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Conheça a Rede Anarco-Niilista FAI

O modus operandi da FAI é de resistência violenta contra o que eles chamam de “Fortaleza Europeia”.

No dia 7 de maio de 2012, dois homens mascarados e armados emboscaram o CEO da empresa de engenharia nuclear Ansaldo Nucleare do lado de fora de sua casa na Itália. Assim que o alvo — Roberto Adinolfi, 56 anos — colocou os pés para fora da porta, os homens dispararam três tiros contra ele. Um deles acertou a rótula do joelho direito de Adinolfi. Os atiradores não eram simples extorsionários ou assassinos de aluguel da máfia, como se pensou inicialmente, mas membros de uma organização terrorista altamente organizada de esquerda chamada Federazione Anarquica Informale — a FAI.

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Depois que a FAI assumiu a autoria do ataque a Adinolfi, a grande mídia acabou atribuindo isso a um grupo de anarquistas esquentadinhos que tentam imitar as Brigadas Vermelhas – a Brigate Rosse marxista-leninista que causou estragos na Itália nos anos 1970 e 1980. Na realidade, atualmente a FAI não tem orientação marxista e afirmou através de uma fonte anônima que não possui nenhuma afiliação às Brigadas Vermelhas.

Minha fonte tomou diversas precauções e só se comunica comigo através de métodos virtualmente impossíveis de rastrear, me entregando secretamente literatura da FAI para pesquisa. Os membros do grupo são o tipo de gente com quem os agentes de segurança internacionais adorariam se sentar para uma conversinha franca. Por isso eles se preocupam tanto com policiais infiltrados e são muito cuidadosos para proteger a identidade de seus camaradas.

Como demostrado pelo joelho estourado de Adinolfi (que foi alvo do grupo por causa da ligação de sua companhia com o conglomerado de defesa italiano Finmeccanica, atualmente sob investigação por corrupção), o modus operandi da FAI é de resistência violenta contra o que eles chamam de “Fortaleza Europeia” — um termo do grupo para as forças injustas e opressivas que eles acreditam que comandam o continente.

Ao invés de distribuir panfletos pacificamente, eles escondem o rosto e empregam força total em ações diretas, o que dá para perceber pelos muitos ataques do grupo, como os atentados com bombas a bancos privados em Roma, o incêndio de torres de vigilância na Rússia e a destruição de linhas ferroviárias no Reino Unido. Eles também tentaram entregar cartas-bomba para membros do parlamento europeu, mas elas foram interceptadas ou não explodiram (uma tática de pânico intencional segundo a FAI).

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A polícia científica investiga a cena do crime Adinolfi.

Sendo uma organização informal sem líderes, hierarquia ou figuras proeminentes, às vezes pode ser difícil distinguir exatamente contra o que a FAI está lutando. Mas depois de ler centenas de páginas dos manifestos, memorandos, comunicados e transcrições de reuniões da FAI, me pareceu óbvio que o principal objetivo deles é destruir qualquer forma de estado ou liderança em toda a Europa.

Eles afirmam lutar ao lado dos pobres oprimidos em seus próprios países por acordos injustos de comércio exterior, por uma “verdadeira liberdade pessoal onde o indivíduo possa decidir seu próprio destino sem ter que ser governado por ninguém”. Eles acreditam que “a destruição total do mercado e da hierarquia” ajudaria a chegar aí. É claro que isso também poderia espalhar a fome e permitir a ação descontrolada de criminosos psicopatas — todo mundo já viu o filme do Batman —, mas o sentimento deles parece lidar apenas com a ideia da própria revolução, e não com suas consequências.

De acordo com os membros, a FAI não está aqui para fazer amigos ou ajudar a consertar a sociedade. Eles querem é “lutar continuamente para remover o status quo e para implementar uma sociedade nova e completamente livre”. A FAI acredita que a única maneira de concretizar esses ideais seja ter um mundo sem governo ou autoridade de nenhum tipo. No entanto, nenhuma solidariedade é mostrada por aqueles atualmente oprimidos que não estiverem prontos para o combate violento contra seus inimigos, o que, aparentemente, só colabora com a opressão que a FAI busca destruir.

