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Tecnologia

​Os Neuroestimulantes Caseiros Hackeiam o Cérebro com Eletricidade

Os transhumanistas estão usando neuroestimulantes caseiros para melhorar as funções cognitivas do cérebro.
Crédito: Victoria Turk

A discussão em torno dos neuroestimulantes, especialmente aqueles do tipo que você pode usar em casa, tem girado em torno de drogas psicoestimulantes. Mas as drogas inteligentes não são o único jeito que os transhumanistas mais intrépidos estão tentando para melhorar a função cognitiva do cérebro.

Na terça-feira à noite, eu fui encontrar alguns entusiastas dessa ideia de neuroestimulante na London Hackspace, onde eles me mostraram os seus métodos caseiros de psicoestimulantes chamados de Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua, ou ETCC. Essa técnica experimental aplica uma pequena corrente elétrica na sua cabeça para tentar estimular algumas áreas específicas do seu cérebro. É uma tentativa de abalar os seus neurônios até eles cozinharem.

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Eu cheguei até o Dick Bruere por meio de um subreddit transhumanista em que ele postou sobre um encontro. Ele explicou em um email que ele estava tentando reunir um grupo, a fim de testar "coisas menos tradicionais como um campo magnético com padrão de baixa intensidade, estímulos de laser frio e os efeitos de IR moduladas e microondas", mas que levaria seu kit de ETCC caseiro naquela tarde.

O equipamento era muito simples. Bruere disse que parte do objetivo era mostrar como poderia ser barato e fácil. Dois fios saíam de uma caixa preta com uma LED e um grande e tentador botão vermelho. No final do fio vermelho tinha um anodo, e no fio azul, um cátodo. Duas pequenas esponjas encaixavam os eletrodos de cobre, e estavam imersos em água salgada antes de serem aplicadas na cabeça do usuário. Uma faixa da Nike as segurava no lugar.

ele uma vez duplicou uma "adrenalina de maratonista" – algo que ele queria repetir

Bruere me contou que ele sempre curtiu "coisas estranhas"e tinha interesse no ETCC, tendo descoberto que as drogas nootrópicas populares na comunidade transhumanista"te dão um pequeno impulso mas não muito forte". O ETCC, ele disse, tem um efeito parecido com o Modafinil, um medicamento narcoléptico conhecido por causar uma sensação de alerta. Ele disse que estava intrigado pelo potencial da aplicação do ETCC em esportes, e ele uma vez duplicou uma "adrenalina de maratonista" – algo que ele queria repetir.

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A caixa do Bruere continha uma bateria de 9V e um limitador que fazia com que o máximo de carga que eu receberia em minha cabeça seria de dois miliamperes, a quantidade comum usada no ETCC (e muito menos do que em uma terapia eletroconvulsiva, que utiliza cerca de 0,8 ampere). "Mesmo sendo reduzido pelos eletrodos, você não recebe muito mais do que três [amperes]", ele disse, e me garantiu que ele era um engenheiro elétrico profissional. Ele estava acompanhado por Andrew Vladimirov, que disse que costumava ser um neurocientista. O "costumava ser" me incomodou um pouco.

Mas outros dois voluntários tomaram a iniciativa e pareceram bem – pelo menos não afetados – então eu pedi para tentar. Bruere montou o anodo em volta da minha têmpora esquerda (no lugar que receberia o estímulo) e o cátodo na minha testa acima do meu olho direito (aqui seria inibido). Quando ele ligou, eu tive um flash de fosfeno e vi uma luz branca na minha visão periférica. A minha pele logo abaixo das esponjas tremeu.

Sem nunca ter tomado Modafinil, eu não saberia julgar a comparação que Bruere defendeu. Ele disse que o ETCC melhorava o foco cortando o "ruído" na sua cabeça quando você tenta se concentrar – como letras de músicas ou qualquer outra coisa que estivesse causando distração ao cérebro.

