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análise

Por que a direita está dominando o YouTube na gringa

E se o futuro é o vídeo, o que a esquerda pode aprender com isso.

(Foto acima: Paul Joseph Watson.)

Esta matéria foi originalmente publicada na VICE UK .

"O Twitter é uma pequena câmara de eco. Não sei se a esquerda entende a lavada monumental que está tomando no YouTube."

Esse é um tuíte postado pelo editor do InfoWars, Paul Joseph Watson, que você deve lembrar como o vlogueiro de direita que inadvertidamente prometeu para todo jornalista do mundo livre uma viagem para a Suécia.

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Como a maioria das coisas que o PJW diz, o tuíte foi imediata e amplamente zoado. Mas por mais divertido que seja tirar uma da cara do Watson, há um vazio curioso na coisa toda. Porque nesse assunto — diferente de no resto da vida — Paul Joseph Watson está certo.

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O twitter não é totalmente dominado pela esquerda, mas — fora Donald Trump e qualquer um com avatar de ovinho — visões de esquerda certamente são melhores representadas ali que em qualquer outra grande rede social. Ainda assim, o Twitter da esquerda não consegue se traduzir como influência no mundo real. Conversas no Twitter não são acessíveis para quem é de fora. O tropo da "câmara de eco" é preguiçoso e incorreto — pessoalmente, já aprendi muita coisa no Twitter, e muitas vezes isso levou a mudanças nas minhas visões políticas. Mas o que o Twitter faz melhor é refinar as visões das pessoas em conversas com gente que já compartilha as mesmas simpatias que elas. É uma ferramenta eficiente para arrastar os votos dos jovens trabalhadores ainda mais para a esquerda, talvez, mas não transforma eleitores do Trump em ativistas do Black Lives Matter.

No YouTube, em contraste, as vozes de esquerda são pouquíssimas — fora aquele molequinho comunista — enquanto as vozes da direita dominam. PJW é uma das principais, parado na frente de seu mapa-múndi e gritando com a internet da sala de casa; seu mentor, Alex Jones, o teórico da conspiração que curte surtar em frente às câmeras pensando em documentos secretos, é outra. Mas não é apenas o InfoWars, há todo um ecossistema de YouTubers da direita ali, tão sofisticado quanto a sociedade de vermes que você encontra embaixo de uma pedra, uma grande horda de adultos juvenis mal-amados repetindo por que precisamos parar a imigração; por que precisamos proibir pessoas trans nos banheiros; por que devemos matar todas as meninas assim que elas nascem.

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Os vídeos produzidos por essas pessoas são muitas coisas — "amadores" e "chatos pra caralho" estão entre as muitas descrições que uso. Mas são incrivelmente eficientes. Vamos encarar a verdade: qualquer um que consegue centenas de milhares de visualizações para um discurso inflamado de uma hora sobre Owen Jones é digno de, pelo menos, nosso interesses antropológico, se não nosso respeito.

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O exemplo mais famoso de visões de extrema-direita disseminados no YouTube é PewDiePie — a grande estrela do site, liderando um público de literalmente milhões de moleques impressionáveis, que por alguma razão querem assistir o cara jogando videogame. Ele foi dispensado pela Disney depois do surgimento de um vídeo dele incluindo piadas antissemitas e imagens nazistas. PewDiePie escreveu uma postagem em seu blogue declarando: "Não apoio de maneira nenhuma qualquer atitude de ódio… Essa não era minha intenção, e entendo que essas piadas são realmente ofensivas".

O que PewDiePie faz é muito diferente do que gente como PJW faz, mas esse racismo irônico oferece um bom exemplo do que acontece quando essas visões, abundantes como são no ecossistema do YouTube, se tornam normalizadas. Vídeos assim estão — pelo menos como anedota — tendo um efeito perceptível em como esses garotos falam sobre judeus ou nazistas.

Aqui vai minha hipótese: o Twitter é o lar natural da esquerda porque — sendo participativo, aberto e capaz de apresentar vários pontos de vista para os leitores simultaneamente — é um solo fértil para expressão de pontos de vista da esquerda, porque é (de certa forma) tipicamente igualitário.

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"Qualquer cara branco que queira se agarrar a seus preconceitos e ansiedades vai sofrer no Twitter, mas vai se dar superbem xingando pra webcam em seu quarto."

A política de direita contemporânea, em contraste, é comandada principalmente por preconceitos e ansiedades nunca analisados de (na maioria das vezes) homens brancos. Qualquer cara branco que queira se agarrar a seus preconceitos e ansiedades vai sofrer no Twitter, mas vai se dar superbem xingando pra webcam em seu quarto.

Então se a esquerda tem seus tuítes, a direita tem o discurso solo para a câmera. E isso não seria problema — se não fosse pelo fato de que esses discursos solo são uma maneira muito melhor de converter pessoas que tuítes. Acho que há várias razões para isso. Diferentemente de um tuíte, os discursos em vídeo permitem que o falante defina para si mesmo uma autoridade, sem nunca ter que lidar com questionamento, e um público sarcástico que domina o Twitter tem (o YouTube tem comentários, claro, mas esse é um ecossistema muito estranho e fácil de ignorar). Além disso, o fato do vlog ser uma mídia oral dá a ele uma proximidade imediata, então o público consegue, por exemplo, sentir a raiva do falante. Assim é fácil ver como o discurso solo para uma câmera é mais convincente.

Isso é agravado por fatores tecnológicos. O modo como o YouTube é construído torna muito fácil para recém-chegados descobrirem o mundo dos discursos de direita — tudo o que você precisa é achar um discurso inflamado, e continuar rolando a barra lateral. Também é verdade que empresas de tecnologia estão dando cada vez mais prioridade para vídeos em vez de palavras. Recentemente, um professor de tecnologia especulou no Guardian que o Snapchat poderia introduzir uma era "pós-literária", enquanto o Facebook recentemente mudou seus algoritmos para promover vídeos em antecipação a um futuro que seja "todo do vídeo".

Então o que a esquerda pode fazer? Pedir um "Paul Joseph Watson da esquerda", por exemplo, seria bastante equivocado. A esquerda nunca pode se apropriar do discurso solo para a câmera — um método inerentemente autoritário de comunicação. Mas se o futuro é o vídeo, então a esquerda precisa desesperadamente achar um jeito de usá-lo. A questão é se o meio pode ser usado de maneira diversa, aberta e participativa.

@HealthUntoDeath

Tradução: Marina Schnoor

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