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Identidade

Conheça o fisiculturista trans treinando para competições masculinas de fitness

Aryan Pasha sempre soube que era um menino, mas as outras pessoas levaram mais tempo para reconhecer isso.

Aryan Pasha tinha seis anos quando disse para os pais que se recusava a ir para a escola num uniforme de menina. “Eu era um menino, por que tinha que usar uniforme de menina?”, ele contou a VICE. “Ninguém sabia que eu era menina na minha escola. Me passei por menino por 19 anos.”

Pasha começou a transição quando tinha 19 anos. Agora, aos 26, o advogado recentemente largou seu emprego para se preparar para a Transman Bodybuilding Competition nos EUA. Mas ele ainda não conseguiu o visto.

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A VICE se encontrou com Pasha em sua segunda casa – a academia – para falar sobre identidade, seu amor por esportes e seus arrependimentos.

VICE: Você sabia que era menino desde pequeno. Como foi a escola como resultado disso?

Aryan Pasha: Meu nome era Nyla Pasha, mas por causa da enorme população Punjabi lá, eles me chamavam de Nehla.

Fui campeão de patinação. Mas como estava listado como “mulher” nos documentos oficiais, eu estava no time feminino. Patinar era minha paixão. Meu treinador sabia sobre mim, então sempre que eu me trocava para uma apresentação, ele trancava o resto do time em outra sala. Para preservar minha identidade delas.

Você assumiu sua identidade desde cedo?

Sempre usei o banheiro masculino. Era muito difícil, eu tinha que ter certeza que mais ninguém estava lá, como depois do recreio. Quando todo mundo estava sentado na sala de aula, eu escapava. Como em todo lugar, o banheiro dos meninos era notório. Eles te empurravam, ficavam espiando pela fechadura ou batiam nas portas. Sempre tive que ter cuidado.

E como foi a adolescência para você?

Eu sempre soube que era um menino. Na adolescência, percebi as maneiras como eu era diferente dos outros meninos. Não há muita diferença entre meninos e meninas até a puberdade, mas depois disso, percebi que tinha algo errado. Aquilo não era eu. Não era assim que um menino cresce. Comecei a perceber que tinha que fazer alguma coisa.

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Menstruei por quase seis anos – essa era a pior parte. Mesmo sangrando, eu agia como menino e andava com outros meninos o dia inteiro. Eu era um atleta, então viajava com a minha equipe. Eu tinha que esconder os absorventes de todo mundo.

Mesmo agora, não consigo acreditar que vivi assim. Essa é uma das coisas de que não gosto de falar.

Você se masturbava antes da transição?

Nunca. Você fala sobre masturbação, mas eu nem me olhava nu no espelho. Era desconfortável, nojento e deprimente.

Como sua família se sentiu com sua decisão?

Todo mundo ao meu redor me viu crescendo como um menino. Então quando decidi fazer a cirurgia, não foi um choque. Foi uma coisa gradual para eles.

Minha família sempre me apoiou muito. Eles nunca me obrigaram a nada – eles me deixaram escolher. No começo meu pai achou que era só uma fase. Meus irmãos nunca me trataram como outra pessoa, eles sempre me viram como o irmão mais velho.

Minha madrasta estudou psicologia, e foi ela que me explicou tudo sobre a cirurgia. Ela sempre me encorajou, mas nunca me pressionou para fazer nada.

Você sempre foi tão aberto sobre sua transição?

Quando meus amigos mais próximos ficaram sabendo sobre mim, alguns deles começaram a falar merda pelas minhas costas. Meu melhor amigo chegou para a minha namorada e disse “Estou aqui, por que você está namorando aquele chhakka [hermafrodita]?”. Foi horrível.

Tem muito estigma cercando a cultura trans. Mas não me importo, Mujhe koi bole toh, faad dunga [diga alguma coisa e eu te parto no meio].

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Não entrei para a Universidade de Deli por causa da minha transição. Um dos meus formulários da faculdade dizia mulher enquanto outro dizia homem. Eles não entenderam, e eu não podia explicar. Isso foi em 2011, e o julgamento NALSA ainda não tinha acontecido.

Agora a situação é diferente, apesar da lei ainda não estar pronta, a decisão está aqui. Ab toh kisi ke bhi muh par fekk kar mar do judgement [Posso jogar esse julgamento na cara de qualquer um]. Quero que o governo e a Constituição da Índia protejam nossos direitos, e cubram nossas despesas médicas. Nenhum plano de saúde cobre essas cirurgias, eles as consideram cosméticas. Mas não é algo cosmético para as pessoas trans. Os hospitais públicos deveriam tratar esses casos de graça.

Você namorava antes da transição?

Fugi das garotas minha vida toda. Talvez porque eu não estava confortável naquele corpo, então não queria ficar perto delas.

Estou namorando uma mulher trans agora. Se consigo tirar minha camiseta na frente de dez pessoas, é por causa dela. É um relacionamento mais emocional que físico.

E quanto à sua carreira de fisiculturista?

Quero abrir minha própria franquia de academias ano que vem; espero que ela se espalhe pela nação em breve.

De representar a comunidade trans em competições masculinas de fitness, agora estou buscando as competições internacionais. Sei que posso ganhar num enfrentamento trans, mas quero competir contra outros homens. Por que me definir como homem trans quando sou homem?

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Agora estou me preparando para competir no MuscleMania Índia.

Você fez a transição quando era bem jovem, tem alguma coisa de que você se arrepende?

Não sou fértil. Fico desapontado em não ter congelado meus óvulos quando podia. Fiz a operação quando era bem novo, e não pensei nisso na época. Se eu pudesse voltar no tempo, eu congelaria meus óvulos.

Matéria originalmente publicada pela VICE Índia.

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