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Em essência, a FAI é uma organização anarco-niilista. Os membros não estão nem aí para representar ou proteger ninguém do punho cruel da desigualdade. Eles não são o Hugo Chávez ou o Vladimir Lênin — eles não dão a mínima para a sua situação se você ficar de braços cruzados. Mas, se você está lutando como eles — se descruzar os braços para entregar uma carta bomba ou sacar uma pistola —, então eles estão do seu lado. Especialmente se o seu alvo for a “Fortaleza Europeia”.

Rescaldo de um ataque da FAI com bomba a um banco no Chile.

A história da FAI começou nos anos 1990, e eles são responsáveis por centenas de ataques violentos, de explosões de bancos no Chile até o incêndio de carros de parlamentares do partido conservador inglês e do prefeito de Bristol. Depois de estudar os materiais entregues a mim pela FAI, ainda não faço a menor ideia do que eles queriam com o prefeito de Bristol. E aparentemente nem ele, considerando suas declarações para o noticiário local, mas parece que seu Toyota Prius e o Ford Fiesta de sua esposa foram considerados parte da Fortaleza Europeia e tiveram que morrer no fogo niilista.

Embora tenha sido oficialmente fundada em 2003, o primeiro ataque reconhecido da FAI aconteceu em 1999, quando eles enviaram explosivos para a embaixada grega, um escritório de turismo em Madri e uma filial do Citibank em Barcelona. Os explosivos foram enviados pelo correio para mostrar solidariedade a um homem chamado Nikos Maziotis, hoje infame por causa de suas declarações na Corte Criminal de Atenas, depois de sua prisão por colocar uma bomba no Ministério da Indústria e Desenvolvimento grego em 12 de dezembro de 1997.

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Depois das cartas-bomba de 1999, as células da FAI mandaram uma corrente de explosivos incendiários para organizações e jornalistas como o jornal La Razón em Madri, a igreja de Sant'Ambrogio, o tribunal de Valência, a Catedral de Madri e para a Carabinieri (a polícia militar nacional da Itália) em Gênova, que detonou e feriu um dos policiais. Eles também enviaram “lotes de cocô de cachorro” para dois de seus alvos.

Esses ataques incendiários eram parte adicional da luta contra as prisões, mais especificamente as unidades de isolamento FIES. Essas unidades quase nunca são mencionadas pela mídia, talvez por serem blocos de isolamento brutal dentro das prisões espanholas, para onde detentos indisciplinados são mandados por meses e até anos. Elas passaram a ser a opção favorita das autoridades carcerárias para prisioneiros anarquistas e socialistas, muitos dos quais reportaram atos extremos e diários de tortura nas mãos dos guardas.

Esses blocos sombrios de isolamento funcionam como cadeias dentro das cadeias, operando abaixo do radar da Carta de Direitos Humanos da União Europeia, que a Espanha deveria seguir. Um anarquista chamado Gabriel Pombo da Silva (preso por trocar tiros com oficiais de fronteira na Alemanha) conseguiu escapar de uma dessas FIES em fevereiro de 2004, antes de escrever uma carta detalhando seu sofrimento lá. Apenas quatro meses depois, seu camarada anarquista Jose Antonio Cano se matou num desses blocos de isolamento em Barcelona, depois de ser supostamente torturado ali por 12 anos.

