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Música

O Paraíso Desconfortável De La Roux

Elly Jackson quer esquecer o passado e focar em seu novo trabalho electro-pop, o 'Trouble in Paradise'.

Um choque percorreu meu corpo quando li a manchete: a La Roux tinha voltado? Cinco anos atrás, Elly Jackson e Ben Langmaid trouxeram o seu britpop gélido para os Estados Unidos, arrecadando Grammys e colaboradores importantes como Kanye West para o álbum de estreia autointitulado deles. E depois… Nada. Nenhum disco foi lançado, nenhuma música vazou na internet. Em vez disso, surgiram notícias de que Elly havia perdido a sua penetrante voz de soprano devido à ansiedade e ao excesso de shows, e isso sem falar na decisão de Ben de deixar a banda (eles se separaram em 2012). Todo mundo esperava que a dupla fosse capitalizar em cima daquele sucesso estrondoso, mas a fama parecia levá-los para outra direção. Eles se separaram.

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Elly finalmente lançou um novo disco, adequadamente intitulado Trouble In Paradise, e não surpreende que ele seja uma espécie de reviravolta artística em comparação ao poder explosivo de "Bulletproof" e "In For The Kill". Ainda é essencialmente electro-pop, mas o falsete dela está mais suave, e a música cheia de agitação tropical e subtons de calypso, dancehall e ragga. Parte disto vem de Elly, mas algumas dessas influências podem ser creditadas a Ian Sherwin, engenheiro de som e novo colaborador dela.

Quando pergunto a Elly se ela trabalharia de novo com Ben, ela responde: "Definitivamente, não". Ela não quer falar sobre Ben, virou a página e quer conversar sobre a música, a atmosfera dela. Estou sentindo uma forte vibe Dirty Dancing neste disco novo um assunto de que falamos em profundidade além da vulgaridade do pop moderno sexualizado e como ela lidou com a ansiedade e a evolução do estilo andrógino que é a marca dela.

Noisey: Este disco tem uma temática bem forte. Quais foram as inspirações para o som e os conceitos de paraíso e confusão?
Elly Jackson:O título do álbum veio de "Tropical Chancer". É o maior dos problemas no dilema do paraíso um cara precisa fugir de um lugar que consideraríamos um paraíso ­­ o que acontece muito em lugares onde vamos passar um feriado ou as férias. Achamos o lugar encantador, mas muitas pessoas ali estão incomodadas com o turismo. Mesmo que saibam que precisam dele, só o querem mesmo para que possam sair e buscar uma vida melhor para elas. Mas além disso, o aspecto ensolarado do disco foi se tornando cada vez mais importante. Também tem a ver com a atmosfera algo bonito e reflexivo tem algo que não parece certo ali. Eu queria um paraíso na capa, mas tinha que ser um paraíso desconfortável, um paraíso que você não tem certeza se quer estar ali ou não, mas que seja bonito de se olhar.

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Adoro a ideia de um lugar que não é exatamente um paraíso. Mas a ternura de "Paradise Is You" me chamou mais a atenção do que qualquer outra música do disco. Você pode falar do processo por trás dela?
Essa apareceu bem no começo. Era só uma música ao piano que eu tinha feito em casa. Ben e eu falávamos sobre os parques aquáticos para onde os ingleses vão nos feriados e sempre acabávamos em uma frase que talvez estivesse num folheto. É só uma música muito sincera sobre como eu me sinto em relação a uma pessoa em particular.

Esta é uma das poucas músicas que tem uma pegada mais sentimental, o resto do disco tem um som muito diferente.
Ian trouxe as influências de dub. Ele cresceu dançando ao som de muito jungle e dub, coisas assim. Eu sempre adorei ragga, reggae e dancehall, e ele trouxe um pouco mais disso para o disco. Ele apontou as referências de dub no The Clash, e como eles as incorporaram à sua maneira. Nós começamos a curtir muito Dillinger e King Tubby. Obviamente tem toda essa temática de paraíso, mas também um pouco de confusão, dub pode ser um pouco problemático.

Há algumas referências a sexo no disco, o que você acha da relação entre sexualidade e música pop?
Eu acho bastante vulgar a maneira como as pessoas são sexualizadas no mundo da música. A melhor maneira de você se expressar é fazer isto através da sua arte, e eu queria muito falar sobre o atrevimento do sexo, ou do lado mais divertido dele, sem ser vulgar ou entediante. Fazer uma música que soe sexy em vez de falar sobre sexo. Acho que isso é algo de que Ian, eu e muita gente sente falta na música. Não do que a música fala, mas do jeito que ela faz você se sentir. Como a parte mais sexual de uma música é a ponte, em que a música se torna bastante sexual e melancólica ao mesmo tempo ela faz você se sentir desejado. Esse é o tipo de sexualidade que eu quero passar com este disco. Nós tentamos fazê-lo o mais sexy possível musicalmente. É esquisito. Acho muito estranho o jeito que as pessoas passaram a ver este disco, que elas pensem que é um disco sobre sexo, apesar de ele ser musicalmente, não é em termos de temática. Tem muitas coisas diferentes no disco.

