Um papo com a promessa do boxe Shakur Stevenson, “o próximo Floyd Mayweather”
Foto por Mikey Williams/Top Rank

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Um papo com a promessa do boxe Shakur Stevenson, “o próximo Floyd Mayweather”

Ouro na Rio 2016, o jovem de 19 anos acaba de iniciar sua carreira profissional com vitória. Qual é o peso do fardo que carrega?

As expectativas sobre jovens de 19 anos de idade não são lá muito encorajadoras: "aprenda um ofício" e "tente não fazer muita merda".

Shakur Stevenson, da cidade de Newark, em Nova Jérsei, nos EUA, já encontrou sua vocação, visto que levou a medalha de prata dos Jogos Olímpicos no Brasil em boxe, peso-galo. No entanto, ao contrário dos caras de sua idade, Stevenson não pode se dar ao luxo de fracassar.

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O prodígio virou pessoa pública. São muitos os esportistas e comentaristas que apostam suas fichas no talento incomum do boxeador. O próprio Floyd Mayweather o intitulou "O Próximo Floyd Mayweather".

E não foram palavras vazias. Muitos repórteres de butuca no Rio de Janeiro captaram a mesma fala. Embora Mayweather, a lenda invicta dos ringues e hoje promotor de lutas, não tenha conseguido contratar Stevenson (a honra foi concedida à empresa Top Rank, de Bob Arum), o elogio jamais foi revogado.

Stevenson deu início à sua carreira profissional em Carson, na Califórnia, no último sábado, com uma vitória na categoria peso-pena, em cima de Edgar Brito (então 3-2-1), logo antes da disputa do mundial WBO entre os penas Oscar Valdez e Miguel Marriaga. (Campeonato produzido e distribuído pelo Pay-Per-View da Top Rank®)

E assim como aconteceu quando o condecorado amador irlandês Michael Conlan virou profissional, com um nocaute em Tim Ibarra no mês passado, Stevenson chega à categoria com um tremendo apoio e altas expectativas.

Ao passo que Conlan, de 25 anos, contava com a estrela do MMA Conor McGregor em sua comitiva, Stevenson está sendo agenciado, em parte, pelo seu próprio ídolo: o campeão meio-pesado e medalhista olímpico de ouro Andre Ward.

Crédito: Mikey Williams/Top Rank

O simples fato de Stevenson ter estreado no pay-per-view com uma bolsa de 20 mil dólares, segundo a Comissão Atlética da Califórnia (CSAC), é outro indicador de seu potencial. Jovens lutadores não ganham muito em suas primeiras lutas, tampouco contam com a orientação de veteranos respeitados.

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Contudo, dadas todas as circunstâncias envolvendo Stevenson — cujo nome foi uma homenagem a Tupac Shakur —, ele surpreende por sua humildade e polidez. Quando perguntamos como ele comemoraria sua primeira vitória, ele respondeu como qualquer californiano de 19 anos responderia: "Na lanchonete In-N-Out Burger".

Na conversa a seguir, Stevenson discute Conlan, a luta dos sonhos contra Vasyl Lomachenko, os negócios por trás do boxe e o fardo de ser o próximo Mayweather.

VICE SPORTS: O que mudou na sua vida ao virar profissional?

Shakur Stevenson: Ser profissional é muito diferente, agora nos pesamos um dia antes da luta. Na categoria amadora, precisávamos nos pesar todo santo dia. E são muito mais rounds, então preciso ser um pouco mais paciente. É bem diferente, e isso me empolga. Foi difícil para mim chegar aos 55 quilos. Estou contente de não ter mais de passar por isso.

Na categoria profissional, é mais fácil avaliar os oponentes? Edgar Brito, por exemplo.

É mesmo muito fácil dar uma olhada nos oponentes, no YouTube e tal. Dá para acompanhar melhor as lutas deles. Cheguei a ver uma luta [do Brito] antes.

Muitos boxeadores criticam bastante os juízes amadores. Você está contente por deixar isso para trás?

