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Música

Você Já Teve a Honra de Ver o Saco do David Yow? O Livro do Jesus Lisard Conta Histórias Sobre Ele e a Banda

Tudo que você queria saber, ou não, sobre uma das bandas mais poderosas e confusas dos anos 1990.

Foto de Diane Jefferis

Estamos no bunker secreto e literalmente underground de David Yow em Los Angeles comendo um pouco do seu habanero caseiro com tortilhas que ele importou do seu lugar favorito em Chicago e o agora barbudo líder do Jesus Lizard nos fala sobre um dos seus maiores talentos: mijar enquanto anda -- sem deixar cair uma única gota nas suas calças. “É incrível quando você precisa mijar ao mesmo tempo em que está a fazer uma longa caminhada, porque você pode olhar pra trás e ver a duração da sua jornada”, ensina. “Você deixa um rastro muito específico quando mija andando. Você pode sair impune porque se alguém por acaso percebe, é tão absurdo que a pessoa nem acredita. É quase como ver uma pessoa pelada em público. As pessoas olham, mas ninguém tem coragem de fazer nada.”

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Há mais de uma história sobre Yow mijando em público -- e ficando bêbado, pelado e ocasionalmente estropiado -- no novo livro do Jesus Lizard, cujo engenhoso nome é: O Livro do Jesus Lizard. O impressionante livro de mesa de centro nos conta a história de uma das bandas mais poderosas e confusas dos anos 1990, incluindo memórias aprofundadas de todos os quatro membros do Jesus Lizard -- David Yow, o baixista David Wm. Sims, o guitarrista Duane Denison e o baterista Mac McNeilly -- sobre sua jornada suada e ralada pelo underground norte-americano e além.

Noisey: Vamos começar com a mais óbvia das perguntas: Por que fazer um livro do Jesus Lizard?

David Yow: Essa é a pergunta mais óbvia?

É, acho que é.

OK, boa pergunta. Não sei. O Johnny Tempo, do Girls Against Boys e da Akashic Books, nos abordou há uns anos pra falar sobre fazermos um livro. Minha reação instintiva foi “pra quê?”. Quer dizer, já nos separamos há tanto tempo. Quem se importaria? Mas então conversamos entre nós e fomos de “pra quê?” até a minha insistência em ficar responsável pelo design. Houve alguns momentos em que lançamos coisas e outras pessoas fizeram a direção de arte e eu nunca curtia. Então concordei em fazer o livro se eu pudesse organizá-lo. Mas levou muito tempo pra compilar e corrigir a cor das fotografias todas, e eu não estava ganhando dinheiro fazendo aquilo, o que acabou colocando uma pressão no meu relacionamento. Cheguei no ponto em que minha namorada já estava, “é melhor você passar isso pra outra pessoa”. Então passei pra Henry Owings da Chunklet Magazine. Ele assumiu o projeto e teve ótimas ideias.

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Mais alguém da banda se sentiu assim?

Sabe, eu honestamente não me lembro de ninguém ser muito contra ou muito a favor disso. Mas, no geral, qualquer coisa que envolva a banda não me interessa nem um pouco.

Por quê?

Porque eu meio que penso que, uma vez que você termina, acabou. Você não precisa revisitar isso. Eu não estava animado com a ideia dos reencontros que fizemos [2009-2009], ou como costumam dizer, “as reencenações”. Mas sempre fomos muito democráticos. Os outros caras todos queriam fazer os shows, então não ia ser eu a negar. Não sei o que me levou a ficar interessado pelo livro, no entanto -- acho que foi a possibilidade de fazer o design. Mas ele acabou ficando muito bom. As fotografias são ótimas, mas as partes escritas é que são o lance pra mim. Vale a pena nem que seja só pelos textos de Mike Watt e Alex Hacke e mesmo do Einstürzende Neubauten. Só essas já valem o livro. O texto de Mike Watt é “Que linguagem é essa?”. Quando você termina de ler, consegue perceber exatamente o que ele quis dizer, mas não faz ideia do que foi que ele disse.

Eu particular gostei dos textos dos próprios membros da banda. A personalidade de todos vem à tona, e quando o leitor percebe que vocês são quatro pessoas muito diferentes e que conseguiram superar as idiossincrasias um do outro desde o começo do processo de início da banda.

Não sei quanto havia pra ser superado. Nos demos muito bem desde o começo. Eu e David éramos amigos desde 1980 ou algo assim. Quando Mac entrou na banda, David, Duane e eu morávamos juntos, e o Mac veio dar uma sondada. Fizemos todo tipo de piada possível com ele, tipo “certeza que ele é uma maricona”, coisas assim. Fizemos um grande jantar pra dar boas vindas à sua chegada em Chicago, e quando fomos ver ele era vegetariano. Ficamos tipo “ah, que lindo, uma bicha vegetariana”. Mas rapidamente ficamos amigos.

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Uma das primeiras histórias no livro é sobre o primeiro show do Jesus Lizard, que aconteceu num restaurante tailandês em Chicago. Corey Rusk da Touch and Go disse que foi o primeiro e último show que rolou lá. Vocês destruíram o lugar ou algo assim?

