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Vivi Como se Fosse 1996 Por Uma Semana

Eu me proibi de usar todas as invenções tecnológicas pós-1996 durante uma semana. Nada de celular, computador, internet, DVDs ou iPhone — não vou fazer uma lista superdetalhada, mas não sobrou quase nada. Tive que me forçar a ouvir No Doubt.

Fotos por Michael Sedbon.

No último ano, as revistas bombardearam a gente com "o retorno dos anos 1990". Roupas, arte, música: tudo passando de novo pela porta giratória da moda. Que merda é essa? Sério, quem quer voltar para uma época em que o único aspecto positivo era que as pessoas dos anos 1980 podiam relembrar sua juventude? Nasci em 1993 e não dou a mínima para isso.

Naquela época, as crianças brincavam com Tazos, cartas do Pokémon e Bichinhos Virtuais. Os computadores eram mais burros do que os humanos e a internet era composta por uns três mil nerds. Celulares até existiam, mas ninguém tinha — fora aquele seu tio metido a besta.

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Adolescentes e jovens de 20 e poucos anos viviam com pouco: assistindo filmes em VHS, jogando video games velhos, planejando a balada pelo telefone fixo dos pais e indo ao cinema sempre que possível. Não tinha nada de muito fantástico acontecendo. Então, do que as pessoas têm tanta saudade afinal de contas? Era o que eu queria descobrir.

Eu me proibi de usar todas as invenções tecnológicas pós-1996 durante uma semana. Isso mesmo, SETE dias. Nada de celular, computador, internet, DVDs ou iPhone — não vou fazer uma lista superdetalhada, mas não sobrou quase nada. Tive que me forçar a ouvir No Doubt. Nunca vivi desse jeito. Eu não tinha ideia de como lidar com o tédio.

Para diversão, só me permiti usar um console de videogame old school, um videocassete recém-comprado e — bom, só isso. Depois, respirei fundo e mandei uma última mensagem de texto aos amigos, dizendo que não estaria disponível na próxima semana. Desliguei meu iPhone e segui com a vida.

Progresso.

SEGUNDA-FEIRA

Primeira observação: como vivo perdendo meu celular, viver desconectada do mundo é bem normal para mim. Mas a música foi a primeira coisa que azedou; arranjei um Discman maior do que o Torá e as pessoas me olhavam feio quando viam que eu mudava a música para Elastica.

O dia passou mais ou menos normalmente. Não senti necessidade de mandar nenhuma mensagem ou de falar merda no Facebook. Enquanto eu jantava, meu telefone tocou. Por reflexo, não atendi — sempre digo que se uma pessoa quiser me encontrar, ela deve ligar para meu celular. Esse é o problema quando você não tem celular. Pluguei meu video game numa daquelas TVs gordas e quadradas para jogar Mario Kart, mas a TV não tinha controle remoto.

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Em tempos normais, eu simplesmente procuraria como resolver esse problema num fórum da internet, mas 1996 não era um tempo normal. Então pensei, OK — vou usar o videocassete. Foi aí que percebi que tinham me vendido o videocassete SEM O CABO. Eu quis matar o babaca que me vendeu um videocassete sem cabo. Isso durou uns bons cinco minutos, aí eu decidi fazer outra coisa: dormir. Segunda observação: em 1996, tudo era mais complicado.

Nota para meu pai, se ele estiver lendo isto: durante anos, você me encheu o saco por viver na minha bolha do presente: "Um dia, você vai ver, essas coisas vão te deixar na mão, Wallis". Esse dia chegou.

TERÇA-FEIRA

Viver sem internet não é muito prático. Assim como viver sem celular. Eram três e meia da tarde e eu tinha que voltar rapidamente para o escritório, mas todos os cinco trens do metrô de Paris estavam parados por causa de um pacote suspeito. Eu queria pegar meu celular e procurar uma rota alternativa pelo RATP — a invenção do século! — ou acessar o Vélib (um serviço popular de aluguel de bicicletas) ou usar o GPS, mas eu não podia. Eu também queria ligar para meu chefe e dizer que chegaria atrasada — mas não, não em 1996.

Perguntei aos outros passageiros onde eu podia pegar um ônibus para East Bridge. Em 1996, todo mundo tinha um jeito diferente de chegar a seu destino. Segui a opinião da maioria. O ponto de ônibus em questão foi impossível de achar e eu me perdi. Quando finalmente cheguei ao escritório, meu chefe gritou comigo.

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Em casa, meu computador ficava me tentando. Eu sentia saudade dele. Ou, não só do computador, mas da suavidade fria da era digital. Eu só queria sentar minha bunda na frente de um filme ou de um programa de TV até tudo passar. Nos anos 1990, as pessoas ainda tinham coisas para fazer.