O trabalho dos juízes nas lutas amadoras é um tanto falho, então me sinto aliviado por não ter que lidar mais com isso. Mas acho que o boxe profissional também sofre com arbitragens ruins. Já testemunhei decisões ruins, no caso.

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Crédito: Mikey Williams/Top Rank

Que ritmo você gostaria de dar à sua carreira?

Não vou escolher por conta própria. Vou deixar a Top Rank e meus agentes cuidarem disso. Não vou escolher as datas. Mas gostaria de lutar sempre que possível.

E o modelo "Sugar" Ray Leonard? Se não me engano, foram 26 lutas em seus dois primeiros anos depois de ganhar a medalha de ouro, em 1976.

Isso é muito, mas também não me importaria.

Floyd Mayweather o intitulou "O Próximo Floyd Mayweather". Isso é uma benção ou uma maldição?

Não diria que é uma maldição, mas não me considero "O Próximo Floyd Mayweather". Diria que sou "O Primeiro Shakur Stevenson", mas é um bom título para ostentar.

O campeão meio-pesado unificado e medalhista olímpico de ouro Andre Ward é um dos seus empresários. Qual foi o melhor conselho que ele deu?

Basicamente: mantenha o foco.

No centro de treinamento, fico vendo o Andre praticar. Adoro observá-lo. O foco dele é impressionante. Ele fica tão centrado que às vezes chega à academia e mal me cumprimenta. E depois que acaba o treino, volta ao normal.

Essa experiência faz com que o boxe pareça mais um trabalho, um hobby ou um passatempo?

Eu amo boxe, então não diria que é apenas meu trabalho. É um trabalho e também um hobby, eu diria. Estou contente com minha carreira.

O Ward já conversou com você sobre publicidade e os negócios por trás do esporte? Você não precisava pensar nisso quando era amador.

Ele já conversou bastante comigo sobre negócios. Ele me ajuda muito.

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O que você acha de autopromoção? Quando você vira profissional, tem que ser o próprio RP. Há quem cause diante da mídia só para promover uma luta.

Sinto que não preciso fazer nada que extrapole o meu caráter só para ganhar fama ou promover uma luta. Creio que ser eu mesmo será o bastante para promover minhas lutas — para ganhar um bom dinheiro e fama no meio.

Nada a ver com Sergey Kovalev e Ward, então?* Kovalev disse coisas terríveis sobre Ward *.

Longe disso.

Quando você se profissionalizou, muitas pessoas vieram dar conselhos? Boxeadores e afins?

Bastante. Assim que virei profissional, muitos lutadores bons vieram conversar comigo, como Terence Crawford e Andre Ward. Bom, Andrew Ward fez parte do processo todo.

Você às vezes ouve esses conselhos com certo ceticismo?

Presto atenção em quem está me aconselhando. Se for alguém sem conhecimento de causa, então provavelmente não será o melhor dos conselhos. Mas se for alguém que já passou pelo que estou passando, e que sabe o que faz, bem capaz que eu leve o conselho a cabo.

O seu nome e o nome de Michael Conlan costumam ser mencionados juntos. Vocês dois são jovens, ambos fecharam contrato com a Top Rank, e ambos competiram na categoria peso-galo dos Jogos Olímpicos 2016. Você já vislumbra uma luta com Conlan (1-0, 1 nocaute), ou precisa se estabelecer primeiro?

Nós dois precisamos nos estabelecer. Não podemos nos deixar vencer. Precisamos nos provar, fazer por onde. Vejo que todo mundo já está descolando lutas grandes, isso é ótimo.

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Vocês se conhecem?

Nós nos conhecemos no centro de treinamento umas duas semanas antes dos Jogos Olímpicos, passamos pelo centro juntos.

Como foi essa experiência?

Foi bem legal. Ele sempre me via lutar nos treinos. E eu sempre o via lutar nos treinos. Estávamos de olho um no outro.

Crédito: Mikey Williams/Top Rank

Lutadores como o irlandês Conlan geralmente contam com um país inteiro na torcida. Não podemos dizer o mesmo sobre a maioria dos americanos. Há muitos outros esportes competitivos no país. Você acha que os boxeadores americanos são negligenciados?

