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É impossível não se identificar com 'Lady Bird'

Longa de estreia de Greta Gerwig conquistou o público pelo retrato sincero da adolescência.
Imagem: Reprodução.

Fui com os dois pés atrás na pré-estreia de Lady Bird — o filme entra em cartaz no próximo dia 15 de fevereiro . Pode ser mania de perseguição, mas preferi esperar para ver o filme mais bem avaliado na história do Rotten Tomatoes e ovacionado em festivais de cinema. O maior motivo foi a etiqueta do empoderamento feminista automaticamente colada no longa por conta da direção ser assinada pela Greta Gerwig e estar concorrendo a cinco Oscar esse ano. Numa época em que o feminismo e os direitos das mulheres parecem mais slogans rápidos para vender batom ou roupas, é preciso ter cuidado com qualquer coisa. Adianto que me enganei, e fiquei feliz por isso.

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Antes de qualquer coisa, Lady Bird não é um filme “de menina” ou “para as mulheres”. Sim, ter uma mulher assinando o roteiro e a direção faz ele apresentar uma ótica inevitavelmente feminista, porém o longa é feito para todos os seres humanos que passaram pela fase esquisita da adolescência. Pior, ele registra exatamente um momento de transição com o fim do colegial, a ânsia de sair de casa para estudar e o medo de enfrentar o mundo adulto fora da casa dos pais.

A história gira em torno da jovem Christine McPherson (Saiorse Ronan), nascida e criada em Sacramento, uma cidade conservadora e tediosa, referida como “o meio-oeste da Califórnia” pela protagonista. Christine é esperta e ácida e claro que se sente um alien onde nasceu. Como um refúgio ou uma autoafirmação de sua identidade, se deu o nome de Lady Bird e exige que todos a chamem assim. Sua família é unida e comunicativa, porém os problemas financeiros que surgem após o pai ficar desempregado se torna o motivo de desespero da sua mãe, Laurie (Maion Metcalf), uma enfermeira que se desdobra em jornadas duplas para manter a casa e pagar o colégio particular de Lady Bird. Mãe e filha são geniosas e sem papas na língua e transpareceram naturalidade na tela por conta do excelente trabalho das atrizes.

É uma história sobre o nada que é a juventude. Sobre o tédio nas tardes após a escola, as confidências com a melhor amiga e as vitórias amorosas.

Estudando em um colégio católico no meio de colegas ricos, Lady Bird sente a frustração de crescer sem grana ao observar a falta de preocupação e até a mediocridade dos amigos mais abastados que não precisam se preocupar em pagar a faculdade ou ter que trabalhar nas férias para conseguir se sustentar. Nesse processo acontecem as coisas inevitáveis da adolescência. A revolta, as brigas com os pais, a descoberta da sexualidade e as decepções amorosas. Lady Bird é uma jovem inteligente, mas sem os exageros de Hollywood. Ela tem marcas de acne, sonha em ser magra como as garotas da revista e finge conhecer rockstars para agradar os paqueras. A arrogância da puberdade, o constrangimento e a necessidade de conseguir se encaixar entre os caras legais estão presentes e são tão identificáveis que o espectador acaba rindo, chorando e se divertindo junto com a protagonista. É quase um exercício de empatia.

Não se trata de um filme com uma história edificante ou eventos extraordinários. É uma história sobre o nada que é a juventude. Sobre o tédio nas tardes após a escola, as confidências com a melhor amiga e as vitórias amorosas — tão pequenas no mundo exterior — mas gigantes quando você está com os hormônios à flor da pele. O efeito Hollywoodiano da vida real aparece em alguns momentos, como uma escola católica sem bullying ou uma protagonista mais bonita do que seu papel sugere. Só que é impossível não se ver em pelo menos uma cena ou em pelo menos um personagem sequer do longa.

Gerwig, consagrada após co-escrever e atuar em Frances Ha dirigido por Noah Baumbach, capta tão bem as besteiras e a arrogância que nós carregamos nessa época da vida que a única conclusão tirada é que de o filme é autobiográfico. De fato, ela chegou a afirmar em uma entrevista que muitas coisas do roteiro são tirados da sua vida, mas a história de Lady Bird não é sobre ela. Talvez seja por isso que o espectador sinta tanta empatia e identificação ao longo da história. Lady Bird é sua estreia como diretora e ganhou todos nós pela saudade da juventude. Por mais esquisita que ela tenha sido.

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