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Os ataques contra as FIES em sequência aos atentados com bomba de 1999, são apenas algumas das missões de sucesso da FAI. Dada a natureza descentralizada do grupo e a total falta de liderança ou hierarquia, a FAI coleciona um grande números de células associadas que estendem seus tentáculos por todo o planeta. Atos realizados pelos camaradas internacionais da FAI incluem o incêndio de uma escola na Indonésia (porque parece que “escolas são um tipo de prisão”), dois policiais baleados num ataque não-planejado na Grécia, e o incêndio de um centro de transmissão próximo de Bath no Reino Unido. Este último deixou 80 mil casas sem TV ou rádio e causou centenas de milhares de libras de prejuízo.

“A indústria do entretenimento é uma ferramenta importante de manipulação do comportamento humano”, diz a declaração que os responsáveis postaram online para assumir a responsabilidade pelo incêndio em Bath. “Sem um suprimento constante de distrações, seria muito mais difícil persuadir as pessoas de que suas vidas são satisfatórias.”

Eles dedicaram o ataque a um colega anarquista chamado Xosé Tarrío González, que morreu numa unidade de isolamento FIES em Corunha em 2005.

Gerasimos Tsakalos e Panagiotis Argirou, membros da CCF.

Os benefícios de se ter uma família vasta de células anarquistas é que os membros em potencial não precisam se encontrar ou formar uma ligação com ninguém da FAI para se juntar à luta. E, exatamente por causa disso, a FAI afirma que a polícia nunca conseguiu infiltrar agentes disfarçados na organização.

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Um dos associados mais notáveis da FAI é a Conspiração de Células de Fogo (CCF) da Grécia, que juntou forças com o grupo efetivamente em 2011, depois do julgamento envolvendo alguns de seus membros. Como a FAI fez antes deles, a CCF lançou sua primeira onda de ataques em 21 de janeiro de 2008, para mostrar solidariedade aos anarquistas detidos. Membros da CCF detonaram bombas de gás pelas cidades de Atenas e Thessaloniki. Showrooms de concessionárias de carros de luxo foram explodidos, e agências bancárias foram completamente destruídas.

A CCF decidiu não se esconder depois dessa primeira onda de destruição e passou a detonar bombas do lado de fora de delegacias de polícia em meio às revoltas na Grécia, colocar fogo nos andares mais altos do prédio do Rabobank em Utrecht, explodir o tribunal de Atenas, casas de políticos anti-imigração e o quartel-general do partido neonazista Aurora Dourada. Eles até mandaram explosivos para Angela Merkel, Silvio Berlusconi e outros chefes de estado europeus, mas esses foram interceptados — um lapso do CCF que você tem que perdoar, eles andaram muito ocupados.

O incêndio do prédio do Rabobank em Utrecht.

Em um dos documentos que li, o CCF repete a mesma mensagem da FAI: “A guerrilha finalmente escapou das páginas dos livros e tomou as ruas com ferocidade”, eles dizem. “A guerrilha urbana não oferece liberdade utópica. Ela permite acesso à liberdade imediata.”

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Depois dessa colaboração, a FAI e a CCF se tornaram mais fortes, mais que triplicando em tamanho e se tornando cada vez mais reconhecidas por sua resistência violenta na Europa e em boa parte do mundo. Mas apesar do tamanho dos grupos e de numerosos ataques internacionais, a FAI ainda não é reconhecida nos Estados Unidos. Os EUA têm um sistema de designação para Organizações Terroristas Estrangeiras (FTO, na sigla em inglês). Nas palavras deles, “as designações das FTO têm um papel crítico na nossa luta contra o terrorismo e são um meio efetivo de cercear o suporte de atividades terroristas”.

O motivo da FAI ainda não estar na lista se deve provavelmente ao fato de que — diferentemente das outras organizações terroristas no sistema FTO — eles ainda não mataram nenhum civil ou observador inocente. Entregadores de correspondência que acabam com as mãos queimadas pelos explosivos e trabalhadores de escritório que se cortam com estilhaços de vidro nos ataques com bomba são sem dúvida eventos perturbadores, mas provas sugerem que nenhum civil nunca foi realmente morto como resultado direto de um ataque de células da FAI.