Acho que alguns americanos não têm muito apoio. Mas sinto que tenho uma ótima torcida. Sinto que a cidade de Newark está a meu lado. E sinto que não preciso de mais nada. Colocaram o Michael Conlan em Nova York, e se me colocarem em Nova York, Newark fica a 25 minutos de distância. Eu seria capaz de juntar um bom bocado de fãs por ali, então seria uma luta grande.

Você pensa em lutar em Newark?

Claro — quero lutar no Prudential Center. É minha casa. Adoraria voltar para casa e mandar ver.

Que lutadores você acompanhou ao longo de sua formação?

Os três principais caras que acompanhei foram Andre Ward, Floyd Mayweather e Pernell Whitaker. Ultimamente, tenho visto bastante coisa do [Vasyl] Lomachenko e Terence Crawford.

Por que* Lomachenko *se destaca?

Lomachenko simplesmente domina toda luta. Sem exceção, toda e qualquer luta, ele domina. Não perde um round. Quero ser assim.

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Crédito: Mikey Williams/Top Rank

Imagino que você já tenha visto vídeos de Pernell Whitaker no YouTube?

Sim.

Há quem o compare a Lomachenko, em termos de técnica e estilo. Você vê alguma semelhança?

Não entendo muito bem a comparação. O estilo é parecido — socar e se manter ileso —, mas vejo uma baita diferença. Acho que Lomachenko tem um estilo próprio. Nunca tinha visto algo parecido no boxe americano.

Você já visualiza uma luta sua contra o Lomachenko no horizonte?

Sem dúvidas. Quero entrar no ringue com ele mais à frente, sim, já que estamos na mesma faixa de peso. Seria minha luta dos sonhos. Mas preciso me provar antes.

Você tem muitas opções no peso-pena: Leo Santa Cruz (33-1-1), Carl Frampton (23-1), Gary Russell Jr. (27-1). Na categoria superpena, tem o Lomachenko, e Mikey Garcia (36-0) é peso leve. O plano é permanecer na categoria?

Acho que vou deixar meu corpo tomar forma naturalmente. Se eu crescer com a idade, então cresci. Até lá, estou de olho na divisão pena.

Como é ser pago agora? Jovens atletas profissionais já me disseram que o aspecto administrativo dos esportes os intimida.

Não me intimida. Fico feliz que seja algo profissional e paguem as lutas. É uma benção.

Crédito: Mikey Williams/Top Rank

Onde você mora e pratica?

Moro e treino na Virgínia. Treino na cidade de Alexandria.

Você pensa em fazer algum curso superior no tempo livre? Alguma matéria de interesse?

Sem dúvidas. Penso em retomar os estudos, sim. Mas quando eu voltar, será online. Não tenho nada em mente. Talvez estudar a parte administrativa do esporte.

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O peso meio-médio Chris Algieri fez faculdade (Hofstra) e virou nutricionista. Ele trabalhou com o Danny Jacobs na luta contra Golovkin.

Não sabia disso. Legal!

Como tem sido o centro de treinamento profissional?

Tem que correr bem mais e lutar muito mais rounds, porque vou passar mais tempo no ringue agora. Esse tem sido o meu foco.

Você luta com boxeadores maiores nos treinos?

Tem o Keyshawn Davis, de Norfolk, Virgínia, e um garoto que pesa em torno de 74 quilos na minha academia. São como irmãos para mim. Luto com eles nos treinos.

Sua família vem ver sua primeira luta?

Acho que alguns familiares virão. Já minha mãe, acho que não. O preço subiu muito desde que ela adiou [a compra dos ingressos].

E o que você acha de trazer sua própria personalidade às lutas? Agora pode escolher os shorts, a música, etc.

Adoro isso de escolher o próprio uniforme e entrar com uma música de escolha própria. Sinto que é uma atmosfera diferente entre os profissionais. Vou curtir.

Tradução: Stephanie Fernandes