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Música

O Punk Tem Descaradamente Ignorado a Mulher, mas não Seria o Único Lugar Onde os Homens Podem se Emocionar?

Quando tão pouca conversa é tida entre os homens jovens, a música furiosa se apresenta como um dos poucos lugares a permitir os raros momentos de fragilidade nas letras.

O lineup do Reading and Leeds desse ano com todas as bandas masculinas tiradas.

Você precisa apenas olhar para os lineups do Download e do Reading & Leeds para ver que a música alternativa não é apenas dominada por homens, como não tem nenhuma vergonha disso. Tem muitos lugares para os caras das bandas sacudirem e gritarem enquanto meninos agressivos se enchem de porrada. E existem algumas áreas da vida moderna onde tal disparidade de gênero também continua irremediada. Não surpreendentemente, em um mundo dominado por homens, todas as mulheres da minoria feminina da cena têm uma experiência de primeira mão sobre sexismo relacionado à indústria. Ano passado, Alanna McArdle, do Joanna Gruesome, se levantou contra o mosh que ela testemunhou que machucava e colocava em risco as pessoas (particularmente mulheres) nos shows de sua banda, descrevendo a prática como um “retrocesso macho e arcaico”.

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Junto com o assédio sexual e as apalpadas, a violência e a natureza sem consentimento dos moshes são fadadas a deixar as mulheres inseguras em tais ambientes. É claro, há garotas que batem tão forte quanto recebem, batendo os crânios de roqueiros barbudos uns nos outros apenas pela diversão, mas também há mulheres e homens que acham a atmosfera de um show punk, para todas intenções e propósitos, nada diferente da cultura do macho em seu pior. Qualquer pessoa de fora que não esteja preparada para se conformar com essa bosta hipermasculina é tratada com hostilidade.

A misoginia é frequente na música em todos os níveis, do consumo à performance, do negócio ao marketing. A fundação PRS for Music relata que dos 95 mil compositores que eles representam, apenas 13% são mulheres. A pesquisa de filiação do AIM 2012 revelou que apenas 15% dos selos são majoritariamente controlados por mulheres. Mas é particularmente decepcionante que esse seja o caso na música alternativa, porque essas cenas alegam serem as mais abertas e sem preconceitos. No entanto, elas costumam ser as maiores responsáveis por isso, possivelmente como um resultado direto de sua cegueira para os problemas dentro de seus próprios grupos.

Não quero dizer que existe um lado positivo nisso, porque isso seria trivializar a questão muito mais importante do sexismo inerente à música. Mas a verdade é que a música barulhenta concede um raro espaço em que os homens que normalmente prefeririam morrer a falar sobre seus sentimentos são capazes de expor algumas emoções bem profundas em suas canções. Não é absolutamente limitado a nenhum gênero particular, mas existe algo sobre se cercar de tanta energia e ruído para que as letras confessionais sejam mais fáceis de brotar. Continua abaixo Ano passado, eu escrevi em um artigo sobre como a atitude contra a masculinidade estava literalmente matando o homem, explorando os devastadores efeitos sociais que construtos de gênero podem ter. Eu li um relatório Samaritans que concluía que, enquanto as mulheres falam sobre seus problemas, “o jeito ’saudável’ era que os homens lidassem com música ou exercício”, e notou que as maiores taxas de alcoolismo entre os homens estavam ligadas à nossa tendência à automedicação. Eu fiz a sugestão idealista, mas completamente não revolucionária, de que homens precisam aprender a se abrir e falar. Eu ainda acho que a difusão da comunicação emocional seria maneira, mas enquanto isso ainda não acontece, homens vão continuar a lidar com suas questões da mesma forma que sempre o fizeram. Como parte notável disso, como a música funciona como um mecanismo de enfrentamento? E como a masculinidade inerente a tais ambientes ajuda nisso? Foto por Carolina Faruolo

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Quando olho para a música como meio de alívio emocional, geralmente eu vou para um som caracterizado por guitarras distorcidas e vocais gritados; uma tendência superficial em relação ao estético, acima de tudo. Quer dizer, eu amo Deafheaven pra cacete, mas ouvir Sunbather pelas letras é a versão dessa década de ler a Playboy pelos seus artigos. Precisa haver alguma noção de poder à qual você pode se segurar, e esse é o mais básico conceito sonoro que só pode existir no energético e rápido; de outra forma, você correria o risco de escorregar para um estado de apatia miserável. É claro, não precisa estar ligado a nenhum gênero particular, mas se as canções são lentas e melancólicas, você claramente não vai alcançar aquela catarse. Por mais lindo que possa ser, você não consegue o mesmo efeito indo pra casa depois de um dia de merda e colocando pra tocar o disco do Grouper Dragging A Dead Deer Up A Hill.

