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O Banksy comprou a casa da minha família

E matou muitas ovelhas.

'Maid in London', de Banksy. Imagem via Miquel C.

"Quem é o Banksy?" uma pergunta que provavelmente já fizeste quando o Facebook te lembra que ele existe, este gajo devia estar na nota de 20 libras, ou dar nome ao aeroporto de Bristol ou qualquer coisa assim. E a resposta é a seguinte: Banksy foi o gajo que comprou a casa da minha família e as minhas ovelhas de estimação. Apesar desta não ser a melhor história do mundo, deve ser provavelmente o mais interessante que eu te posso contar sobre mim – se ele tivesse comprado a tua casa e as tuas ovelhas, não me venhas dizer que também não ias por aí a contar a toda a gente.

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O primeiro pensamento que te vem à cabeça é: 'Então tu és muito rica, porque o Banksy é muito rico. Por que raios iria o Banksy comprar uma casa pobre?'. É uma suposição justa. Mas, parafraseando Steven Segal em A Força em Alerta 2, "as suposições são as mães de todas as merdas", e talvez por isso ninguém saiba quem é ele ou por onde anda – menos eu. Porque o Banksy não é um idiota. Ele não mora num apartamento luxuoso ou num condomínio fechado. Ele não se senta num iate em Cannes a alimentar as gaivotas com bocadinhos de pão. Ele muda-se constantemente e fica em casas pequenas e acessíveis: casas como a minha, casas onde finalmente pode retirar o lenço manchado de tinta da cara e lavá-lo no lava-louça Bosh que deixámos para trás quando vendemos a nossa casa, e assim tem liberdade suficiente para contar as suas pilhas de dinheiro em voz alta.

O Banksy veio a nossa casa pela primeira vez há dez anos atrás. A nossa casinha com tecto de palha ficava numa vila de um pequeno condado de Inglaterra. Este sítio não se vê desde a estrada e não tem vizinhos. E, apesar disso tornar as longas noites de inverno especialmente pouco relaxantes, é um local ideal para um, mundialmente famoso, mestre criativo anónimo.

Apareceu muita de gente para ver a casa. Uma mulher simpática, numa cadeira de rodas, mas como não tinha forma de chegar ao segundo andar, foi-se embora. Depois do almoço, um casal normal chegou num carro ainda mais normal e entrou dentro de casa. O homem, que era o Sr.Banksy, não chamava especialmente a atenção, a não ser por ser alto e vestir-se de preto. Também tinha um boné de basebol que lhe tapava metade do rosto. Isso devia ter disparado todos os alarmes, porque claramente demonstra um nível BND de espionagem social, mas olha, nós não reparámos.

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Ficámos todos na cozinha um bom bocado a encher chouriços. Como somos britânicos, a conversa foi tipicamente pomposa, mas, cada vez que minha mãe lhe perguntava alguma coisa, ele encolhia os ombros e olhava para a esposa, então a Sra. Banksy respondia por ele. Ela era muito simpática, faladora e charmosa. Quando a minha mãe lhe ofereceu uma chávena de chá, o Sr.Banksy andava às voltas e só dizia coisas como "hum" e "não". Para ser honesta, ele transmitia-me uma vibração estranha, até que a esposa explicou-nos que ele era o "criativo", o artista que – wait for it – tinha feito as cabeças douradas gigantes dos prémios Bafta. E era por isso que ele queria a casa, porque tinha um pequeno celeiro no fundo, ideal para construir cabeças douradas gigantes. Temos de admitir que foi uma óptima desculpa.

Naquele momento não nos ocorreu que ele pudesse estar a mentir então, enquanto a minha mãe ouvia o que deve ter sido uma descrição de merda sobre colar folhas de ouro, eles faziam-nos perguntas sobre a caldeira, os azulejos e se podiam comprar as cortinas. Vejam só, essa foi a única coisa estranha daquela tarde: eles disseram-nos que queriam comprar tudo e que estavam dispostos a pagar. As cortinas, a porcelana, os móveis, e até as quatro galinhas e 16 ovelhas de estimação que tínhamos no campo. Tipo, tudo. Porque devias saber isto sobre o Banksy: o homem tem um estilo de vida muito particular. E, fora a "fase do stencil" nos anos 90, a minha mãe tinha passado a maior parte da sua vida a construir exactamente este estilo de vida.

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A obra 'Sirens of the Lambs', de Banksy, que encaixa perfeitamente na conversa sobre as ovelhas.