Eu me senti mais alerta depois de um tempo, talvez como se eu tivesse tomado um pouco de café, mas eu estava muito cética – eu estava sendo bem cuidadosa com isso, e não tinha certeza se qualquer mudança que eu achava sentir estava relacionada à energia nervosa ou à óbvia possibilidade de um efeito placebo. Depois de 10 minutos, a região embaixo do eletrodo no meu olho direito começou a pesar, quase como um começo de dor de cabeça. De novo, eu não tinha certeza se estava relacionado à corrente, ao aperto da faixa na minha cabeça ou a nada. Eu senti outro flash de fosfeno quando Bruene desligou o dispositivo.

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Embora existam muitos estudos sobre ETCC, normalmente relacionados a tratamentos de depressão, ansiedade e problemas relacionados a AVC, e também um que observou a performance em matemática, há pouco consenso e entendimento do que realmente ele faz ou quais efeitos ele pode ter. Como Greg Miller explicou em um artigo recente na Wired:

"Um ou dois miliamperes normalmente usados no ETCC não éo suficiente para fazer os neurônios queimarem. Ao contrário, ele parece colocá-los em um estado alterado que faz com que eles tenha uma certa probabilidade de queimar (dependendo de como a corrente flui) e fiquem propensos a religar suas conexões uns com os outros.

Como isso causaria um efeito terapêutico no cérebro não estáexatamente claro".

Ele explica que há uma complicação adicional que, apesar da psicologia popular, as funções e os sentidos não têm regiões mapeadas precisas no cérebro. Mas isso não vai impedir os transhumanistas de fazerem experimentos.

Lisa Arnold, que já experimentou o dispositivo antes de mim, optou por uma instalação, ou "instalação", diferente. Ela colocou o anodo atrás da sua orelha esquerda, supostamente acima da área motora, e o cátodo no braço direito, para completar o circuito sem inibir nenhuma área do cérebro. Ela estava esperando um efeito eufórico, e explicou que ela não tomou nenhum analgésico naquele dia para uma condição em que ela esperava que o ETCC poderia ajudar. Bruere disse que ela deveria sentir algum efeito durante algum ponto do processo, mas "não é como se você estivesse injetando heroína".

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Antes dela começar, Vladimirov usou um dispositivo de monitoramento para checar a atividade da área do cérebro e descobriu que já estava muito alta. Depois que ela relaxou um pouco, a atividade diminuiu e ele ficou feliz de prosseguir.

Lisa Arnold and Dirk Bruere

Estranhamente, no entanto, a atividade medida na área estimulada estava muito menor depois que ela completou 10 minutos – o efeito oposto que Vladimirov e Bruere esperavam. Eles acharam que ou havia alguma coisa errada com as medidas, ou aquela instalação não funcionava do jeito que eles esperavam.

Enquanto não houve nenhum registo de efeito adverso nos estudos atéagora, Vladimirov disse que poderia surgir um problema se houver muita ou pouca atividade em uma região do cérebro por um longo período. "Não é para forçar cada vez mais até você quebrar", ele disse. "É para encontrar uma janela ideal e mantê-la."

Arnold disse que se sentiu relaxada, mas não eufórica, embora não tenha sentido dor.

Tendo ou não os efeitos esperados, a comunidade do ETCC caseiro quer continuar tentando. Existem inclusive alguns dispositivos disponíveis, como o foc.us, que é focado em gamers, e tem como slogan "Processador Mais Rápido, Gráficos Mais Rápidos, Cérebro Mais Rápido!".

No meu caso, eu não saí convencida. Quando deixei o Hackspace, eu não me sentia particularmente mais focada, e ainda tinha uma música grudada na minha cabeça. Quanto tempo os efeitos do ETCC duram é vago, embora durante o estímulo e mais uns 90 minutos parece ser o cenário geral cogitado pelos fóruns.

Bruere disse que está ansioso para mexer em sua caixa para conseguir produzir uma ampla gama de efeitos, e também sugeriu que não foi feita muita coisa até agora que misture as diferentes formas de estímulos neurais, como ETCC com nootrópicos. Claro, uma desvantagem do estimulador elétrico é que você tem que usar um tipo de capacete idiota, ou no mínimo uma faixa. É um pouco menos sutil do que tomar um comprimido.

Tradução: Letícia Naísa