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Música

Perguntamos a John Carpenter (Quase) Tudo Sobre Sua Carreira

Carpenter é um diretor que também escreve, produz e compõe. Ele é o mais próximo possível do faça-você-mesmo que um diretor de Hollywood pode ser.

Apesar do fato de que essencialmente trata-se de uma variação de três notas, o tema principal de

Halloween,

de John Carpenter, é uma das canções mais assustadoras e contagiantes já criadas. É por meio desta obra que Michael Myers e o clima terrível do filme nascem. Nos quase 40 anos desde a sua primeira aparição, a trilha só ganhou mais apreço por parte da crítica. Kevin Bergeron, co-proprietário da Waxwork Records, especializadas em relançamentos de trilhas de filmes de terror em LPs, captura a natureza transcendental da faixa, “sempre que a escuto [a trilha de

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Halloween

] volto imediatamente à infância. Ela gruda em você. É reconhecida instantaneamente”. Kevin vai mais fundo e afirma que John Carpenter é o “punk rocker entre os diretores de filme de terror”, e ao passo em que adaptar a ideologia punk para não-punks tenha se tornado um clichê, sua observação é sólida. Carpenter é um diretor que lida – em muitos de seus filmes – com todos os aspectos da produção: escreve, produz, dirige e compõe. Ele é o mais próximo possível do faça-você-mesmo que um diretor de Hollywood pode ser.

A importância de Carpenter enquanto compositor não pode ser ignorada, e graças a ressurgimento do interesse por discos de vinil , seu trabalho encontrou um novo – bem, ao menos reformado – lar. Começando a o relançamento de Fuga de Nova Iorque, oito das trilhas do diretor foram relançadas em vinil. A Deathwaltz Recording Company é responsável por sete dos oito lançamentos (o oitavo sendo Halloween, em outubro passado, pela Mondo), dando início a um mercado em rápida expansão de lançamentos de trilhas neste formato. Para Spencer Hickman, dono da Deathwaltz, o trabalho de Carpenter é dinâmico. “[John] pegou o que havia de comum e experimentou com ele para criar algo que poucos compositores e músicos eletrônicos chegaram perto de fazer. A obra de John esteve presente em minha vida inteira e fico absolutamente honrado em… ter trabalhado com ele para os relançamentos definitivos de tantos clássicos”.

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Ao lado de seu colaborador, Alan Howarth, o uso que Carpenter faz de teclados modernos e sintetizadores ajudou a romper com a tradição. Em uma época em que as trilhas sonoras eram orquestradas e derivativas ou felizes e com toques de jazz, os assaltos aurais eletrônicos de John se destacaram. E ao passo em que Carpenter deve muito a suas próprias influências, Sebastiaan Putseys, fundador da One Way Static Records, denota o papel de Carpenter na composição e para a cena eletrônica. “A geração atual de compositores de trilhas (e mesmo da música eletrônica enquanto gênero) devem muito à Carpenter e Howarth. Vejo a referência ‘para fãs de Carpenter’ pulando em muitas biografias e entrevistas de bandas”.

Tivemos a oportunidade de fazer algumas perguntas a John sobre sua carreira, seu trabalho em especial e sua opinião sobre a volta da popularidade de discos de vinil.

Antes de começar a trabalhar compondo trilhas, qual era seu histórico musical? Outras trilhas te influenciaram no começo?
John: Meu pai se especializou em violino clássico e era professor de música. Cresci cercado por música, que estava ao meu redor o tempo inteiro a e a ouvia o tempo inteiro. Foi natural. Simplesmente se tornou parte de minha vida; nunca pensei muito sobre isso. Eu adorava trilhas. Amava músicas de filmes, mas também adorava música clássica e rock’n’roll. Foi fácil pra mim, essencialmente, começar a mexer com música. Não tive dificuldades; não era nada absurdo. Só incorporei Bernard Herrmann e segui em frente.

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Você começou no piano?
Meu pai, infelizmente, pôs na cabeça que eu deveria experimentar o violino. A parte infeliz é que eu não tinha talento algum, literalmente. Não era capaz de tocar. Foi tudo muito, muito triste. Então, toquei um pouco de violino. Aí veio o piano. E depois a guitarra, e saí bisbilhotando tudo. Mas meus dias de piano acabaram, ainda bem.

