Quatro jornalistas foram mortos no Egito esta semana. Dezenas de outros estão sendo perseguidos e eu mesma – uma repórter relativamente jovem – já recebi ameaças de morte. Agora estou sendo seguida.Desde quarta-feira passada, tenho visto meus amigos mais próximos e colegas serem espancados e presos repetidamente enquanto lutam para cobrir a história que o governo do Egito preferia que o mundo ignorasse. Mais de 600 simpatizantes do presidente deposto Mohamed Morsi foram mortos no dia 14 de agosto quando as forças de segurança desocuparam à força o acampamento de protesto dentro da Praça Rabaa al Adawiya. Para isso, eles usaram tratores e armas.O impasse durou 10 horas; por volta das 15h, corpos e mais corpos se enfileiravam ao redor do hospital de campanha e mesmo dentro da mesquita da Rabaa. Simpatizantes da Irmandade Muçulmana dizem que foi um “massacre”. De acordo com a Human Rights Watch, foi o “incidente mais sério de assassinato em massa da história moderna do Egito”. Mas a maioria dos jornalistas só conseguiu assistir a isso de longe: a polícia e o exército bloquearam todo o local, e dispararam gás lacrimogêneo, chumbinho e munição real em qualquer um que tentasse entrar.Passei horas tentando achar uma rota segura, mas todas as ruas que levavam à praça estavam bloqueadas. Em vez de fazer meu trabalho, só consegui correr dos tiros e me agachar atrás de carros. No final do dia, três jornalistas, incluindo Mike Dean, o cinegrafista veterano da Sky News, foram mortos. Outro fotógrafo ainda está hospitalizado, com hemorragia interna e danos graves aos rins.E a situação só pode piorar. Politicamente, o país agora se encontra tão perigosamente polarizado que a cobertura em qualquer um dos lados é um convite a ataques. No domingo, recebi um aviso de que levaria “uma bala pelas costas” como resultado de meus artigos sobre os protestos pró-Morsi. O mais preocupante é que ele citava pessoas próximas a mim. Agora, vivo só com uma mochila, me escondendo em diferentes partes da cidade e sendo repetidamente seguida por um homem que aparenta ser do governo.A experiência tem sido emocionalmente corrosiva. É difícil tirar isso do pensamento e você respira paranoia sempre que anda pela cidade. E também parece incrivelmente ridícula. Ontem, meu stalker oficial teve que ficar chutando pedrinhas do lado de fora das lojas de cosmético do Cairo. Minha missão? Comprar uma escova de cabelo.A intimidação daqueles que desafiam a narrativa do Estado não é algo novo. Mas, neste caso, as autoridades egípcias estão sob tanta pressão para estabelecer uma opressão imediata às interpretações desses eventos desagregadores que a mídia se tornou o alvo mais óbvio. Os contatos e tradutores locais que apoiam nosso trabalho também não estão imunes. Meu tradutor está sendo chantageado por sua família. Ele tem recebido telefonemas do pai pedindo que ele abandone seu trabalho: “Ele disse que me amava e que não queria que eu me machucasse”, disse ele.No entanto, a ameaça não vem apenas das autoridades egípcias. Desde que os militares tomaram o controle do país, um nacionalismo agressivo ressurgiu e fez das ruas um lugar mais perigoso para estrangeiros, particularmente para quem trabalha com a mídia internacional que o governo rotulou como mentirosa. Grupos de vigilantes apoiados pelos militares têm se espalhado por toda a capital. Durante as manifestações pró-Irmandade, eles são levados para policiar as áreas ao redor, conferindo as identidades dos passantes e, em alguns casos, fazendo justiça com as próprias mãos.Na sexta-feira, assisti pela televisão quando a Al-Jazeera mostrou o momento em que o correspondente do Independent foi arrastado inconsciente pelo chão por uma multidão furiosa. Só pela misericórdia deles ele conseguiu escapar. Em muitos casos, a violência das multidões é tacitamente sancionada pelas forças de segurança egípcias. Já assisti às tropas armadas observarem os ataques do conforto de seus veículos blindados e, quando fui brevemente detida na quarta, cheguei a ouvir os oficiais discutirem meu destino com membros da multidão armada. “Vocês vão lidar com eles ou vão deixar isso com a gente?”, perguntou um homem, brandindo um cassetete para mim. “Vamos deixar eles saírem andando naquela direção”, respondeu o oficial, apontando para um grupo menor.A omissão em intervir na violência civil não é um fenômeno novo, e a polícia egípcia em geral ignora ataques sectários. No entanto, a negligência deles raramente ocorre tão à vista. O Serviço de Informação do Estado Egípcio reclama que a mídia internacional não está fazendo seu trabalho. Em um e-mail para os corresponde estrangeiros, eles disseram que a cobertura do golpe mês passado se “desviou da objetividade e da neutralidade”.“O Egito está descontente com algumas coberturas da mídia ocidental, tendenciosas à Irmandade Muçulmana, porém, cegas aos atos violentos de terror perpetrados pelo grupo”, escreveram eles. Com os jornalistas enfrentando cada vez mais ataques, tanto do Estado quanto das ruas, mostrar objetivamente o caos que vemos ao nosso redor está cada vez mais difícil.Mais crise no Egito:Protestos Continuam no Cairo Dividido pela GuerraVídeo do "Dia da Ira" da Irmandade Muçulmana
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