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Identidade

Adultos LGBT+ falam quais personagens de desenho os representavam na infância

"O Bob Esponja é uma figura masculina que não se importa se suas ações podem ser consideradas 'coisa de viado'."
O personagem Ele, do lado esquerdo e Shun, do lado direito
Os personagens Ele (à esq.) e Shun de Andromeda. Imagens: Reprodução / YouTube

Em 2017, contei aqui na VICE que eu era a criança viada no bairro que chegava nas festas dos amigos ouvindo "coloca Xuxa que o Bruninho chegou". Na mesma época, enquanto crescia meu fanatismo pela apresentadora, minha diversão em frente à TV também era assistir aos desenhos animados.

Quando pequeno, toda a minha rotina era baseada na grade de exibição dos desenhos na TV. Passei uma fase viciado em Bananas de Pijamas e depois já sabia de cor as músicas dos Cavaleiros de Zodíaco, graças a fita k7 que meus pais me deram.

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À medida em que fui crescendo, passei a gostar de personagens que aparentemente tinham uma característica semelhante a minha personalidade e astúcia, que se assemelhava com algo que eu tinha muita vontade de ser ou fazer em algum momento da minha vida; como ser inteligente e romântico igual ao Doug Funnie; ser rebelde, fazer o que quer e passar pelas paredes como a Kitty (Lince Negra) do X-Men Evolution; ser mandona e viciada em roupas como a Clover de Três Espiãs Demais; e mocinho cheio de mistérios como o Super Choque.

E hoje, aos 26 anos e sendo um jovem LGBT+, saco que esses personagens me representavam de alguma forma – ainda que eu fosse apenas uma criança sem entender nada sobre homossexualidade. Aproveitando essa deixa, perguntei a outros LGBTs quais eram os personagens de desenho animado pelos quais eles também se sentiam representados. Saca só:

Ele (As Meninas Superpoderosas)

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Imagem: Reprodução / YouTube

"Eu achava as roupas dele muito legais, e pra mim, ele não tinha cara de vilão. O vilão era o macaco louco, não era o Ele. Achava a voz, a dublagem super legal porque ele tinha um jeito despojado. Aquela bota pretinha de couro e tutu de bailarino, eu adorava. Não sei se é porque eu cresci com a minha tia mais nova sendo lésbica assumida desde sempre, mas nunca liguei se o personagem era LGBT ou não. Se eu gostava dele, eu gostava dele e pronto." - Lelly Costa, 27

Coragem, o cão covarde

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Imagem: Reprodução / YouTube

"Seria clichê escolher um herói como Super Man ou outro personagem cheio de atributos para enaltecer meu ego. Por outro lado, estaria cometendo uma autosabotagem ao escolher um personagem frágil com algumas peculiaridades. Fazer o quê… Coragem, o cão covarde é um cachorro rosa (única parte que não me identifico) apaixonado por sua dona e capaz de fazer coisas impossíveis para salvar sua família dos perigos de cada episódio. Ele me define em 99%.

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Presenciei vários acontecimentos na minha infância, um tanto traumáticos, e nesses momentos, mesmo em pânico, consegui encontrar a força e coragem necessárias para 'salvar o dia'. Tenho meu jeito de lidar com o mundo assim como ele, todo errado, e no final, vou dizer que quase sempre só para não pecar, dá certo.

Vejo nele o contraste do seu lado puro e valente com o destrambelhado e medroso. Acho isso fantástico. Gostaria de imortalizar ele com uma tatuagem, mas cadê a coragem? Sei que um dia irei fazer. Enquanto isso, continuo assistindo os episódios para matar a saudade desse carinha cor de rosa." - Eduardo Vinícius, 26

Shun de Andromeda (Cavaleiros do Zodíaco)

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Imagem: Reprodução via YouTube

"Nos jogos de Super Nintendo, sempre escolhia a Princesa do Mario Bros, a Chun-li do Street Fighter e a Kitana do Mortal Kombat, enquanto meus primos escolhiam Mario, Ryu e Sub-Zero… E claro que era zoado por isso. Sempre dava a desculpa de que achava as personagens femininas melhores para jogar por serem mais leves nos movimentos, mesmo que eu não entendesse quase nada sobre jogabilidade e características de personagens. Eu escolhia elas porque eram as mais fabulosas, com as melhores roupas e golpes.

Outro momento que, hoje, ao olhar pra trás vejo que já revelava minha identidade como gay era ao assistir Cavaleiros do Zodíaco. Meu personagem favorito sempre foi o Shun de Andromeda. Em primeiro lugar por ter a sua armadura rosa e não precisar se afirmar sempre como o cavaleiro mais forte, mais bruto. Ele era o mais gentil e que possuía a melhor defesa. A corrente de Andrômeda era capaz de reconhecer o perigo e formar uma roda em volta do Shun e protegê-lo de qualquer mal. Talvez a grande admiração pelo personagem viesse também desse aspecto, ele estava sempre protegido e também protegia os seus amigos." - Jonathan Sales, 26

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Bob Esponja e As Meninas Superpoderosas

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Imagem: Reprodução / YouTube

"Um desenho que eu me sentia muito confortável assistindo era Bob Esponja. O Bob é uma figura masculina que no geral não se importava com os papéis de gênero, sempre sendo dócil e carinhoso e não se importando se suas ações poderiam ser consideradas 'coisa de viado'. Outro ponto legal mas ao mesmo tempo problemático é que o Bob Esponja não era um desenho de gênero, então era normal que todas as crianças assistissem. Eu não me sentia envergonhado de gostar do Bob e de assistir ele, porque eu não achava que seria julgado pelos meus pais por isso. Era ok.

As Meninas Superpoderosas era diferente. É um desenho incrível, que desconstrói papéis de gênero e super empodera as meninas. Mas era um desenho 'para meninas'. Me lembro de querer assistir ao filme delas no cinema, e meu pai era mais resistente, sempre tentando me convencer a assistir outro. No final não fomos. Logo, eu não ficava confortável em assistir As Meninas Superpoderosas, desde criança eu já achava que tinha 'algo errado com isso'. Mas, no fim, eu assistia mesmo.

Conforme fui crescendo, a resistência para desenhos de 'menina' era algo que estava dentro de mim, me fazia sentir como se estivesse realizando um guilty pleasure, quando na verdade não tinha nada de errado. Mas assistia mesmo assim. Cantava a música toda de Kim Possible, o poder daquela adolescente me encantava demais. Também assistia Três Espiãs Demais. Me sentia muito mais próximo dessas personagens porque elas representavam o distanciamento da masculinidade tóxica, algo que comecei a perceber a partir daí." - Jean Chican, 22

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Alice e The Sims

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Imagem: Reprodução: YouTube

"Quando criança eu gostava de desenhos fofos e não de heróis ou guerreiros. Tipo Ursinhos Carinhosos, Popples, Cavalo de Fogo. E acho que era comum que eu me identificasse mais com personagens femininas, tipo a Alice (do País das Maravilhas). Nunca gostei de X-Men, Batman (se bem que aquele New Adventures of Batman and Robin eu curtia o estilo), He-Man, e outros.

Acho que só na adolescência que eu talvez tenha passado por isso, especialmente com games, como The Sims e Fallout, que foram os primeiros jogos em que você podia ser gay. Acho que foi a primeira vez que percebi a importância de representatividade, de poder me expressar como um homem gay, mesmo que num contexto de ficção, num mundo virtual." - Rique Sampaio, 33

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