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O Zeca levou-me pela primeira vez a um peep show

O mais importante é que os clientes tenham prazer.

Provavelmente já passaste pelo Arco da Bandeira, em Lisboa. Se ignoraste a primeira casa à direita (para quem vem da praça D. Pedro IV), ignoraste também o mundo que está por detrás das grossas cortinas de borracha vermelha. “Sejam bem-vindos à Sexylândia. É assim que damos início a mais uma roda viva de modelos até às 23 horas. Para começar, não poderíamos ter melhor escolha do que a top model seis, a presença de… Petraaa! Espectacular a presença de Petrrrrra, number sixxxx.” É assim que, logo pela manhã, José Carlos — Zeca para amigos — anuncia a abertura da Sexylândia. Foi por um triz que não apanhei a Petra, a artista que mais queria ver. Mesmo assim, pus a minha moedinha (dois euros por dois minutos). Apanhei o show da Jade e depois o da Christy. Não pensem que só por terem visto porno na net que a coisa não vos vai afectar. Como não ia preparado, suei um bocado e acabei cá atrás, colado à porta da cabine. Pode ser uma experiência intensa. Se precisarem, têm lenços de papel. No total, são 17 cabines (nos números ímpares podem ser vistos, nos números pares não). Foi o próprio Zeca quem me fez uma visita guiada pelo espaço. Este cabo-verdiano trabalha no peep show há cerca de 18 anos. Começou como cliente há 20. Como “trabalhava de noite”, tinha os dias para visitar o espaço, “pôr umas moedinhas” e ver um “show erótico”. Hoje, lembra com saudade os primeiros anos de uma “casa extraordinária”, onde trabalhavam sobretudo modelos de leste. Há quase duas décadas que este Zeca é um multifunções: além de coordenar as operações, também limpa as cabines, encaminha os clientes e vende produtos variados (dildos, lubrificantes, ou até estimulantes para a tesão). Num dado momento, pode ser o speaker de serviço (lugar em tempos ocupado por Sá Leão) e no momento seguinte está a recolher os lenços de papel usados que os clientes deixam nas cabines (alguém tem de o fazer). A história do peep show mais antigo do país é facilmente resumível. Na década de 80, aquele foi o espaço do Animatógrafo. Começou por exibir westerns e filmes de artes marciais. A partir da década de 90, surgiram outras coboiadas e o espaço começou a exibir filmes pornográficos. Daí ao peep show foi um pequeno passo. Quando inaugurou, “foi uma enchente” e assim se manteve durante mais uma década. Foram dez anos “diabólicos". Naquela altura, às dez da manhã já havia filas à porta. Chegaram a ser lançados ali filmes pornográficos com actrizes internacionais que distribuíam autógrafos pelos fãs. Uma realidade impensável para os dias de hoje, se tivermos em conta que “os filmes já não se vendem como se vendiam e que as produtoras de filmes hardcore têm os dias contados”. Mesmo assim, para agradar a um público que “não tem paciência para ir à net”, ainda se mantêm oito vídeo-cabines que exibem, claro, filmes porno. É este o principal problema: é a internet que estraga o negócio dos dois únicos peeps do país (ambos em Lisboa). Hoje em dia, “basta ir à net e escrever 'mulheres mamalhudas' ou 'mulheres com grandes rabos'”. Para além de o acesso ser gratuito e instantâneo, não há nos jovens de hoje “uma perspectiva ou entusiasmo” pelo sexo real. Hoje, tudo mudou. Actualmente, tanto o Sexylândia como o país, estão “a empurrar com a barriga”. O negócio mantém-se sobretudo com as gerações mais antigas que agora estão acima dos 35 anos e que permaneceram fiéis à casa. A clientela continua diversificada e é perfeitamente normal encontrarmos trolhas ao lado de “bancários, empresários ou até políticos”. O Zeca em pleno expediente. Em alturas específicas, pode haver sexo ao vivo. Neste momento, o garanhão chama-se Tony e actua às quatro, às cinco e às seis, o que nem é espectacular, se tivermos em conta que por aqui já passou um homem com “uma verga enorme" que "dava uma de hora em hora, das 13 até às 22, sempre sem vir”, garante o Zeca. Ainda hoje se diz que foi o melhor show que por lá passou. Todos os espectáculos são feitos com modelos que já estão no circuito ou que se ofereceram para dançar pela primeira vez. Antigamente, a casa recebia muitas propostas de fora. As miúdas vinham “naquela viagem de carrinha”, da Hungria ou da República Checa. Hoje em dia, com a integração na UE, os destinos multiplicaram-se e há países, como a Áustria ou a Bélgica, em que se ganha mais, mas onde acabam por ter um horário mais duro, já para não dizer que “se arriscam ser mal tratadas”. No Sexylândia, como na generalidade do país, o salário pode ser modesto, mas o Zeca orgulha-se de dizer que “são trabalhadoras iguais” a todos os outros funcionários. Há 20 anos a trabalhar na casa, o Zeca já viu muitas modelos. Se há alguém que pode falar com propriedade sobre as diferenças entre as modelos é ele, nem que seja porque, como ele próprio diz, “o padeiro faz pão, mas também come pão”. As miúdas de leste são mais desconfiadas. Não é fácil convencê-las, mas também são mulheres muito femininas e “só depois de algum tempo com as brasileiras é que começam a ganhar aquele gostinho da safadeza”. As brasileiras são mulheres “simpáticas, quentes, atiradiças, mais safadas”. É isso que as distingue e os clientes adoram-nas. É por isso que a nível de entretenimento estão no top. As portuguesas estão, cada vez mais, a entrar na roda. O sucesso é variável. Algumas parecem ensinadas, “saem de pára-quedas e são impecáveis”. Outras, levam muito tempo. Infelizmente, embora a oferta se tenha diversificado bastante, não é viável do ponto de vista financeiro ter mestiçagem na oferta das modelos. O mais importante é que tenham uma lingerie bonita, as unhas pintadas e o cabelo arranjado. No fundo, que tenham “um ar fino” para agradar aos clientes. A tendência actual passa por apresentar uma mulher que esteja ao alcance do cliente, uma mulher com barriguinha, peito normal. As mulheres com quase dois metros e silicone, boas dançarinas, podem muito bem não fazer sucesso porque, aos olhos do cliente, pode parecer mais artificial, uma “mulher montada”. De uma maneira ou de outra, “não pode ser muito pelada”. Os pêlos púbicos são muito importantes e o homem português “gosta de ver um pelinho”. E atenção que este interesse não é de todo descabido: há histórias de clientes que se apaixonaram e levaram bailarinas. Depois das cabines gerais, o cliente vai às privadas, a solo, e introduz cinco euros, escolhendo a modelo pelo número. Aqui, a totalidade do valor que os clientes despendem vai para as modelos, a menos que ela queira dar uma borla. Privado é privado, há negociação, pode acontecer um pouco de tudo, mesmo sexo — as regras impedem que isso aconteça, mas nunca se sabe o que por lá se faz. E, façam o que fizerem, o mais importante é que os clientes tenham prazer. Fotografia por Nuno Barroso