Eles foram embora, a minha mãe fez as contas e decidiu que eles eram a aposta certa. Ela concordou em deixar os animais, mas não o sofá, o que só pode significar que o Banksy gosta muito de animais ou que então os ideais éticos da minha mãe estavam meio defeituosos.

Vendemos tudo e mudamo-nos para um condado diferente, mas naturalmente seguimos em contacto com o Sr. e a Sra.Banksy. Eles informavam-nos sobre os animais, quando alguma ovelha morria (algumas bateram as botas estranhamente rápido), enviavam-nos postais e coisas desse estilo. Todos os anos, quando víamos os prémios Bafta na televisão, dizíamos incorrectamente a todos os amigos que o homem que tinha feito aquelas cabeças tinha comprado a nossa casa. Foi tudo muito tranquilo até o dia em que um oficial de justiça lhes bateu à porta por causa de uma multa que a minha mãe não pagou por acidentalmente conduzir na faixa dos autocarros – eles enviavam-nos sempre a correspondência, mas como não nos apercebemos da carta do Departamento de Trânsito eles tinham agora um homem à porta a pedir-lhes dinheiro.

Este acontecimento foi suficiente para fazer com que a capa do Banksy voasse, ele ligou para a minha mãe que, na época, vivia numa caravana no jardim da sua casa nova. Foi uma chamada que coroou uma fase especialmente sombria da vida dela. Mais tarde, na brincadeira dissemos que ele o podia ter mandado embora com umas folhas de ouro. Rimo-nos tanto! Somos tão idiotas. Mas lá conseguimos resolver as coisas de uma forma amigável e continuar com nossas simples vidinhas.

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De vez em quando, passávamos à frente da casa por nostalgia e, uma das vezes, vimos que estava o seu Volvo estacionado. Ao vermos o carro, parámos para dizer olá. Para nós, era óbvio que estávamos apenas a ser simpáticos, mas dizer que eles entraram numa histeria épica não fica muito longe da verdade. Em segundos, a Sra.Banksy deu uma de Kevin Costner, e meteu-se à frente do carro enquanto dava o corpo às balas para proteger o marido. Depois apercebeu-se que éramos nós e lá se acalmou, então ficámos por ali a conversar inocentemente sobre as ovelhas. A Sra. Banksy até nos convidou para tomar um chá. Mas, como uns idiotas, e porque minha irmã precisava de mijar, recusámos.

"O Sr.Banksy, não chamava especialmente a atenção, a não ser por ser alto e vestir-se de preto. Também tinha um boné de basebol que lhe tapava metade do rosto."

Foi Essa foi a última vez que vimos os Banksys.

Quatro anos depois, a minha mãe recebeu um telefonema de um jornal local. Este dito jornal tinha uma equipa de jornalistas a tentar descobrir quem era o Banksy, o que só prova, se é que precisamos de provas, de que os diplomas de jornalismo são uma treta. O gajo interrogou a minha mãe por telefone, de uma forma super condescendente, durante uns 20 minutos enquanto lhe pedia para "procurar no Google" e "dar uma vista de olhos na foto de […]", antes de explicar o que o levou a acreditar que aquele homem era o Banksy, usando uma série de argumentos bastante válidos.

Felizmente, a falta de empatia animal da minha mãe é compensada com bom senso, e ela não lhe contou quase nada. Em vez disso, ela desligou o telefone e escreveu uma carta à Sra. Banksy, que ficou muito agradecida. Depois a minha mãe ligou para o homem que morava no final da estrada, que costumava ajudar com as ovelhas e que ocasionalmente matava uma quando as coisas estavam apertadas em nossa casa, e ele disse-lhe que já sabia quem era ele há muito tempo. Porque ele, assim como mais quatro ou cinco pessoas da área, tiveram uma vontade inexplicável de o proteger. Mais tarde ficámos a saber que o Sr. e a Sra. Banksy tinham desaparecido. Por incrível que pareça a minha mãe não me contou nada durante meses, ela sabe que não pode confiar numa filha mais nova que ainda por cima é jornalista.

Claro que é preciso ter azar, para comprar a casa de uma mulher cuja filha é jornalista. Mas, como não trabalho para uma organização de direita, só agora, anos mais tarde, com os Banksys há muito desaparecidos, é que escrevo sobre isto. Imagina ter de guardar este segredo! Não que eu o tenha guardado a sete chaves – esta história é puro dinamite social. Mas, agora que ele está escondido e seguro numa nova casita, vou vender esta história, principalmente porque eu não queria ter deixado as ovelhas para trás.

@morwennastar