar a dirigir um carro. Mas claro que não é todo mundo que encara ir trabalhar e/ou estudar de bicicleta em São Paulo. Claro que a maioria das pessoas prefere andar sozinha de carro por aí, mesmo que esse "andar" seja totalmente relativo e irônico, significando, atualmente, ficar parado de bobeira sozinho dentro de um veículo no trânsito que não flui, esperando vir alguém te assaltar enquanto inala mais fumaça do que se tivesse na calçada ao lado esperando ônibus, andando a pé ou… pedalando. Não precisa acreditar, é só seguir esses links que tá tudo ali. Ciência, gente. Científico. Bonito demais.

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Tudo isso é claro porque as ruas dessa cidade são uma merda pra andar de bicicleta – sempre foram. Ultimamente estão piores porque tá tudo esburacado, mas eu vou ser gente fina aqui e não responsabilizar a Prefeitura que, aliás, aumentou o IPTU esses tempos. Metrô quase não tem (é a metrópole com menos metrô por habitante no mundo), táxi é caro pra cacete (ainda assim é mais em conta do que ter um carro) e os ônibus também estão cada vez piores, isso pra não falar dos pontos de ônibus, que são um lixo – não protegem ninguém de nada, sol, chuva, água espirrada das poças formadas nos buracos na rua pelas rodas dos veículos. Daí que muitas pessoas também preferem ter moto, claro, que, na maioria das vezes, polui mais ainda que um carro e tem como anteparo de qualquer porrada nada menos do que o próprio corpo do condutor. "Live fast, die young", uau, gostoso demais. Sério, sacando a situação do transporte público dá vontade de não ficar velho de jeito nenhum. O que eu vejo de gente idosa tomando tranco dentro do busão (os cobradores me falaram que os ônibus novos são vagabundaços, portanto a suspensão abre o bico em meses) e sofrendo nos pontos dá vontade de morrer logo mesmo.

Eu tô fazendo minha parte me arriscando nos 8 quilômetros que separam minha casa da redação da Vice às vezes. Normal, sou fumante inveterado e mesmo as subidas são OK – você acha que inventaram marcha pra que?

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Mas tem outro fenômeno que rolou nos bairros do centro expandido da capital (AKA bairros DE BOY), como o que eu moro, que foi o sumiço das bicicletarias firmeza. Agora até o Word e seu perfeito corretor automático e o Houaiss tão aqui me dizendo que "bicicletaria" não existe. Enfim, nesses bairros, hoje em dia, só se encontra a versão metrossexual de bicicletaria: ao invés de garagens meio sujas atulhadas de bicicletas e peças velhas com tiozinhos e moleques que realmente pedalam cuidando das magrelas, tem esses picos mega iluminados e envidraçados com bicicletas importadas e donos e funcionários que pagam de atleta – aquela galera que coloca a bike (gringa) no alto do carro e vai até algum lugar pra pedalar. NENHUM RESPEITO pra quem leva a bicicleta no carro. Não me interessa se é o Lance Armstrong com três bolas e pedalou os cinco continentes, se é alguém que não pedala no meio dos carros, pra mim é um comédia. E deve ser mesmo, tipo essa galera que aplaudiu a "nova ciclovia", que na real é outra impermeabilização das margens do rio. Cara, a parada fica entre o rio/esgoto e a marginal! Tipo, eu fumo, mas escolhi fumar, e não fumo cocô e porcarias químicas, só as porcarias químicas mesmo.

Hmmm…

Todo esse imbróglio pra dizer que EU AMO O TONY BIKES. É que aconteceu o seguinte: eu tive que consertar várias vezes minha bicicleta nessas tais versões metrossexuais das aconchegantes garagens de conserto de… Bom, você entendeu. Nessas, um dos meus talentos, que é arregaçar coroas (a engrenagem dianteira, não pensa besteira) sempre me obrigava a usar os comércios metrossexuais. Mas sempre ficava um crac-crac dos infernos e com uma certa folga na pedalada, tipo um engasgo, que inclusive atrapalhava em muito o meu desempenho e planejamento – tipo, "vou ultrapassar aquele vacilão ali". Achei que era a qualidade das peças.

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Nesse meu rolezinho me deparei com o a BICICLETARIA Tony Bikes, uma garagem grande naquele esquema lá aconchegante. Levei minha bici (nacional) lá e algumas horas mais tarde o Tony me liga pedindo que eu voltasse. Resumindo: os idiotas do comércio metrossexual sempre montavam as coroas do jeito errado e isso quase espanou eternamente o buraquinho – eu ia perder o quadro inteiro, não fosse o Tony Bike, que levou o quadro num torneiro amigo dele que deu jeito na parada. Além disso, conversei um monte com ele e descobri que ele já pedalou patrocinado pela Caloi e que, inclusive, o pai dele fazia peças pra Caloi – na época da Segunda Guerra Mundial quando o Brasil parou de importar peças da Europa e tals. O pai dele tinha uma marca de bicicletas chamada Adaga. Ele até me deu um brasão que sobrou.

Adaga, cara!

E foi o pai dele quem ajudou demais o projeto da Berlineta. A ideia de bicicleta dobrável veio da Itália, mas o tamanho foi decidido aqui. O lance é que, dobrada, a bicicleta tinha que caber dentro de um Fusca, que era o carro sucesso de antanho. Os testes duraram seis meses até ir pras lojas.

Ele também me mostrou essas fotos antigas que tão aqui, e é fumante como eu. Tony Bikes, TI AMU!

A bicicletaria tá na Av. Santo Amaro desde que ela era assim. Adaga!

Não falei que o pessoal gosta de pedalar juntinho?

Naquela época, a pedalada anual da cidade chamava Bic-Nic, e não Qualquer-Porra-Bikers.