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George Amponsah (GA): Eu estava numa festa de aniversário em Tottenham em 2012, onde encontrei uma líder comunitária local. Começamos a conversar sobre as revoltas, e ela disse que isso ainda estava fresco na memória das pessoas. Eu queria fazer um filme sobre as pessoas que estavam no epicentro do que aconteceu, e ela conhecia Marcus e Kurtis. Reconheci algo honesto neles, então segui meus instintos. Se você pode dizer algo sobre uma pessoa pela sua companhia, pensei: "Essa é uma chance de saber quem era Mark Duggan, de encontrar a humanidade por trás daquela foto que saiu nas manchetes de todos os jornais, a de um bandido intimidador". Três anos depois, aqui estamos.Vocês viram uma oportunidade de reenquadrar o retrato da mídia sobre Mark? Isso deve ter machucado vocês.
Kurtis Henville (KH): Sim. Quando ele foi baleado, a mídia afirmou que ele era um bandido, que ele era um atirador. Eu conhecia meu amigo. Ele era confiante, um pouco tímido, gostava muito de garotas e amava seus filhos. Esse não era um cara que ia acordar um dia e jogar sua vida fora.
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Marcus Knox-Hooke (MKH): Raiva da polícia. As pessoas que vieram inicialmente eram jovens de todas as áreas. Todo mundo se identificava com o que tinha acontecido com o Mark, entende? Alguém é assassinado, você quer que haja justiça e a justiça não acontece. Anos depois, outra pessoa morre – e é a mesma coisa. Testemunhei isso desde que era criança, em 1985, de Cynthia Jarret a Joy Gardner… e isso foi na minha área. Mark provavelmente não será o último. O próximo pode ser um dos nossos filhos, e eu prometo, cara… bom… sei lá…Essa tensão não foi resolvida, foi?
GA: É fácil ver jovens se revoltando em áreas urbanas e pensar "Do que diabos vocês estão reclamando? Vocês têm tudo de que precisam aqui". No entanto, há desigualdades sérias na sociedade. Se você é britânico, se nasceu aqui e tem um passaporte britânico – você quer um pedaço igual da torta. Se você não consegue isso, isso alimenta ressentimento e raiva, que vão se acumulando. Pode parecer que você está numa armadilha, pois o Estado, geralmente na forma da polícia, está dizendo: "Seja lá o que você fizer, é ilegal". Ou você sente que é o alvo, porque é de certa área e está usando certas roupas. Você é daqueles que são baleados pela polícia em plena luz do dia e vê os banqueiros da cidade cometendo todo tipo de crime hediondo, e eles são perdoados, tolerados e até encorajados. Isso tudo acontece num clima de escândalo às custas dos políticos, das escutas e assim por diante. As pessoas veem essas coisas. Logo, o que acontece com essa raiva? Isso continua ali.
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MKH: Eles não dão a mínima mesmo, entende? É frustrante. Uma revolta pode acontece a qualquer minuto porque as pessoas continuam putas. Você ouve as pessoas dizendo: "Se não gosta daqui, volte pro seu país. Volte pro lugar de onde os negros vêm". É essa a atitude delas. Os políticos e o resto, todos compartilham a mesma atitude.Mark Duggan era mestiço, porém é fácil ver que ele era definido como "negro" pela mídia. Até que extensão essa situação foi definida pelo racismo?
KH: Isso está lá. No meu trabalho, eu podia ser o cara mais trabalhador de todos, mas, por causa da minha cor, eu não me encaixava – ele era branco e eu, não –, eu não era promovido. Todo dia da minha vida, sinto isso na escola, nas pessoas passando pela rua. Passo por uma mulher na rua, ela agarra sua bolsa e eu penso "Sério? Quando você olha para mim, o que você vê?". Racismo todo dia. É por isso que muitos de nós temos um chip implantado no ombro: temos sempre algo a provar para o homem branco. Por que isso? É difícil.
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GA: No geral, esse não é um filme anti-establishment. Em certo sentido, ele também é dirigido para aqueles sob risco de se envolverem em criminalidade ou gangues – ou de se tornarem vítimas da violência policial. Eles vão escutar pessoas que estiveram ali, fizeram isso, com quem eles podem se identificar. É muito fácil alguém ficar em frente ao nº 10 de Downing Street e pregar, porém, para os jovens com certas origens – seja Broadwater Farm ou outro lugar –, eles vão olhar essa pessoa e falar: "Você não sabe de onde eu vim. Por que vou te escutar?". Além disso, uma das mensagens centrais do filme é "Mude a si mesmo, faça alguma coisa".
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GA: Bom, a polícia e membros-chave da comunidade precisam se juntar para ter um diálogo sobre como consertar o problema, porque houve um colapso nesse relacionamento. A polícia está ali para proteger e servir; assim, é importante para ela, assim como para a comunidade, reparar essa relação, ou eventos como o de 2011 vão acontecer de novo.The Hard Stop estreou no BFI London Film Festival no dia 17 outubro.Siga o Ashley no Twitter.Tradução: Marina Schnoor.Siga a VICE Brasil no_ Facebook, Twitter e Instagram_.