Existe um verdadeiro sentido de catarse em música barulhenta e nervosa, que gostando ou não, é ligado muito fortemente à masculinidade, particularmente em performances vocais. Se um homem está fazendo ruídos como Damian do Fucked Up faz, é visto como algo bem poderoso. Se uma mulher entrega alguma raiva em seus vocais, ela pode ter a certeza de saber que os críticos vão achá-la esganiçada e emocional demais, e será encorajada a evitar qualquer coisa nessa linha. Enquanto algumas conseguem popularidade (Meredith Graves, da Perfect Pussy, é um bom exemplo), mulheres que gritam ou berram em sua música apenas não tendem a ganhar o mesmo reconhecimento que os homens que fazem o mesmo, e então, por associação, isso vira algo percebido como muito masculino.

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Alguns meses atrás, eu estava ouvindo

The Monitor

, um segundo disco muito bom de Titus Andronicus, uma banda muito boa. 20 minutos no disco e eu comecei a sentir a inequívoca sensação daquela primeira gloriosa cerveja uma sexta-feira à noite correndo pelas minhas veias até o meu cérebro, uma leve tontura e queda das inibições. Dado o fato que eu não estava bebendo, isso provavelmente deveria causar preocupação, e sob diferentes circunstâncias, eu provavelmente seria convencido pelo Doutor Google que eu estava definitivamente tendo um derrame e vários tipos de câncer.

Mas havia uma familiaridade no sentimento que me disse que eu estava bem. Apertar play pro The Monitor já esteve relacionado tantas vezes antes a abrir uma latinha que a tonteira fantasma pode muito facilmente ser atribuída ao clássico caso do condicionamento. Essencialmente, eu me tornei uma versão putaraça, despenteada, adulta, humana e masculina do cachorro de Pavlov, que colocado dessa forma parece bem maneiro. Eu não estava preocupado com as questões profundas do meu relacionamento com o álcool (estou guardando qualquer noção de auto-aperfeiçoamento para quando eu fizer 40 anos), mas eu me perguntei como o álbum se tornou tão próximo ao ato de beber.

Isso pode ser traçado, eu concluí, ao período da minha vida quando eu trabalhava em um emprego de verdade em um escritório e lidava com toda a merda associada a trabalhar em um emprego de verdade em um escritório. Em dias estressantes, eu voltava para casa passando pelo mercadinho da esquina, colocava o disco bem alto e bebia e gritava junto com ele até eu não estar mais tão puto da vida. Durante os últimos cinco anos desde seu lançamento, The Monitor tem sido meu álbum a ouvir quando eu preciso de catarse, e eu não sei se é um indicativo da música mesma ou do meu estado mental horrível que esse é o disco mais tocado da minha coleção. De qualquer forma, essa coisa toda parece providenciar um bom tanto de munição para o ponto do Samaritans sobre como homens encontram consolo em álcool e música. Foto por Carolina Faruolo

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Como eu coloquei, a música em si carrega muito poder, mas bandas como Titus Andronicus são muito mais vitais por suas letras. A escrita é uma saída para o escritor, certamente, mas mais que isso, é um salva-vidas para o ouvinte. Foi o som de The Monitor que me atraiu, mas as palavras de Patrick Stickles são o que tornaram o disco tão notável e duradouro. Ele aborda temas de emasculação, autodestruição, doença mental e medicação, e um sentimento geral de falta de valor próprio com uma honestidade tão brutal que evita o que poderia facilmente mergulhar no melodrama. Ele até enfrenta a dificuldade da comunicação e a evasão da conversa em favor da bebedeira (“So let's get fucked up, and let's pretend we're all okay / If you've got something that you can't live with save it for another day”).

A chave aqui é o poder da identificação. Para homens, as poucas conversas são tidas entre amigos, particularmente na adolescência e no começo dos 20 anos. Eles lutam sozinhos, não percebendo que os mais próximos a eles estão tendo problemas similares, que eles quase certamente estão tendo porque para ser bem honesto a juventude é meio bosta para a maioria das pessoas de alguma forma. Mas se você ainda não entrou em termos com isso, a música traz um consolo porque muito do que é realmente bom é centrado em se sentir um pouco fodido.

Um álbum como The Monitor, baseado livremente em torno da Guerra Civil Americana e documentando uma pequena cidade de Nova Jersey, não tem identificação ostensiva com nenhum moleque de Loughborough - mas existe certa universalidade nas letras que as diferenças culturais e geográficas apenas servem para chamar atenção ao fato de que qualquer um, em qualquer lugar, pode se sentir dessa forma. Não pode substituir a mera conversa como um meio de lidar com os seus problemas, mas pode fazer você se sentir longe de sozinho: e às vezes pode ser tudo o que você precisa para fazer a vida boa o bastante para continuar.

Em um mundo ideal, a masculinidade como um construto social não existiria, e nós poderiamos ter uma industria musical que fosse uma bosta para pelo menos metade da população. Talvez consigamos chegar lá algum dia. Mas enquanto isso, se essa merda machona esta salvando algumas vidas, então eu acho que pelo menos por alguma coisa podemos ser gratos.

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O Noisey UK está celebrando o melhor do punk, emo e hardcore na nova séria editorial Punk In Love. Siga todo o conteúdo aqui. Tradução: Pedro Moreira