QUARTA-FEIRA

Pela manhã, antes de ir ao escritório, eu tinha uma consulta com o dentista — ah, que felicidade! O metrô estava parado de novo, por causa de outro pacote suspeito. É sério, tenho muito azar, a menos que realmente houvesse um ressurgimento do terrorismo em Paris naquela semana em particular. Em 1996, sempre havia uma cabine telefônica por perto — o que era legal, mas elas desapareceram desde então.

Sem internet, é difícil fazer qualquer coisa de última hora. Tudo tem que ser planejado com antecedência. Não dá para "esperar e ver o que acontece". No século XX, os planos realmente significavam alguma coisa.

Cansada de viver como uma reclusa, liguei para duas amigas que tinham telefone fixo para ver se elas queriam passar algumas horas no mundo real. Conversamos como se estivéssemos em um episódio de Daria, depois desligamos.

QUINTA-FEIRA

Caramba, como eu sentia falta da internet. Sempre achei o Facebook inútil até ter que viver sem ele. Eu queria tanto que as pessoas comentassem as minhas fotos, eu queria "curtir" minha rede social em toda sua inutilidade. É a maneira mais prática de conversar com as pessoas do tecido da sua existência. Senti saudades do Facebook. Eu queria fazer amor com o Facebook. Estou focando no Facebook, mas era com a internet em si que eu queria trocar fluidos. Em vez disso, eu me encontrei com alguns amigos na vida real, como os estudantes antes de mim faziam.

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SEXTA-FEIRA

Na noite anterior, esqueci meu casaco num clube. Enfrentando a impossibilidade de encontrar o número do lugar na internet, decidi dar uma passada lá. Quando cheguei, o clube estava fechado. Era muito cedo. Então decidi voltar lá outra hora. Assim, entendi o conceito francês do século XX: cuide de tudo uma outra hora.

Temi a chegada do fim de semana como nenhum outro momento da semana. Eu sabia que ia querer ligar para um monte de gente, mas eu não tinha o número de ninguém e não podia simplesmente ver o que as pessoas estavam fazendo no Facebook. "Coragem, Wallis — faltam só 48 horas", eu ficava me dizendo e pensei no quão libertador era não ser perturbada. Depois pensei: "48 horas é muito tempo". Porra, é sexta-feira, dia de fazer coisas, beber drinques baratos e dançar música repetitiva. Eu me senti perdida, mas, às vezes, é libertador não poder ser encontrada.

SÁBADO

Não aconteceu nada de especial. Nada especial acontecia nos sábados há 17 anos; as pessoas ouviam Prodigy para passar o tempo. Fiquei com muita vontade de comer comida mexicana no almoço, mas como eu não conhecia nenhum restaurante mexicano perto da minha casa e estava sem a internet para me ajudar, nada de fajitas para mim. Fiquei enfurnada em casa até o domingo, lendo coisas tristes.

DOMINGO, DIA

O último dia no inferno. Fui devolver a TV para a dona. Eu não ia sentir falta dela. O trambolho foi inútil mesmo. Quando encontrei a dona, reclamei da falta de controle remoto. Ela me disse que não precisava do controle para mudar os canais. Eu me senti uma idiota. Depois peguei o metrô com meu Discman tijolo.

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DOMINGO, MEIA-NOITE

Recuperei meu celular e pude finalmente voltar à internet, mas num computador velho, já que o outro tinha sido confiscado por meu editor. Eu tinha tantas notificações no Facebook, mas tantas, que tive que deixar para vê-las em outra hora. Mandei mensagens. Mandei emoticons. Conversei usando matéria invisível — eu estava de volta ao século XXI.

No final das contas, não tive nenhuma revelação. Nenhuma epifania que abrisse meus olhos para o vácuo causado pela tecnologia e não foi como se eu decidisse não voltar aos dias modernos. Só acho que é legal ficar sozinha de vez em quando. Até isso ficar chato.

O maior problema hoje em dia é que ninguém pode viver sem internet, Facebook, celular e coisas assim. Especialmente eu. Todo mundo quer oferecer suas opiniões, falar com as outras pessoas e ninguém consegue fazer nada sem a ajuda de um fórum. O Facebook tornou todo mundo infeliz. É, isso é um saco. Mas eu garanto a você que também é um saco não poder achar um restaurante mexicano quando você está morrendo de fome.

P.S.: Para todos que ainda desejam desaparecer da internet, é sempre possível usar o Freedom. Só ele pode te ajudar.

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