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​Os Integrantes do Parque Augusta Estão Sendo Acusados Pela Queda do Muro de Berlim

Os advogados das construtoras Setin e Cyrela colocaram uma imagem da queda do muro de Berlim no inquérito policial que acusa os integrantes do Parque Augusta de esbulho possessório.

Foto: reprodução/Advogados Ativistas

Foi por telefone que Douglas (ele prefere não divulgar o sobrenome) descobriu que havia uma intimação em seu nome para depor na delegacia. "O oficial de justiça ligou no meu celular pessoal, uma prática pouco usual", relata. Nos dias 7 e 8 de dezembro de 2013, ele organizou e participou de um festival no Parque Augusta, em São Paulo. Como explicado no link anterior, o terreno era ocupado por quem queria que ali fosse mantido um parque público, ideia contrária à das construtoras proprietárias Setin e Cyrela. No começo de 2014, Douglas e mais três pessoas foram intimadas. Até aí, tudo pareceria normal, não fosse uma das fotos anexadas ao inquérito policial: os advogados de acusação pinçaram imagens que estavam no perfil de Facebook do Parque Augusta. Inclusive uma foto antiga da queda do muro de Berlim. Douglas relata que quando a confusão das imagens foi explicada ao juiz, um dos advogados bradou: "Mas a foto estava no seu Facebook".

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Agora, as quatro pessoas são acusadas de esbulho possessório, crime contra o patrimônio alheio que consiste em invadir um terreno particular com o intuito de adquirir a posse para si. Daniel Biral, do grupo Advogados Ativistas, explica que os quatro foram escolhidos aleatoriamente depois que eles se manifestaram pelo Facebook. O advogado frisa que os réus ficaram indignados. "Nos dias 7 e 8 de dezembro [datas pelas quais são acusados], aconteceu um primeiro festival pedindo a criação da lei do Parque Augusta. Passaram cinco mil pessoas ali e só eles foram acusados dessa maneira. Só eles estão respondendo a processo. Nunca tinham sido processados."

Foto: Felipe Larozza/VICE

Biral explica que os advogados de acusação recolheram fotos do perfil do Parque Augusta na internet e anexaram ao inquérito. "Eles falaram que era o movimento quebrando o muro do parque."

A VICE entrou em contato com Luiz Fernando Ulhôa Cintra, advogado das construtoras. Ele ficou de retornar a ligação, mas não o fez até o fechamento desta reportagem.

Se condenados, os quatro réus podem pegar de seis meses a um ano de detenção. Mas, como o crime é de menor potencial ofensivo, provavelmente a pena será convertida em serviços comunitários.

Douglas relata que, quando recebeu a ligação, o oficial de justiça queria já agendar o depoimento para a manhã seguinte, alegando urgência. "Eu falei: 'O senhor não vai marcar nada. O senhor vai esperar eu comunicar o meu advogado e perguntar o que devo fazer'. Ele tentou esse mesmo procedimento com os outros três acusados", falou.

De acordo com o réu, a foto do muro de Berlim não foi o único equívoco. Douglas conta que, entre as imagens anexadas ao inquérito, existem fotos de eventos que aconteceram antes e depois das datas nas quais eles são acusados de esbulho possessório. "Tem uma foto do carnaval de 2014. Sei por conta das fumaças coloridas."

No dia 4 de março, o sonho do Parque Augusta acabou, já que a Polícia Militar realizou a reintegração de posse do terreno, que, agora, está fechado. Para Douglas, a acusação não foi tão espantosa quanto o desalinho presente no inquérito. "Imaginávamos que, em algum momento, aconteceria essa criminalização, mas não que ela seria tão mal fundamentada e tão leviana."

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