Foto: Wikimedia Commons
Em abril deste ano, quando entrevistado pela VICE sobre sua agência de turismo espacial, o tenente-coronel reformado Marcos Pontes, de 55 anos, disse ter recebido inúmeros convites para regressar ao espaço. Na ocasião, o primeiro astronauta brasileiro – entre 30 de março e 8 de abril de 2006, passou oito dias na Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês) e dois a bordo da Soyuz – declarou ter sido sondado pela SpaceX, companhia aeroespacial do bilionário sul-africano Elon Musk, e pela Bigelow, do empresário americano Robert Bigelow. O convite que mais o surpreendeu, no entanto, partiu do então candidato à presidência Jair Bolsonaro: o de se tornar, caso eleito, seu ministro da Ciência & Tecnologia (“C&T”, no jargão da área). Ontem, Pontes, que chegou a ser cotado a vice, foi confirmado no cargo.O anúncio, de modo geral, agradou aos cientistas brasileiros. O astrônomo Alexandre Cherman, diretor do Planetário do Rio, disse estar otimista e acrescentou que um astronauta será sempre uma boa indicação para o cargo de ministro. Coincidência ou não, Marc Garneau, ministro de Transportes do Canadá, e Pedro Duque, de Ciência, Inovação e Universidades da Espanha, são… astronautas. “Em geral, são pessoas extremamente capazes, treinadas à exaustão para solucionar problemas , altamente resilientes e com um fortíssimo comprometimento com a Ciência. Afinal, a vida deles depende disso!”, descreve.Na opinião de Cherman, a prioridade zero do novo ministro deveria ser fortalecer os três pilares básicos: ensino (“Cientistas são treinados para fazer perguntas e duvidar das coisas. Se a população se apropriasse disso, certamente não estaríamos afogados em tantas fake news”), pesquisa (“A distância entre nossa produção de artigos científicos e a de patentes é gigantesca!”) e extensão (“Os museus de Ciência e os planetários são elementos fundamentais para o sucesso dessa missão”).O físico Marcelo Gleiser, que dá aula no Dartmouth College, em New Hampshire, nos EUA, lembra que conheceu Pontes em 2009, quando os dois palestraram em evento de Astronomia, o Star Party 6, organizado pelo Centro de Estudos do Universo (CEU), em Brotas, no interior de São Paulo. “Gostei muito do seu entusiasmo pela Ciência e, pelo que sei, é uma pessoa correta. Além disso, tem carisma e o público gosta dele, o que é importante para o representante primeiro da Ciência nacional. Imagino que, quando assumir a pasta, fará consultorias com pessoas de alto nível em diversas áreas. Ou assim espero!”, pondera Gleiser.O astrônomo Fernando Roig, do Observatório Nacional, não parece tão animado quanto seus colegas. “Ainda é cedo para fazer um julgamento”, diz. Segundo ele, mais importante do que a figura do ministro é a sua equipe de trabalho. “São esses que vão, de fato, tocar o barco”, explica. Não bastasse, o eventual sucesso da gestão de Pontes vai depender de sua capacidade de negociar orçamento com o novo superministro da Economia, Paulo Guedes. E, até o momento, é impossível prever como será essa relação. “Em geral, governos com política econômica neoliberal nunca são bons para C&T porque não entendem que não é uma atividade lucrativa no curto prazo. Logo, independentemente da indicação do Pontes como ministro, não posso dizer que estou otimista sobre o futuro da ciência brasileira. Ele pode ser um bom nome, mas, sem dinheiro, não vai conseguir fazer nada”, avisa.Durante a corrida presidencial, Bolsonaro prometeu que, caso chegasse ao Palácio da Alvorada, faria do Brasil “o maior centro mundial de pesquisa de grafeno e nióbio”. Outra promessa de campanha foi melhorar a relação entre a pesquisa acadêmica e o mercado privado. Roig avisa que, há décadas, essa interação é praticamente nula no Brasil. E por vários motivos. Um deles, aponta, é que a iniciativa privada, com exceção de algumas poucas empresas, como a Petrobras, nunca teve interesse em investir no setor. “Nos EUA, você tem empresas privadas que financiam viagens interplanetárias porque sabem que, por trás da pesquisa, haverá o desenvolvimento de tecnologias que podem ser transferidas a outros setores. Agora, tenta propor isso a um empresário brasileiro! É mais cômodo comprar a tecnologia lá de fora”.O cenário só não é mais desalentador, pondera Roig, pois, pelo menos por enquanto, o Ministério da C&T estaria livre de uma eventual fusão com “sabe-se-lá-qual-outro-ministério”. “Seria péssimo se, de fato, ocorresse (uma fusão)”, admite. Atualmente, a pasta engloba, além de Ciência & Tecnologia, Inovações e Comunicação. Por outro lado, não gostou nada de saber que o ensino superior vai migrar do recém-criado Ministério da Educação, Cultura e Esporte para o da C&T. “Na redistribuição orçamentária, perde todo mundo”, lamenta Roig.No caso de Gleiser, a preocupação é outra: qual será a fatia do orçamento da União dedicada às organizações de fomento à pesquisa, como CAPES, CNPq e Finep? “Espero que Bolsonaro e sua equipe entendam que um país que dedica sua economia principalmente à mineração e à agropecuária é um país que ficará para trás no mercado mundial. O ideal é um equilíbrio saudável entre extração e inovação, principalmente na área digital”, afirma.Cherman, por sua vez, diz esperar do novo governo o que espera de todos os governos: que as promessas sejam cumpridas. Grafeno e nióbio, explica, são ótimos campos para brilharmos. Bem como os estudos das faunas e floras tropicais, o combate às doenças endêmicas, a produção de alimentos… “O Brasil é gigante, não só em tamanho, mas em possibilidades. Queremos ser gigantes também em realizações!”, afirma o astrônomo, esperançoso.Leia mais matérias de ciência e tecnologia no canal Motherboard .
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