Esta matéria foi originalmente publicada na VICE NEWS .MOSCOU – Oficiais russos reagiram com fúria na sexta à decisão da administração Trump de lançar um ataque com mísseis contra uma base aérea síria.Foi o primeiro e talvez mais importante teste da possível consequência global do ataque aéreo – a primeira grande ação militar tomada pela administração Trump contra o regime sírio – e inicialmente, pelo menos, a Rússia parece preparada para aumentar as tensões."Essa ação de Washington está causando um dano dramático aos laços entre Rússia e EUA, que já estão num estado terrível", disse Dmitri Peskov, porta-voz do presidente russo Vladimir Putin, numa declaração. O ataque norte-americano, ele acrescentou, foi "uma agressão contra um estado soberano em violação às normas da lei internacional e sob um pretexto inventado".Numa ação possivelmente desestabilizadora, o Kremlin também anunciou que estaria "suspendendo" uma ligação de comunicações crítica que ajuda a evitar conflitos acidentais entre pilotos norte-americanos e russos nos céus da Síria. Esse canal tem sido fundamental na prevenção de aeronaves russas e norte-americanas cruzarem caminhos ou dispararem entre si nas missões simultâneas na Síria. A Síria também pediu uma reunião de emergência com o Conselho de Segurança das Nações Unidas em Genebra.Mas a Rússia, como qualquer país, joga com vários círculos em suas declarações públicas, e conforme o dia foi passando, oficiais também pareciam estar abrindo caminho para manobra, minimizando a importância do ataque.Numa entrevista coletiva para a mídia russa, Igor Konashenkov, porta-voz do Ministério da Defesa, zombou do ataque norte-americano como "altamente ineficaz", dizendo que apenas 23 dos 59 mísseis Tomahawk atingiram o alvo. Ele também criticou os EUA por acreditar em notícias falsas sobre o ataque do regime sírio contra civis na província de Idlib.Imagens da base aérea liberadas pela mídia russa na sexta parecem apoiar a ideia de que os danos a aviões e pista foram relativamente mínimos, e oficias russos – que receberam um aviso antes do ataque – disseram que nenhum militar russo foi morto ou ferido. O Kremlin não respondeu a relatos de que a Rússia não ativou seus sistemas antimíssil durante o ataque.Analistas de defesa sugerem que pelo menos alguns oficiais provavelmente estavam observando o ataque com indiferença – e conscientes das realidades da política doméstica americana."Esse ataque foi feito visando o público doméstico dos EUA", disse Sergey Markov, um analista político de Moscou conhecido por articular visões geralmente na linha aprovada pelo Kremlin, numa entrevista para a VICE News. Trump, ele acrescentou, "não está conseguindo se tornar um verdadeiro presidente, suas políticas estão sendo bloqueadas, e ele está tentando superar as deficiências de sua presidência".Markov acrescentou: "Isso dificilmente resultará num conflito com a Rússia. A Rússia entende [o ataque] como encenado para a agenda doméstica norte-americana".Alexey Khlebnikov, um analista de defesa de Moscou, disse que podia ver "uma certa lógica" no ataque. "Os EUA começou a perder controle sobre a situação na Síria, o que levou ao crescimento da influência da Rússia, Irã, problemas com a Turquia e assim por diante. Essa decisão inesperada ajudou o país a resolver uma série de questões."Khlebnikov também minimizou a importância da suspensão de comunicações, dizendo que isso "dificilmente vai levar a qualquer consequência séria", porque os dois lados estão determinados a evitar conflito."Ninguém quer ou planeja tais incidentes", ele disse. "Isso significaria o começo de um confronto aberto entre Rússia e EUA, e ninguém precisa disso."Salman Shaikh, consultor político que até recentemente era diretor da think tank Brookings Doha Center, passou alguns dias anteriores ao ataque visitando oficiais em Moscou, principalmente para discutir a política síria.Ele disse a VICE News que voltou impressionado com as percepções realistas dos oficiais russos sobre as intenções americanas na Síria, e com o que ele interpretou como uma esperança honesta de continuar um processo para a resolução política do conflito – particularmente com a visita a Moscou do secretário de Estado norte-americano Rex Tillerson na próxima semana."Acho que os russos entendem a necessidade de continuar avançando o processo político, apesar de não estarem dispostos a se afastar de Assad ou discutir transição política", disse Shaikh.Depois do ataque aéreo, Shaikh acrescentou, há uma chance do diálogo começar de novo, em condição de igualdade."Trump reequilibrou a situação na Síria, e isso pode trazer mais oportunidades para russos e norte-americanos, por mais difícil que isso pareça agora", ele disse. "Onde há crise, há oportunidade."Tradução do inglês por Marina Schnoor.
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