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Os clones mais vulgares do Game Boy

Como o sucesso do Game Boy inspirou uma variedade de portáteis clonados e vendidos sob estruturas corporativas bizarras.
Não é uma cópia, mas deve ter uma história muito estranha por trás disso aqui. Imagem: @stevenplin.

Matéria originalmente publicada na Motherboard.

Vagando por cantos escuros do eBay, Amazon e até do YouTube, você vai encontrá-los: os clones. Clones baratos. Clones caros. Clones que rodam cinco sistemas diferentes. Clones que chupinham vários consoles de uma vez. Alguns até de código aberto.

Mas antes dos clones vieram as cópias deslavadas. E o alvo de algumas das cópias mais óbvias era o Game Boy — um aparelho que, apesar de tela monocromática, capturou a imaginação de milhões de moleques de 8 anos no começo dos anos 90. Então não é surpresa que outras empresas tenham tentado pegar esse bonde.

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Vamos falar sobre a ascensão dos Game Boys wannabes. Tentar derrubar o rei nunca foi tão fútil.

A diferença sutil entre uma cópia e um competidor

Antes de continuar aqui, acho que é importante deixar claro esse limite. O Sega Game Gear, o Atari Lynx e o NEC TurboExpress eram competidores do Game Boy da Nintendo. (Pode ser até o caso dos péssimos consoles da Tiger Electronics.) Todos tiveram seu próprio processo criativo que levou ao lançamento, e cada um era diferente no mercado. (Especialmente o Lynx, considerando a versão temática Marlboro do aparelho em que tropecei quando estava escrevendo esta matéria.)

Mas uma cópia está claramente tentando fazer o mercado pensar que é uma coisa mais popular, geralmente feita de peças usadas, enquanto toma atalhos no design do produto. Basicamente, trata-se de um produto que tem sucesso porque um pai mais distraído não vai saber diferenciar.

Esse é um fenômeno bem conhecido dos videogames, e que continua até hoje — o NES Classic, difícil de encontrar, por exemplo, tem sido um alvo comum das cópias e direcionou até clones.

O Game Boy, em particular, atraiu algumas cópias interessantes, em parte porque seu design era simples e portanto fácil de copiar. Isso também significou que as empresas visando o mercado da Nintendo eram operações muito menores e sem nome na maioria dos casos. E os aparelhos, como resultado, se tornaram extremamente obscuros.

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Por exemplo: sinto que conheço bem meus games retrô, mas tinha me esquecido completamente do Watara Supervision até recentemente.

Espera, o que diabos é um Watara Supervision?

É tipo um Game Boy com pescoço. Imagem: Wikimedia Commons /Evan-Amos.

O console obscuro que tentou (mas não conseguiu) ser um Game Boy ligeiramente melhor

De muitas maneiras, o Supervision da Watara foi a tentativa de Hong Kong de mostrar que não era incompetente no fronte dos videogames.

O SuperVision, que saiu em 1992 sob vários nomes globalmente (como QuickShot, uma fabricante de controles terceirizada conhecida no passado), tentou melhorar modestamente o Game Boy numa época em que seus maiores competidores só queriam pular casas e ultrapassar o líder do mercado de consoles portáteis.

Em vez de ter uma tela colorida, ele tinha uma tela ligeiramente maior. Os botões também eram um pouco maiores, e o som também era melhorzinho. E em seu modelo mais comum, ele tinha um corpo dobrável, assim o jogador precisava dobrar menos o seu pescoço, além de pernas para segurar a tela se você quisesse. (Essa é sua variante mais conhecida, uma das 11 criadas pelo mundo, segundo uma FAQ de 2001 sobre o sistema. Algumas das variantes tinham um visual distintivo, enquanto outras foram feitas para parecer exatamente com o Game Boy.)

Ele tinha até um suposto trunfo: poder ser ligado em aparelhos de TV, e um acessório que eventualmente rodaria jogos coloridos – apesar disso nunca ter sido lançado. Em retrospecto, o console parece menos impressionante, mas isso foi muito antes do Super Game Boy.

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Claro, são melhoras evolucionárias numa época quando todos os outros competidores estavam tentando superar a Nintendo com tecnologia melhor. Os consoles, na prática, eram tão parecidos que a SuperVision chegou a trabalhar num adaptador AC para Game Boy! (E algumas variantes eram ainda mais obviamente cópias do Game Boy.)

O que não significa que isso deu certo para a Watara.

Claro, a maior diferença era o preço — o sistema custava apenas $49,95, com jogos entre $8,95 e $14,95. No aspecto dos preços dos jogos, eles tinham vantagem sobre a Nintendo.

A Warata tinha muito o que provar. Como o jornalista Ed Dille escreveu numa edição de 1993 da Electronic Games, o mercado de Hong Kong tinha uma reputação por pirataria que eles queriam superar, e apesar dos esforços para tentar uma abordagem mais legítima dando ao console “uma ligeira vantagem tecnológica”, os jogos deixavam muito a desejar.

“Pesando todos os fatores apresentados a nós até agora, a consideração primordial aqui parece ser que é possível se decepcionar com um jogo que custa menos de quinze dólares”, escreveu Dille, citando os fracassos do Atari 2600 nesse sentido.

E isso se provaria o calcanhar de Aquiles do console. O mercado tinha sido treinado para seguir franquias naquele ponto, e o pequeno número de desenvolvedores fazendo jogos para o SuperVision — a maioria de Hong Kong, um desenvolvedor britânico e outro cujos jogos NES eram associados a publicadora americana não-licenciada Color Dreams — não estavam realmente conseguindo fazer jogos de franquia. O que significou que o sistema saiu perdendo no mercado maior.

