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Tecnologia

​Aprender a Programar Pode Retardar o Alzheimer?

Pesquisadores sugerem que sim.
Cena de Swordfish; o filme não é muito bem recebido por público e crítica, mas tem Hugh Jackman programando como se um Alzheimer fosse acometê-lo a qualquer momento

Para o desenvolvedor de software colombiano Gregorio Rojas, 40, que chegou ainda criança à cidade de Lowell, em Massachusetts, nos Estados Unidos, aprender a programar é muito parecido com adquirir conhecimento do idioma inglês. "Quando comecei a falar inglês eu sabia o que queria dizer, mas nem sempre saía como pensava", diz, citando a falta de vocabulário e os erros de pronúncia e grafia como obstáculos. "Acontece o mesmo na programação: você acaba escrevendo algo diferente do que você pretendia, e o computador não faz o que você quer."

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A sensação de Rojas, hoje fluente nas línguas de Shakespeare e dos computadores, faz bastante sentido. De acordo com nova pesquisa, nosso cérebro processa as linguagens falada e de programação de forma bem similar. Isso significa, sem qualquer licença poética, que os programadores adquirem os mesmos benefícios da condição de bilíngue — como retardar o início da doença de Alzheimer.

O Alzheimer é uma doença degenerativa do cérebro que afeta em torno de 30 milhões de pessoas, segundo a Organização Mundial de Saúde. É a forma de demência mais comum e se caracteriza pela perda de memória, de linguagem, de resolução de problemas e de outras habilidades cognitivas. A doença é fatal e, ainda que não haja uma causa específica, os fatores de risco incluem idade, certas mutações genéticas, níveis baixos de educação formal e de comprometimento social e cognitivos.

"Se o cérebro bilíngue começa a se degenerar, ele tem mais reserva para suprimir os sintomas."

Vários estudos mostraram que ser bilíngue ou multilíngue retarda de forma significativa a manifestação do Alzheimer, já que os cérebros de quem fala mais de uma língua têm grandes capacidades de adaptação e funcionalidade.

A questão dessa proteção contra a demência diz respeito à reserva cognitiva, isto é, se nosso cérebro está "em forma" para lidar com o envelhecimento, afirma Evy Woumans, autora de um dos estudos bilíngues. Ela descobriu que, das 134 pessoas estudadas, os sujeitos bilíngues manifestaram o Alzheimer 4 anos e meio depois os monolíngues.

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Cérebros bilíngues praticam exercício a mais porque nunca desligam o mecanismo do outro idioma, diz Woumans. "Os bilíngues não podem desativar um de seus idiomas enquanto conversam", ela disse ao Motherboard. "Em outras palavras, os dois idiomas estão constantemente e simultaneamente ativados, o que indica um tipo de exercício mental."

As pessoas que falam duas línguas têm mais densidade de substância cinzenta e mais integridade de substância branca (entenda: conexões melhores) no cérebro do que os monolíngues, o que os auxilia a retardar o processo de envelhecimento.

"Se o cérebro bilíngue começa a se degenerar, ele tem mais reserva para suprimir os sintomas. É possível comparar ao levantamento de peso. Peça a um fisiculturista para levantar 60 quilos com uma mão e ele conseguirá, mesmo se estiver doente ou gripado. Peça a uma pessoa normal, de físico mediano e saudável, para fazer o mesmo, e ela terá muita dificuldade."

Saber múltiplas linguagens de programação pode ter o mesmo efeito, assim como saber diversos idiomas, ela disse — o que significa que aprender a programar em código também poderia retardar o Alzheimer.

Ela não está só na teoria. Muitos pesquisadores suspeitam que aprender a programar em código pode ter efeitos benéficos para o cérebro em envelhecimento. A professora Janet Siegmund, da Universidade de Passau, executou exames de ressonância magnética em 17 voluntários enquanto estes liam fragmentos de código para um estudo em 2014. "Descobrimos a primeira evidência empírica de que tanto a linguagem natural quanto a de programação exigem as mesmas áreas do cérebro", afirmou. "Com base nisso, podemos inferir que a compreensão das linguagens de programação e os idiomas naturais parecer similares."

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As duas linguagens exigem o processamento de símbolos e gramática, afirmou Siegmund. A diferença é que somos programados para aprender a linguagem falada quando nascemos, o que não acontece com as linguagens de programação. (Além disso, aprender a escrever em programação é completamente diferente de se expressar em qualquer idioma.)

Siegmund espera continuar sua pesquisa por meio do uso de outras técnicas de neuroimagem, tais como eletroencefalograma, ressonância magnética e EMT. Ela crê que há muito mais a ser descoberto. Exemplo: é comparável, no cérebro, alguém ser bilíngue em um idioma e programar em outra? Quão cedo uma pessoa deve aprender linguagens de programação para que o efeito seja semelhante ao de saber um idioma? Deve-se aprender outro idioma durante o crescimento para retardar o início do Alzheimer?

Já Woumans continua seu trabalho para verificar o avanço do Alzheimer em monolíngues e bilíngues, e também para ver se o bilinguismo pode ser usado como terapia para "manter o cérebro jovem e saudável". Ela ainda não está pronta para afirmar se as linguagens de programação têm o mesmo efeito que as línguas faladas para os bilíngues. (Mas tende a achar que sim.)

"Podemos deduzir que a inibição é a chave para o treinamento do cérebro e o início retardado do Alzheimer", ela disse. "Então, de forma hipotética, se você conhece várias linguagens de programação diferentes e precisa inibir uma para aplicar outra, é possível que elas tenham um efeito semelhante."

Rojas, o programador colombiano, está convencido das semelhanças entre a linguagem falada e a programação. Ele é cofundados da Sabio.la, um campo de treinamento de desenvolvedores voltado para as minorias sem representatividade de Los Angeles e passa bastante tempo tentando descobrir como traduzir seus pensamentos em linguagens para humanos e para computadores.

"Aprendi linguagem de programação da mesma forma como aprendi espanhol e inglês. Pratiquei bastante para que eu pudesse ter um domínio prático, então trabalhei para aprimorá-la."

Se isso significa que Rojas está imune ou resistente ao Alzheimer? Ele e os cientistas não podem afirmar, mas todos esperam que sim.

Tradução: Amanda Guizzo Zampieri