Você começou a tocar sintetizadores no Ensino Médio?
Entrei em uma banda de rock no Ensino Médio e então até a faculdade. Foi aí que comecei a mexer com guitarras e baixos. Não lembro quando me apaixonei pelos sintetizadores. Eles começaram a surgir, de levinho, em meados dos anos 60. Foi aí que os ouvi pela primeira vez e pensei “uau, o que é isso? Tem potencial pra algo aqui”. Entrei de cabeça neles nos anos 70.

No começo, a decisão de compôr suas próprias obras foi puramente econômica?
Com certeza. Não tínhamos dinheiro pra pagar uma trilha. Eu era barato. Eu era rápido. Encontrei alguém que tinha esse equipamento bastante primitivo, extremamente primitivo. Então gravei lá, e tínhamos a trilha. Foram… ah nem sei quantas semanas de trabalho; eu era um novato. Só fui seguindo o som e como ele se aplicava ao filme.

Ouvi dizer que você fazia a trilha ao vivo acompanhando o filme, é verdade?
Na verdade, as coisas ficaram assim. Antigamente não tínhamos a sofisticação de juntar filme e som. Então eu tocava. Comecei [a acompanhar os filmes] acho que em Fuga de Nova Iorque. Aquele foi meu primeiro filme, tocando junto da imagem.

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O processo de compôr uma canção parece diferente do de se criar uma trilha. Você poderia me falar do seu pensamento ao criar uma trilha, do conceito à execução?
Uau. Poxa, odeio te desapontar, mas não há muito o que se pensar. O processo é meio que automático; ficou assim depois de um tempo. Eu conhecia o filme porque o dirigi, e às vezes porque o escrevi. Não tinha nenhuma ideia de como deveria ser a trilha. Eu chegava lá com a mente em branco. Meio que um novo início, era empolgante. Empolgante porque você não precisava se preocupar se tinha algo bom. Você tentaria e seguiria dali em diante. Ocasionalmente, eu já tinha um tema principal ou um esboço de algo que fiz em casa, que experimentaria. Ocasionalmente. Mas na maior parte do tempo era só improviso.

Suas trilhas dão a impressão de serem álbuns completos que alguém gostaria de ouvir separado do filme. Você sempre cria as faixas restantes a partir do tema principal?
Depende, não necessariamente. No caso de O Príncipe das Sombras foi assim, porque começamos a gravar logo de cara. Por sorte, o tema saiu bem bom. Tenho muito orgulho daquele tema de abertura. Então pude emprestar algo dele e reutilizar ao longo da trilha, ela era bem unificada, mas nem sempre isso funciona.

A trilha acentua a pegada lenta e sinistra do filme perfeitamente.
Acredito que o propósito das trilhas é acentuar a história; o que o espectador vê na tela. Esse é o seu trabalho, fazer isso fluir e de forma melhor, se possível.

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Você tem alguma história de terror relacionada ao trabalhar nestas trilhas?
Claro, mas a maioria é só cansaço [risos]. Sabe, isso é difícil de se fazer. Percebi isso depois de minha última grande trilha, acho que foi Fantasmas de Marte, pensei “cara, isso é complicado, esse negócio tá me matando”.

Eu imagino. É complicado o bastante compôr uma música, quanto mais um filme inteiro.
É esse o problema. Isso te põe pra baixo. Todos os dias você está trabalhando naquilo. Agora, se você ama compôr, é divertido. Mas ah, nem sei, é muito difícil. É muito complicado fazer tudo. Quando eu era jovem era tudo fácil e divertido, hoje é difícil.

Então você vai parar por aqui?
Nunca diga nunca neste negócio [risos].

Caso quisesse trabalhar com trilhas de novo você estaria mais inclinado a trabalhar no filme de alguém ou sempre seria pra você mesmo?
Ah, eu poderia fazer ambos. Tenho trabalhado com meu filho por estes tempos, não com trilhas, mas música mesmo. Adoro trabalhar com ele; um rapaz muito talentoso. Mas claro, faria trilhas para filmes de outras pessoas, isso seria divertido.