Não sei por que não fizeram mais shows lá, mas não teve quebradeira, nada assim. Fomos a primeira de três bandas -- éramos nós, King Kong e depois o Slint. Acho que fiquei com as mãos no bolso o tempo todo. Estava apavorado. Me lembro que primeiro vinha o jantar e depois o show, e depois que as bandas tocaram, esvaziaram as mesas e o gerente disse “OK, não há mais mesas! Agora temos uma pista de dança!” Mas as pessoas ficaram sentadas nas mesas enquanto tocamos. Foi uma configuração esquisita, porque as pessoas tinham que olhar por cima dos ombros pra verem as bandas porque suas cadeiras estavam viradas pro lado contrário.

Eventualmente você se tornou famoso por se jogar do palco na plateia. David até escreveu que ele não entendia como você conseguia se lembrar das letras ou mesmo cantar enquanto era manuseado por tanta gente. Como era isso pra você?

Quanto a lembrar-me das letras, isso estava no piloto automático. Elas meio que estavam lá. A única vez que eu me lembro de foder com tudo e esquecer as letras foi num show em Milwaukee. Tínhamos uma música chamada “Then Comes Dudley”. No setlist escrevíamos só “Dudley”. Mas me deu um tilt e eu simplesmente me esqueci das palavras. Então a música começou e eu fiquei gritando “Dudley!” o tempo inteiro. Mas, geralmente, quando me esqueço de uma letra fico cantando qualquer bobagem durante a música inteira. Essa foi uma das coisas boas de se estar numa banda assim. Os outros três caras eram tão precisos no que faziam que eu não precisava me preocupar. Sabia que não importava onde caísse, eles estavam ali pra mim. É engraçado, já vi críticas que diziam “Yow estava no mosh quase o show inteiro e mesmo assim não errou nenhuma vez”. Mas, na verdade, eu errei várias vezes! [risos] Mas isso não importava porque acabava funcionando.

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Depois de ver um show do Jesus Lizard, uma pessoa definitivamente vai embora com a impressão de que você era o malucão da banda. Você se sentia como o malucão?

Talvez, sim. Tinha essa reputação, e achava que certas coisas eram esperadas de mim. Algumas vezes entrei em conflito com isso. Se as pessoas queriam que eu tirasse a roupa e pulasse na plateia, eu não queria. Mas lá pelas tantas no show eu acabava fazendo. [risos] Normalmente por causa do álcool.

Foto de Dan Parker

Você se sentia como se estivesse carregando outra personalidade consigo?

Um pouco, sim. Sou um cara legal; sou bem fácil e tal. Mas as pessoas sempre falaram sobre o quão louco e agressivo eu era. Nunca me vi como uma pessoa agressiva. A música que aqueles caras tocavam meio que me deixava louco. Era divertido. Era entretenimento. Me dei conta disso e tentei me divertir. Mas me machuquei muitas vezes tentando fazer isso. Sem ossos quebrados, mas nervos estirados e concussões que foram ruins o suficiente pra nós fazerem parar shows ou cancelar restos de turnês. Uma vez estávamos tocando em Alburquerque e um moleque agarrou meu braço enquanto eu estava num mosh -- sei que não foi por mal -- mas eu meio que me virei e caí em cima do meu cóccix. Quando fui tentar me levantar, minhas pernas não funcionavam. Me arrastei até o lado do palco e tivemos que parar o show. Tinha 37 anos e tinha feito meu primeiro moicano da vida. Então fomos pro hospital e o médico viu meus raios-x e me mostrou que havia um grande peido na minha bunda obstruindo a sua visão. O que eu achei hilário. Era tipo aquele disco do Pink Floyd Obscured by Clouds, ou aquela música do Butthole Surfers “I Saw An X-Ray Of A Girl Passing Gas” (vi o raio-x de uma garota peidando). Você realmente pode ver peidos em raios-x. Mas acabou por ser uma contusão no nervo e tivemos que cancelar o resto daquela turnê.

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E aquela vez que você levou uma pancada em Zurique?

Sim, acho que nosso tour manager contou essa história no livro. Cheguei a ver um vídeo daquilo e quase vomitei, porque a plateia me pega e me coloca de volta no palco e parece que estão colocando um corpo ali. Ver meu braço despencar daquele jeito me deixou nauseado. Mas foi engraçado porque aparentemente estavam tentando me colocar numa maca e eu dizendo pro paramédico que ele tinha um lindo bigode e “Nicht ist los”, que significa “Não tem nada de errado”.

Num dado momento vocês tiveram uma música chamada “Metropolis” mas depois mudaram o título pra “Tight N’ Shiny” porque você gostava de botar seu saco pra fora nos shows durante essa música. Como isso começou?

A primeira vez que tocamos essa música, era um instrumental chamado “Metropolis”. Acho que era nosso quarto ou quinto show na vida. Não sabia o que fazer no palco enquanto aqueles caras estavam tocando, então eu fumava um cigarro e punha meu saco pra fora. Num dado momento, não muito depois daquilo, mudamos pra ““Tight N’ Shiny” (apertadinho e brilhante). Acho que o Steve Albini talvez tenha cunhado esse termo. Ele diz que era a coisa mais hilariante que já tinha visto.

