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Classismo

Chutando alto, eu diria que a metade das coisas que, à primeira vista, parecem ser racismo e sexismo casuais e xenofobicamente genéricos, são classismo, e isso é permitido porque ninguém entende essa questão direito e ninguém parece querer entender.

Ilustração por Penelope Gazin.

Fato curioso: quando você não sabe sobre o que está falando, provavelmente você está falando sobre classe. Quer dizer, talvez sim, talvez não… Mas, muito provavelmente. Classismo, denotado de e por qualquer ponto de vista dentro do espectro socioeconômico, é uma parte implícita de praticamente tudo o que é interessante, útil e verdadeiro a se debater. Os preconceitos em si não são invisíveis, mas o classismo em ação às vezes é algo silencioso, ou que está enfiado em outras formas de diagramação e aviltamento da experiência humana. Classe é uma coisa sempre em mutação, flutuando como gás, presente quando não está lá e ausente quando parece estar. Chutando alto, eu diria que a metade das coisas que, à primeira vista, parecem racismo e sexismo casuais e xenofobicamente genéricos, na verdade são classismo (e não estou dizendo que o racismo e o sexismo não façam intrinsecamente parte da condição de classe) e isso é permitido porque ninguém entende essa questão direito (pelo menos não fora do negócio do “nós contra eles” dos partidos políticos e debates econômicos abstratos), e ninguém parece querer entender.

No entanto, considerando os detalhes mais refinados, vivos e humanos das questões de classe, o debate também é, estranhamente, proibido. Dinheiro, status, “classe” — específicos e seculares (o que a classe média “é”, por exemplo, mudou ao longo do tempo, juntamente com seus números) — estão entre os aspectos mais determinantes e influentes de como a vida é sentida e experimentada, mas abordar essas questões diretamente — em conversas, críticas — terá o efeito de estreitamento e anulação, em vez de servir para dar contexto, expandir ou ser mais verdadeiro com qualquer coisa. Primeiro porque é “rude” (eca) falar sobre o que você tem ou o que deixa de ter. Isso porque quando as pessoas falam sobre classe, algo que está praticamente fora do socialmente aceito, há mais maneiras de se estar errado, de se ofender (por exemplo, se você é um tremendo racista, provavelmente alguém já disse isso na sua cara alguma vez). Classismo é algo quase permitido: “favelado” devia ser uma coisa muito vergonhosa de se dizer (assim com “burguesinha”, “filhinho de papai” e qualquer coisa que pressupõe um caráter ou qualidade baseados em status econômico), mas não é.

A maior razão para ninguém falar sobre classe de maneira útil é por medo, que geralmente se prende aos nossos ombros como pregadores de roupa, e nos leva a lugares ruins e idiotas. Há também uma grande ansiedade subjacente de classe, seja ansiedade por se estar muito perto ou muito distante da pobreza e/ou, senão para os ricos, a ansiedade em relação à questões presumidas como liberdade ou dinheiro. O fato de as pessoas que conseguem fazer piada com as merdas mais vis, degradantes, racistas e sexistas fazendo um ar de “vocês ainda se importam com isso?”, levarem totalmente a sério seu próprio status de classe, demonstra muito bem o quanto isso está realmente integrado à vida.

Sempre que isso se quebra, quando gente privilegiada confronta seu próprio privilégio (preciso invocar a Lena Dunham aqui ou não?), isso é recebido com esgar; privilégio só pode entrar na conversa como encargo, seguido de explicação e mitigação. E olhe lá. Meu trecho favorito da Audre Lorde (“Espera-se que as pessoas negras e do Terceiro Mundo eduquem os brancos sobre nossa humanidade. Espera-se que as mulheres eduquem os homens. Espera-se que lésbicas e gays eduquem o mundo heterossexual. Os opressores mantêm sua posição e evitam a responsabilidade sobre suas próprias ações…”) também pode ser facilmente aplicado à classe, em teoria. Fica a cargo, e não deveria ficar, somente das pessoas que estão lutando, ou das que superaram isso de algum jeito, de se pronunciar sobre o impronunciável — tornar classe uma questão real. Quer dizer, vá em frente, mas o ônus do exame (sem querer que as pessoas ricas expliquem para os pobres por que eles são pobres, claro, mas falando de alguma autoconsciência sobre o próprio privilégio) tem que ser das pessoas em posição de poder, porque é essa a obrigação humana do privilégio, sorte, sucesso, talento ou o que quer que seja. Isso é meio meloso da minha parte, claro, mas e se de repente fosse escroto e bizarro se gabar do que se tem ou não? Não é algo revolucionário ou político: é algo social. É uma economia do maneiro, o que também é algo poderoso.

Ninguém está fora das classes ou é “pós-classe”. Independentemente disso, deveria ser mais difícil para essa geração, uma geração de pessoas que são a-históricas em nosso pensamento e cujos valores inclinam-se cada vez mais para a meritocracia real da internet, olhar em volta e ver o mais interessante da experiência humana, tanto fora quanto como parte de algum tipo de classe.