O projeto do filho de John Carpenter se chama Ludrium.

Gostaria de falar sobre o seu trabalho colaborativo com o Alan Howarth. Como isso começou a rolar? Vocês já se conheciam antes de trabalharem juntos?
Conheci Alan através do editor de Fuga de Nova Iorque. Ele fazia efeitos sonoros e tinha um sintetizador. Ele entendia de som e queria criar música; então foi exatamente isso que aconteceu. Antes de me dar bem com os sintetizadores, como hoje, ele trazia o som, programava algumas coisas e tinha um belo equipamento, o que tornou as coisas mais fáceis.

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Então ele era o engenheiro de som nos seus discos. Ele chegou a compor algo?
Alan não compôs nada.

Em O Enigma de Outro Mundo, mais uma vez a trilha foi feita por meio de colaboração. Ou acho que devo dizer que pela primeira vez um compositor fez a trilha de seu filme. Como foi trabalhar com Ennio Morricone? Que decisões levaram a isso?
O estúdio não deixou que eu fizesse a trilha. Nunca pensaram nisso, nunca perguntei, e ele estava disponível. Ennio é simplesmente um compositor incrível. Adorei; era um homem maravilhoso. Não falávamos a mesma língua, então precisávamos de intérpretes, mas foi ótimo, ele fez um ótimo trabalho.

Agora falando de equipamento: tem algum sintetizador em especial que seja seu favorito, um antigo Prophet ou outro Sequential Circuits?
Bem, nutro certo carinho por alguns sintetizadores modernos. Eu tenho um Korg Triton, que eu adoro; tem um som incrível. Não tenho necessariamente nenhum sentimento nostálgico por nenhum sintetizador antigo, mas devo mencionar que o Oberheim tem um tremendo som, simplesmente fabuloso.

Como a evolução tecnológica e as implicações do digital na música afetaram a sua carreira musical?
Só facilitaram as coisas. Sim, há muito mais nas suas mãos do que antes. É sensacional. É uma ótima época para a música e para a tecnologia como um todo. Não dá pra pedir mais que isso.

Minha esposa me disse algo muito verdadeiro: “adapte-se ou morra”. Você tem que abraçar o mundo moderno. As coisas mudaram, umas pra melhor, outras não. Mas os prós, em termos sonoros, da tecnologia atual, são incríveis. É como quando saímos dos laserdiscs para os DVDs, as diferenças são inacreditáveis. E agora, com o Blu-ray, é tudo mais inacreditável ainda.

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Parece haver um ressurgimento na comunidade dos discos de vinil em torno de trilhas sonoras. Tenho certeza de que você conhece a Deathwaltz, que recentemente relançou alguns de seus trabalhos colaborativos com Alan. Foi uma surpresa saber que existe tanto interesse em trilhas neste formato?
Bem, eu não sabia de nada. Você tem que entender algo a respeito de minha carreira: ninguém me conta nada. Eu não fazia ideia de nada disso.

Quando você soube?
Comecei a reclamar do fato de ninguém me dizer nada, então o chefe da Deathwaltz me perguntou se gostaria de escrever as notas que acompanham o disco e eu disse “sim, acho que sim”. Mas ninguém me falou nada, ninguém me perguntou nada.

É de se imaginar que mesmo que não tivessem que falar diretamente com você para obter os direitos, ao menos te deixariam saber que tem alguém interessado em lançar seu trabalho, que alguém te contaria.
Você esperaria, não? Mas ninguém me fala nada.

Você já fez shows ou consideraria fazê-lo?
Eu pensaria a respeito, com certeza, mas, ah, seria difícil.

Quais seus planos imediatos? Você está trabalhando em algum novo projeto?
Sim, estou trabalhando em algumas coisas, mas agora mesmo estou me recuperando de dois anos de cirurgias nos olhos, foram muitas complicações, mas agora estou bem.

Joe Yanick tem esperanças para outra trilha de John Carpenter. Siga-o no Twitter - @JoeYanick.