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Entretenimento

Por dentro da mente do maior jogador de pinball do mundo

Após a recente conquista do título mundial da modalidade, conversamos com Robert Gagno e os dois cineastas responsáveis pelo documentário 'Wizard Mode', que conta a trajetória do jogador até o topo.
LM
Traduzido por Lucas Messias

Assistir ao campeão mundial Robert Gagno jogar o pinball de South Park é como assistir a uma bela e intrigante queima de fogos, só que com peidos altos. Ele guia múltiplas bolas para os cantos, ocasionalmente dando catucadas na máquina para que elas caiam no flipper da máquina de pinball, o que impossibilita uma queda suave. Isso faria ambos Terrance & Philip dançarem e defecarem na máquina de pontos brilhantes.

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Eu conheci Gagno numa loja de skate em Vancouver na qual tem algumas das suas máquinas de pinball preferidas da cidade: Metallica, NBA Fastbreak e Exterminador do Futuro 3. Esses são alguns dos jogos que ele jogou pra garantir o seu primeiro título de campeão mundial de pinball em Pittsburgh no começo deste mês. "Eu me senti incrível finalmente levando o título pra casa," diz ele, "é um troféu bem, bem grande, tipo 15 quilos".

Gango me disse que o pinball está fazendo "voltando para ficar", uma teoria que muitos gamers tem comparado com o retorno do vinil na música.

Para Gagno, foi um caminho longo até o topo, seis anos competindo em torneios mundiais, e por mais de uma década praticando na sua própria coleção de máquinas na sua casa em Burnaby, CB. Durante os últimos dois anos, ele tem tido o desafio extra de compartilhar cada passo da sua aventura com os cineastas Nathan Drillot e Jeff Petry, resultando no documentário Wizard Mode, que estreia em Hot Docs em Toronto dia 2 de maio e uma semana depois vai passar também no Festival DOXA em Vancouver, Canadá. Gagno não só abre o jogo sobre os altos e baixos do pinball competitivo, mas também sua busca pela independência sendo um autista de 27 anos. Além de tudo, o filme é sobre a vontade humana de melhorar e vencer, dando um estímulo de emoção que é muito, muito contagiante.

O estilo de jogar do Gagno imediatamente o faz ganhar amigos e espectadores. Quando ele está jogando bem, ele bota abaixa a jaqueta até metade dos braços dele e fica em silêncio, mesmo quando os clientes das lojas de arcade vão torcer por ele ou o perguntar coisas. "Eu tento pensar: Eu realmente consigo jogar com multi-bolas? Ou eu procuro outro jeito de deixar somente aquela bola em jogo?" ele fala sobre sua estratégia. Ele também usa um headphone que é marca registrada dele, que faz ele não se distrair. "Qualquer sequência que eu estiver fazendo com tranquilidade, eu vejo como a maximizar e botar isso em prática."

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Eu começo um jogo na máquina que está do lado do Gagno, mas inevitavelmente eu perco todas minhas três bolas antes mesmo dele perder a primeira. Minha tentativa de fazer a bola continuar em jogo dando pequenas balançadas na máquina fez com que a bola ficasse presa atrás de uma poltrona da Família Addams. Eu ainda estou longe de chegar ao modo de jogar no qual Drillot e Petry chamam de "modo de sobrevivência", eu preciso trabalhar em apreciar a visão ampla e metódica de Gagno no jogo.

"Quando a gente começou a fazer o filme, eu tinha jogado poucos jogos na minha vida," diz Drillot. "Você começa a perceber que jogos tem um complexo enorme de regras e objetivos, e tem uma ordem na qual você deve fazer as coisas… quando você percebe como deve fazer, mesmo que já no começo, tudo fica bem recompensador." No filme você pode ver alguns jogadores que tem a mesma estratégia e habilidades de resolver situações complicadas em ação, às vezes também somada com conseguir um emprego, fazer amigos, ou se mudar para o desconhecido em uma nova cidade. Nesses momentos você não pode fazer nada além de sentir uma subida de nível ou um multiplicador de bônus cada vez que Gagno desbloqueia uma nova conquista na vida.

Eu me identifico especialmente com uma das pequenas, mas importantes conquistas do Gagno: fazer as próprias regras dele de quando abraçar, como abraçar, e quando apertar mãos. Isso é algo que misteriosamente me confunde, e quando eu converso sobre isso com Petry e Drillot eles compartilham exemplos das próprias histórias deles. "Eu entendi a mania do Robert com o complexo de abraços quando eu fui morar pela primeira vez na Europa e tentei descobrir quando beijar as pessoas duas vezes, ou uma, na boca, abraçar ou só apertar as mãos" se lembra Petry. "Houve vários momentos desconfortáveis."

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Os cineastas Drillot e Petry falam que foi esse tipo de experiência compartilhada que os ajudou a tirar o peso do ar e ir além do preconceito com autismo, ideias erradas e estigmas que acompanham o autismo. "Não é como se a gente tivesse tido muita experiência quando o assunto se tratava de autismo." Diz Drillot. "Quanto mais tempo passamos com Robert, mais percebemos que não deveríamos nos preocupar com aquilo. O que Robert realmente liga é pras pessoas tratarem e interagirem ele como uma pessoa normal acima de tudo."

Demorou um bom tempo pros cineastas chegarem nesse tipo de perspectiva, mas Petry diz que um dos objetivos do filme é compartilhar essa experiência mais abertamente. "O que nós esperamos é que o público do filme seja levado pela mesma trajetória que nós fomos, na qual encontramos essa pessoa que era rotulada, e então lentamente perceber que existe uma pessoa ali no fim das contas", ele diz. "E um amigo também, porque ele é cativante."

Petry e Drillot vão ter o seu próprio momento para subir de nível, estreando um longa-metragem em um festival pela primeira vez. Mas é essa amizade, diz Petry, que é a verdadeira conquista.

"Nós percebemos assim que começamos o projeto que nós não iriamos só gravar e depois sair sem conhecer Robert. Nós iriamos construir uma relação tanto criativa quanto muito pessoal com ele." Ele diz. "Isso foi um aspecto realmente recompensador disso."

Agora que ele tem o título de Campeão Mundial de Pinball, Gagno pode focar em terminar outros níveis da vida dele. "Eu quero viver na minha própria casa um dia, talvez ter um parceiro de quarto, também", ele me conta. "E também cozinhar minhas próprias coisas, lavar minhas próprias roupas."

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