Matt Pike fala sobre os lisérgicos bastidores de "Dopesmoker" do Sleep

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Matt Pike fala sobre os lisérgicos bastidores de "Dopesmoker" do Sleep

"Não sei se você já fumou um com um cálice de coco, mas te digo uma coisa: você esquece seu nome, seu endereço, troca ideia com o cachorro."

Este artigo faz parte da série "Qual que é dessa sonzera aí?" (tradução livre, belê?) do Noisey Austrália. Nela, os australianos se aprofundam na história das faixas favoritas da galera. Leia a coluna original aqui.

Passam-se mais de oito minutos de riffs de afinação baixa se revelando lentamente antes de Al Cisneros, do Sleep, cantar o primeiro verso de "Dopesmoker". Passam-se mais quinze segundos antes dele completar este mesmo verso: "Drop out of life / with bong in hand."

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O Sleep nunca teve pressa pra compor ou lançar material, mas nem mesmo o trio de doom metal de San José poderia prever os atrasos que impediriam que sua obra-prima logo visse a luz do dia. Após quase três anos de composições e gravações, sua gravadora, London Records, se recusou a lançar o registro, uma única faixa de 63 minutos sobre um grupo de pregadores da maconha atravessando a terra sagrada numa caravana fumacenta.

Foi tanto estresse que a banda acabou. Matt Pike, guitarrista, formou o High on Fire, enquanto Al e o baterista Chris Hakius tiraram férias de cinco anos da música. Uma versão editada do disco foi lançada em 1999 sob o nome Jerusalem, em que a faixa original foi dividida em diversas outras. Em 2003, a TeePee lançou uma versão mais razoável, de 63 minutos. Em 2012, três anos após a volta da banda, a Southern Lord lançou versão remasterizada do disco, a coisa mais próxima de uma edição definitiva que já vimos. Por mais que seja a voz de Al que surja sobre os riffs colossais do Sleep, o guitarrista eternamente descamisado Matt Pike tornou-se a face mais conhecida da banda. Conversamos com ele sobre as origens do trabalho mais ambicioso do Sleep.

Noisey: Como "Dopesmoker" nasceu?

Matt Pike: Quando começamos a compô-la, Al e Chris eram mais novos, havíamos sido contratados por uma grande gravadora que queria faixas menores que poderiam colocar na rádio, o que não curtíamos muito. Estávamos fumando maconha pra caralho, eu e Al tomávamos ácido e fazíamos um monte de doideira. Queríamos criar algo épico e atemporal, coisa que as pessoas comentariam por sabe deus quantos anos. Queríamos uma sinfonia de riffs inteiramente emaconhados.

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Ainda não havíamos assinado com a London Records, mas estávamos tendo problemas com a gravadora da época, a qual não posso mencionar o nome, e os caras meio que colocaram a gente de castigo. Ficamos o tempo todo na merda. Ensaiávamos todos os dias, acordávamos, tomávamos um café, estourávamos um banza e criávamos. Isso aí durou uns dois anos. Fizemos tanta coisa que chegamos ao ponto de pensar em fazer uma faixa só longa pra caralho, mandando a real mesmo. Quando for tocar ao vivo, é só dá-lhe mesmo, sem parar pra dar oi. Só tocar e vazar.

Vocês imaginariam que viraria esse épico de uma hora?
De jeito nenhum. E a London engavetou tudo. Foi tipo, mano, fizemos uma obra-prima que acreditamos que a galera iria pirar. Eu sabia do valor daquilo. Não sei se gravamos tudo que queríamos, mas ficou daquele jeito mesmo. Não existe arte dispensável ou destrutível, mas acho que aquilo ali bateu mais forte do que esperávamos. Não sabíamos se tínhamos um feito em mãos ou não. Rolou um monte de bosta na época, minha mãe estava morrendo, era muita coisa. Demoramos alguns anos compondo-a, e quando finalmente ficou pronta, engavetaram. Parecia que alguém tinha cagado no nosso sucrilhos.

Rolava algo de religioso ou ritualístico em meio à composição e gravação?
Não sei se diria religioso, mas definitivamente passávamos por um momento espiritual naquela época. Tinha muito a ver com nossos corações e mentes bem como no aspecto técnico, talvez até além disso. O lance mesmo era como nos sentíamos e escrever sobre aquilo, o que vivíamos, e as metáforas. Nós vivíamos aquelas metáforas. Todos fumávamos maconha, usávamos ácido, essas coisas. Vivemos aquilo, meu irmão. Foi um momento da vida em que fumei maconha como nunca, ao ponto de deixar de fumar por uns anos. Agora temos esses produtos comestíveis, daí eu como maconha.

Vocês gastaram a grana da London Records em maconha?
Não tudo. Compramos uns amplis verdes, maconha e pagamos a gravação. É, compramos maconha pra caralho. Cada um da banda tinha uns 850 gramas de erva de tudo que é tipo. Nem sei se rolava tanto aquele papo de clonagem naquela época. A galera cultivava tudo que é tipo de erva e a gente tinha todas elas. Ficávamos ali, consagrando o dia inteiro. Não sei se você já fumou um com um cálice de coco, mas meu irmãozinho, é a chapação mais bruta possível. Você esquece seu nome, seu endereço, troca uma ideia com o cachorro e o cachorro responde. É bizarro.

O que você acha do legado desta música?
É estonteante e surpreendente. Na real foi uma benção também porque aí pudemos tocar todas as músicas antigas também e ter alguma relevância, meio que sendo bem-sucedidos no que fazemos. Toco com meus irmãos, tiro uma graninha, subo no palco e me divirto demais, ficamos o dia inteiro falando merda. É maravilhoso e nem todo mundo tem essa sorte.

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