Não que os membros da FAI sejam avessos à possibilidade de ter algum “efeito colateral” humano. Numa transcrição de reunião de 2006, os membros do grupo discutem sobre a possibilidade de ferir civis acidentalmente.

“Por que diabos eles [os anarquistas não-violentos] se importam com a segurança de um carteiro ou secretária toda vez que uma carta-bomba é enviada?”, diz alguém chamado Archimede Pitagorico. “Temos que mostrar que estamos falando sério, que não nos escondemos atrás de raciocínios tortuosos e que não temos nenhum problema em atacar mesmo com risco de vida!”

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Outro membro, chamado Paperina, diz: “Que retórica, porra!”

“Deixe-me concluir”, diz Pitagorico. “O problema é que temos muito escrúpulo e nunca vamos além. Temos que ser mais audaciosos com explosivos e não temos que pensar que podemos ferir uma secretária se o alvo é o chefe dela.”

“É uma questão de meios”, diz outro membro chamado Quo. “Temos que ser mais seletivos: armas ao invés de explosivos.”

A reunião continua discutindo sobre como os membros da FAI têm sido extremamente cuidadosos para não ferir civis, e que até “preservaram os culpados” quando se preocuparam com os inocentes.

Em qualquer grupo tão grande e geograficamente disperso como a FAI, conflitos de interesse e contradições podem aparecer de vez em quando. A mídia tem focado frequentemente nessas inconsistências em vez de se concentrar nas partes maiores do quebra-cabeça — o aumento dos atentados armados e com bomba, sem falar no que as evidências apontam: há um número cada vez maior de pessoas que se sentem oprimidas a ponto de pegar em armas.

Pichação do CCF.

Pode ser impossível entender completamente ou informar sobre a FAI com total precisão devido à natureza do grupo. Eles inclusive dizem que “todo material impresso, análise ou crítica que sai da FAI nunca será definitivo. Nossa federação informal está em constante evolução”.

A FAI é essencialmente o movimento sob o qual atual muitas dessas células anarquistas entrelaçadas de insurreição de esquerda — ela é para o CCF, o IRF e a Frente de Libertação da Terra, o que o PLO foi para a Al Fatah, o PFLP e o PDFLP nos anos 1970. Uma declaração de um membro da FAI arremata bem a mensagem, a luta e a formação da FAI: “Somos uma coisa só sem conhecer um ao outro. Dentro da nossa diversidade, somos a mão que vai arrebentar as correntes”.

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Uma cruz sendo derrubada na Rússia.

Mesmo que você não tenha ouvido falar disso ainda, a FAI já chacoalhou as correntes este ano. Pelo menos seis ataques foram realizados com sucesso só em janeiro. Incluindo um atentado incendiário com bomba a um banco na Rússia, ataques incendiários a casas de figuras políticas importantes na Indonésia e a derrubada de cruzes de madeira gigantes em Moscou.

Em contrapartida, as autoridades italianas intensificaram a batalha contra a FAI, lançando a chamada Operação Ardire. A Ardire incumbiu a polícia italiana de invadir casas de anarquistas suspeitos, arrancar essas pessoas da cama e jogá-las na cadeia. Blogueiros que simplesmente mostraram aprovação aos ataques da FAI foram presos. De acordo com a FAI, alguns dos detidos tiveram seus direitos básicos, como ligações telefônicas e visitas, negados.

Então não se engane com o silêncio da mídia. A FAI não é só um grupo de estudantes ativistas de meio período causando confusão nos finais de semana. Eles são uma rede subversiva de anarquistas comprometidos, estabelecidos e violentos. Se você observar o esforço atual do governo do Reino Unido para cortar benefícios enquanto permite transações globais que desviam milhões de libras de impostos corporativos, você vai entender por que os jovens britânicos e de outros países estão juntando forças com a FAI para tomar uma atitude.

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