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Diferente de outros competidores, o console apareceu em alguns lugares mainstream – por exemplo, era um dos prêmios disponíveis do programa de auditório da Nickelodeon Legends of the Hidden Temple. Mas o prêmio de verdade seria se o console aparecesse nas mãos de milhões de crianças – e isso é algo que ele nunca conseguiu fazer.

(Se você ficou curioso para ver como eram os jogos do SuperVision, o Internet Archive tem versões em streamig dos games. Desculpa, não dá pra jogar no site, mas o sistema roda em emulador MAME através deste projeto MESS.)

Um console, dois nomes esquisitos

Claro, as cópias de Game Boy não começaram ou terminaram com o SuperVision, e algumas delas eram ainda mais descaradas.

Cerca de um ano depois do lançamento do SuperVision, outra empresa de Hong Kong, chamada Welback Holdings, desenvolveu um aparelho chamado Mega Duck, que era uma tentativa clara de se infiltrar naquele mercado aquecido.

No fronte técnico, a SuperVision e o Mega Duck eram bem similares. Enquanto o SuperVision tinha uma tela maior e mais tentativas de design, os dois aparelhos funcionavam do mesmo jeito. Basicamente como Game Boy. Mas o Mega Duck talvez fosse o mais interessante dos dois consoles porque acabou empurrado para direções bem estranhas.

O caminho corporativo para esse aparelho em particular vai ficando cada vez mais confuso, em grande parte porque a Wellback não vendia o console, mas o entregou para várias empresas fazerem o marketing e venderem. Como resultado, o console é conhecido por dois nomes: Na Europa ele se chama Mega Duck e era vendido por empresas como a Creatronic, Videojet e Hartung; mas no Brasil ele se chamava Cougar Boy e era vendido por uma empresa chamada Cougar. (Sim, o console conseguiu não um, mas dois dos nomes mais bizarros usados para batizar um console de videogame.)

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Agora, a Welback era uma desenvolvedora nos moldes da VTech, uma fabricante de clones de Apple II, também de Hong Kong, que conseguiu sucesso graças a uma variedade de produtos educativos — particularmente laptops falsos. E parte dessa ambição VTech acabou aparecendo no Mega Duck.

No meio dos anos 90, a Hartung lançou uma versão do Mega Duck como um laptop de brinquedo, completo com teclado de música, teclado normal e mouse. O canal do YouTube The Retro Future tem um vídeo ótimo explicando o que esse console realmente faz.

Mas talvez a parte mais interessante sobre o Mega Duck seja a impressora desse bizarro pseudo-laptop. Alguns anos antes do Game Boy ter sua famosa impressora, o mundo da pirataria tinha introduzido um aparelho portátil com impressora própria. A Nintendo pode ter se inspirado aí.

Não, nem o Mega Duck nem o Cougar Boy fizeram sucesso – como o SuperVision, eles não tinham muitos jogos bons. (E como o SuperVision, demos desses jogos estão no Internet Archive e rodam em MAME.)

Mas como curiosidade, as coisas podem piorar.

Uma das coisas mais fascinantes sobre esses sistemas clones é que as histórias das empresas envolvidas — fabricantes, vendedores e distribuidores — são difíceis de acompanhar.

Sou o tipo de cara que gosta de cavar, e mesmo eu acho a estrutura das várias corporações envolvidas profundamente confusas.

Não sou um fanático, como o comediante britânico Stuart Ashen, que levantou $74 mil para seu filme de 2013 Ashen and The Quest For The Game Child por financiamento coletivo. Ashen, que se tornou conhecido por seus reviews de consoles incrivelmente obscuros, escreveu um filme inteiro baseado no Game Child, um clone pirata estilo Game Boy que usa gráficos LCD estilo Tiger Electronics.

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(Você pode assistir o filme completo, que também conta com Warwick Davis do videogame Willow de NES, no YouTube.)

Em alguns casos, há uma linhagem entre aparelhos. Por exemplo, o nome Hartung é associado com as marcas Mega Duck e Watara Supervision, junto com um aparelho mais antigo e menos poderoso chamado Game Master.

E a empresa de Taiwan Thin Chen Enterprise, mais conhecida como Sachen, tem suas impressões digitais em jogos não-licenciados de NES, clones de NES, multi cartuchos e nas bibliotecas do SuperVision e do Mega Duck. A empresa até desenvolveu alguns jogos para Game Boy! A Sachen é uma besta em si, digna de uma matéria só pra ela algum dia desses.

Mas o melhor exemplo desse estado corporativo complexo é a Welback Holdings, a empresa responsável pelo Mega Duck.

Ela ainda existe hoje. Mais ou menos.

Lançada em 1992 como Welback, a firma passou por quatro mudanças de nome e agora é conhecida como Emperor Culture Group.

A empresa é propriedade de Albert Yeung, um investidor bilionário (e querelante de um processo contra o Google) dono também da companhia mãe da empresa, a Emperor Group. Mas a empresa não faz mais videogames piratas. A Emperor Culture Group é um conglomerado de entretenimento que produz programas de TV, é dona de cinemas e realiza shows ao vivo.

Em outras palavras, depois de muitas fusões e reorganizações, essas cópias de Game Boy secretamente construíram um império.

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