Você faz alguma ideia de por que quis botar suas bolas ao léu?

Não sabia o que mais poderia fazer! Tinha esse amigo de Dallas que fazia isso em festas e chamava de “The Spoon Trick” (o truque da colher). Estávamos na casa de alguém e ele pegava uma colher, botava uma bola pra fora do zíper e encaixava a colher ali. Ele andava numa boa pela casa, conversando casualmente com as pessoas, e às vezes elas percebiam e às vezes não. Ele era completamente apático ao fazer isso. Então ele provavelmente foi a inspiração.

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E isso meio que virou sua marca registrada. Bem, pelo menos uma delas.

Sim, as pessoas gritavam, “Tira a roupa!” ou “Mostra seu saco!”. Muitas vezes eles rasgavam minhas roupas em pedaços, o que meio que me irritava porque eu não tinha muitas roupas e não tinha dinheiro pra substitui-las todas as noites.

Mark Todd, seu antigo professor, descreveu suas letras como “supreendentemente específicas e ainda assim ambíguas”. Você concorda com essa afirmação, e era essa a sua intenção?

Bem, não sei qual era a minha intenção. Não sei se era ao mesmo tempo algo específico e ambíguo, mas… OK, “Monkey Trick”, por exemplo. Acho que foi a melhor música que já fiz. E liricamente, não faço ideia de sobre o que é a música. Mas soa como se fosse sobre algo. No fim das contas, fala sobre “pedaços de corpos por toda a cidade”. Me lembro de quando vivia em Austin e pés e mãos aparecerem em diferentes lixeiras da cidade. Eu achava aquilo horrível e ao mesmo tempo interessante. Mas essa parte não tem nada a ver com o resto da música. Então as partes não estão necessariamente ligadas umas às outras. Mas acho que se você ler a letra dessa música, fica essa impressão. Não acho que estava com um alvo específico, no entanto.

Vocês levaram muito chumbo dos fãs e do mundo indie em geral quando assinaram com uma gravadora grande depois de quatro discos com a Touch and Go. O que você se lembra sobre essa época? Deve ter sido muito frustrante.

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É estranho porque as pessoas consideram isso como se vender. Mas a forma como eu defino “se vender” é fazer algo que você não se orgulha por dinheiro. Se o que você está fazendo é o que você quer fazer e você sente orgulho daquilo, você tem é que ganhar o máximo de dinheiro possível com aquilo. Pra começar, eu amava a Touch and Go. Mas a coisa tinha chegado num ponto em que parecia que não conseguíamos seguir adiante com eles. E eles sempre disseram desde o começo que se quiséssemos ir pra outro lugar, que teríamos a benção deles.

Você acha que vocês realmente perderam fãs ao assinar com a Capitol?

Acho que provavelmente sim. É engraçado: as pessoas que nos conheceram mais tarde acham que Shot é o nosso melhor disco, e esse foi o primeiro que fizemos pra Capitol. Eu só disso isso porque vi isso sendo dito na internet. Mas isso foi muitos anos depois do ocorrido. Na época, entretanto, nosso público estava dividido. Acho que se mudar pra uma gravadora muito grande fez isso. Mas com Goat e Liar fizemos turnês adoidado, então talvez as pessoas apenas tenham se cansado de nós. [risos]

Você estava cansado disso antes do fim em 1999?

Sim. Depois que o Mac saiu, era só um trabalho. Um ótimo trabalho, mas um trabalho. Foi muito triste ver o Mac ser basicamente forçado a sair por causa da sua família, o que não era culpa dele em absoluto. Ele tinha dois filhos naquela época. Eu não tenho filhos, mas se tivesse, eu não ia querer perder nenhum dia do crescimento deles. E estávamos em turnê por mais de sete meses por ano.

Há uma história no livro sobre o 500º show, e alguém diz “David deu um soco no David”, mas não diz qual David bateu. Você se lembra desse incidente?

Sim, a pessoa que disse isso estava enganada. Foi estranho termos deixado isso ali porque não aconteceu daquela maneira. David bateu num outro cara numa festa que aconteceu depois do show, mas não fui eu. O mais perto que chegamos disso foi uma vez no Arizona, quando estávamos tocando na mesma noite em que o Nirvana e o Mudhhoney estavam tocando do outro lado da cidade. Acho que eles tinham um show mais cedo, e alguns deles vieram ao nosso show. Eu estava ali curtindo com a galera e fiquei muito bêbado pra tocar -- mal conseguia parar de pé. Me lembro de ler uma crítica ao show que basicamente dizia “David Yow, você me deve 12 dólares”. No fim daquele show, eu estava meio que balbuciando no microfone e David tirou ele da minha mão. Fui pro camarim todo irritado por ele ter feito aquilo e quase entramos numa briga. Estava ficando tenso e então ambos dissemos, “Não quero brigar”. Então eu e David nunca saímos no muque. Foi mal, pessoal.

O Livro do Jesus Lizard Book está disponsível na Akashic Books e em livrarias por aí.