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Nem digo musicalmente, mas escutando o disco, me lembrava o tempo todo de Flashdance e Dirty Dancing, porque esses dois filmes me passam essa sensação: são bonitos, mas tem alguma coisa errada. Até Dirty Dancing - eles estão nesta espécie de paraíso, mas tem coisas terríveis escondidas ali.
Sim, pense na cena da briga! Gosto dessa comparação. Toda mulher de uma certa idade tem uma queda por Dirty Dancing, mesmo que não considere assisti-lo num sábado à noite. Acho que é a trilha sonora, tem umas três ou quatro músicas terríveis ali tem aquela sobre ela ser o vento na minha árvore, que é horrível mesmo mas aquela trilha sonora também tem músicas brilhantes. "Stay"? É genial! É isso que torna o filme muito mais legal.

Isso mesmo! Esses filmes também são ótimos por causa das roupas, então vamos falar do seu estilo, que incorpora a androginia de uma forma incrível. Quando você começou a gostar desse estilo? Ele me lembra de Katharine Hepburn porque é poderoso, mas também tem toques femininos.
Demorei muito tempo para aceitá-lo de verdade, e as pessoas falam disso como se fosse uma escolha. Certamente não é uma escolha. Eu nem ao menos sabia o que androginia significava até alguém me dizer. Eu só queria usar roupas loucas. Teve alguns momentos na minha vida em que eu tive coragem de usar, outros não. Acho que eu só fui aceitá-lo mesmo depois dos 17 anos. Quando fui para a faculdade e não tinha uniforme foi quando eu saí da minha concha e comecei a descobrir o tipo de roupa que eu gosto de usar, e isso demorou um pouco. Comprava roupas que eu achava que gostava e elas pareciam muito de menino, ou comprava roupas que eu achava que gostava e elas pareciam muito femininas. Levou bastante tempo até eu descobrir as roupas com que eu me sinto eu mesma. Até se o meu cabelo não está de um certo jeito, eu literalmente não me sinto eu mesma.

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Bem, essa era outra coisa que eu ia te perguntar - do seu cabelo! Tudo que eu leio sobre você começa com o seu cabelo, as pessoas adoram falar sobre ele.
Eu sei. É hilário!

Quando você começou a usá-lo assim?
Quando cortei o meu cabelo, pensei: "Agora faz sentido". Eu tinha cabelo comprido, não é pra menos que me sentia esquisita! Eu só achava que ficaria estranha cortando o cabelo, mas sempre quis ter cabelo curto, desde pequena. Eu gostava da ideia de acordar e não ter que cuidar daquele cabelão, e não combinava comigo também. Eu fiquei tão de saco cheio do meu cabelo comprido um dia que finalmente disse: "Vou cortar tudo". Depois disso, obviamente porque eu gostava de muitas bandas dos anos 80, a progressão natural, a partir dali, foi brincar com o meu cabelo, e eu gostei de como mudar o meu cabelo fazia a minha cabeça parecer completamente diferente. Só queria ter um corte de cabelo que ninguém mais tinha.

Você também falou sobre perder a sua voz e a sua luta contra a ansiedade. Você acha que essas duas coisas estão diretamente relacionadas? Você acha que se livrou daquilo que provocava a ansiedade?
Elas definitivamente estão ligadas. No fim das contas não havia nada de errado com a minha voz, fisicamente, só tinha parado de funcionar direito sabe-se lá por que. Era o meu corpo entrando em greve, de certa forma.

Sei que você e Ben não têm uma boa relação. Você vê isso se resolvendo algum dia?
Não, definitivamente não.

Então como aconteceu isso de você trabalhar mais com Ian?
Já trabalhávamos todos juntos. Ele era o nosso engenheiro de som no primeiro disco, não desde o começo, mas estava lá em muitas sessões. Ben e eu, nós o adorávamos e achávamos que ele era incrível no que fazia. Algumas das minhas partes preferidas do primeiro disco nós fizemos com Ian. Ele é um engenheiro brilhante e entendia a minha voz muito bem. Queríamos trabalhar com ele de novo. Ele chegou mesmo a abandonar um projeto em que estava trabalhando com o My Bloody Valentine para trabalhar com a gente, o que foi super bacana. O disco que começamos a fazer se tornou algo que eu achei que Ian compreendia melhor do que Ben, e isso se tornou uma situação difícil. Não é uma discussão pública de forma alguma, e não deve ser. É muito triste que o disco que passamos dois anos fazendo seja focado nisso de alguma forma. O foco devia ser a música.

Como se sente lançando um disco depois de tanto tempo desde o seu álbum de estreia?
Não acho que eu poderia ter voltado a tocar ao vivo ou mesmo finalizado os vocais do disco se não tivesse resolvido a minha ansiedade. Eu precisava ter certeza de que o meu corpo e a minha mente não poderiam fazer isso comigo de novo. Levou bastante tempo até chegar num ponto onde eu tivesse certeza suficiente de que isso nunca aconteceria de novo. Mas também percebi que não era só algo psicológico. O agendamento da turnê não foi planejado para o tipo de voz que eu tinha e o tanto que eu cantava no primeiro disco era exaustivo. A quantidade de falsetes que eu tinha que fazer toda noite… Se você falar com qualquer preparador vocal, ele vai dizer: "É, se você canta tanto, não vai funcionar". A voz é a coisa mais importante. Eu bati o pé várias vezes. Sou boa nisso.

Caitlin – como toda menina – assistiu a Dirty Dancing umas 432 vezes (provavelmente), mas estranhamente ela não gosta muito de dançar. Ela está no Twitter - @harmonicait.

Tradução: Fernanda Botta